16/02/2016

Primeiro casamento de pessoa com deficiência do Brasil acontecerá em Artur Nogueira

Após 19 anos de convívio, Rosana Aparecida Oliveira de Lima e José Francisco Dias oficializarão união. Medida foi possível devido a atualização no Estatuto da Pessoa com Deficiência.

Por Isadora Stentzler

O primeiro casