03/02/2018

Dificuldade financeira ameaça fechar portas da Aidan

Presidente da entidade revela que instituição trabalha seis meses por ano no vermelho e não consegue encontrar novos voluntários

Da redação

“Olha, eu não diria que dias, porque dias é muito pouco, mas a Aidan está com os anos contados”, afirma Clovis Sievert, presidente da Assistência aos Idosos Desamparados de Artur Nogueira (Aidan). Voluntário na entidade há 36 anos, o apicultor se emociona ao mencionar a grande possibilidade que a instituição corre de fechar as portas. “Eu fui criado sem pai, porque ele faleceu quando eu tinha três anos. A Aidan é minha família. Esses idosos são meus pais”.

A Aidan possui hoje 30 idosos internos, que são atendidos por 29 funcionários de diversos setores, desde enfermaria e assistência social até cozinha e limpeza. O custo para manter a entidade operando é alto – muito mais alto que os 33 salários mínimos recebidos de subvenção da Prefeitura de Artur Nogueira.

Segundo Sievert, todos os servidores da instituição são pagos, mas as despesas vão muito além dos salários deles. Cada interno tem um custo mensal de aproximadamente R$ 3.200, conta o presidente da entidade. Esse custo, de acordo com ele, é gerado principalmente pelos muitos medicamentos que precisam ser adquiridos e ministrados aos idosos, mas inclui ainda alimentação e gastos com roupas, materiais de higiene, água, energia, entre outros.

“São quase 100 salários mensais que precisamos para manter a entidade”, revela Sievert. As entradas mensais da Aidan, contudo, ficam muito aquém do necessário. Além dos 33 salários fornecidos pela prefeitura, as famílias doam as aposentadorias dos idosos para a manutenção da instituição, fechando 63 salários por mês. Faltam 37 para fechar a conta.

Para isso, a entidade promove uma série de eventos ao longo do ano com o objetivo de angariar fundos. Os responsáveis por promover esses programas são os voluntários da Aidan, entre os quais estão os membros da diretoria, que não recebem nada para exercer suas funções. No entanto, organizar os shows de prêmios, almoços beneficentes, leilões e desfiles está cada vez mais difícil.

O primeiro motivo para essa dificuldade é a concorrência. “Hoje é muito bingo na cidade. As igrejas fazem, as entidades… E o povo que participa é sempre o mesmo”, explica Sievert. Ele elogia a generosidade das pessoas e do comércio nogueirense, especialmente os mais antigos. “Mas se você vai nas lojas que vêm de fora, você não consegue nada, porque eles não conhecem o nosso trabalho”, lamenta.

“Então quem ajuda são os mais antigos. E eles vão acabando. Que nem a gente. Eu estou com praticamente 67 anos, estou na idade de me internar já”, brinca, sem disfarçar a seriedade da situação.

O segundo motivo para a dificuldade em organizar as programações e arrecadar fundos é a falta de novos voluntários. Segundo Sievert, cerca de 60 pessoas se revezam nas programações da entidade – mas são sempre os mesmos, em sua maioria com idade avançada também. E nem sempre todos têm disponibilidade para os trabalhos.

No Carnaval, por exemplo, metade dos voluntários não estará na cidade. Para a barraca da Aidan, serão necessárias 10 pessoas em cada noite da festa, mas a maior parte delas só pode ajudar em um dia ou outro, segundo o presidente. “Então quem se envolve acaba ficando sobrecarregado”, explica.

Então como lidar com essa dificuldade para levantar fundos? Administrar dívidas. “De janeiro a junho, nós trabalhamos no vermelho”, assevera Sievert. As finanças da entidade conseguem um fôlego em julho, com o leilão de gado beneficente. O dinheiro levantado no evento costuma dar para pagar as dívidas acumuladas e garantir a manutenção de mais dois ou três meses.

Próximo ao final do ano, um grande show de prêmios dá mais uma força para a instituição. Os demais eventos organizados no ano costumam render lucros muito abaixo desses dois, servindo para “pequeno remendos” na situação financeira da Aidan. Segundo o presidente, os salários de funcionários e os encargos trabalhistas são sempre pagos, mas a entidade chega a dever supermercados e farmácias por três meses. “Quando entra o dinheiro a gente quita a dívida”.

Em operação há 40 anos, a Aidan começou como um albergue para abrigar pessoas que não tinham onde passar a noite. Foi crescendo aos poucos. O local começou a abrigar pessoas por mais de uma noite, pessoas que não tinha para onde ir ou condições de viverem sozinhas. Daí criaram o estatuto, contrataram enfermeiras, se adaptaram a legislações, ampliaram o prédio, e se tornaram o que são hoje.

Sievert conta que atua na entidade desde o começo dela. Segundo ele, era mais fácil conseguir fundos para a Aidan no passado, visto que ela atendia menos pessoas e quase não tinha despesas com internos acamados ou necessitados de muitos medicamentos e supervisão constante. “No começo, você comprava um pacote de fralda e dava para uma semana. Hoje, a gente compra uma caminhonete de fralda e não dá conta da demanda”.

A maioria dos internos, de acordo com ele, são acamados – tem que tratar na boca, dar banho, medicar na hora certa. “A gente oferece tudo para os internos. Temos médico uma vez por semana, enviado pela prefeitura. Se tiver emergência, a ambulância vem bem rápido buscar. Se tiver exame de gente acamada, a ambulância vem fazer o transporte”, explica.

“Temos 29 funcionários para dar conta de tudo, mas precisaríamos de mais uns dois para ficar melhor. Só que isso aumentaria muito nosso custo”, comenta. “E você não acha voluntários para esse tipo de coisa”, emenda. De acordo com Sievert, os voluntários da entidade atuam apenas na organização de eventos para arrecadar fundos. O trabalho com os idosos é feito apenas por profissionais pagos.

Perspectivas

“Até esse ano, eu acredito que dá para garantir [o funcionamento da entidade]. Mas nós não temos mais diretoria para tocar”, revela Sievert. Além da falta de voluntários para organizar os eventos, a Aidan sofre há anos com a dificuldade para encontrar novos voluntários que queiram assumir a diretoria da instituição.

Segundo ele, a documentação para o fechamento da entidade no ano anterior já estava até pronta. “Isso aqui só não fechou no ano passado porque eu decidi tomar a frente de novo. E a diretoria entrou comigo mais uma vez e decidiram tocar por mais dois anos e ver no que dá”, afirma o atual presidente.

Sievert acredita que a dificuldade para encontrar novos voluntários existe porque administrar a entidade exige muito tempo e dedicação. “Se eu vou fazer um almoço e tenho 500 convites, preciso correr durante dias para conseguir vender ou entregar todos os convites. É puxado, e por isso que ninguém quer esse encargo. Exige muito tempo”, destaca.

O presidente destaca que os voluntários não possuem familiares internados na entidade. “Não trabalhamos para nossas famílias, mas para as famílias dos outros. Deus nos deu o dom de cuidar de alguém, e é isso que a gente faz”, pontua.

Apesar disso, o cansaço aumenta com o passar do tempo. “Antigamente a gente tirava duas, três horas por semana para tocar isso aqui. Hoje é o contrário. Duas horas por semana a gente trabalha para nós. O resto é aqui”, revela. “Daí a gente começa a trabalhar bastante aqui e deixa de trabalhar para ganhar o que a gente precisa para sobreviver”.

“Olha, eu sou o mais antigo daqui. Já estou cansado, não aguento mais trabalhar. Não é falta de vontade”, desabafa. Sievert explica que o salário mínimo de uma aposentadoria não é o suficiente para se sobreviver. “Eu não estou reclamando de administrar a entidade, mas futuramente não teremos gente para tocar a Aidan. Quem que vai cuidar disso aqui?’, indaga.

Enquanto novos voluntários não abraçam a causa, Sievert só vê futuro na Aidan com aumento de subvenção. “Se não tivermos um aumento da verba vinda do governo, a Aidan não vai muito longe”, enfatiza. Ele afirma que diminuir o quadro de funcionário da entidade pode diminuir a verba enviada à instituição, o que poderia ser ainda mais desastroso. “A solução seria um aumento da subvenção”.

Ainda assim, Sievert apela para que mais pessoas, sobretudo jovens, se envolvam com a Aidan. “Precisamos que novas pessoas se mobilizem para montar uma nova diretoria. A gente precisa de sague novo aqui dentro. Os mais velhos vão ficando cansados. Eu sei porque sinto na pele”.

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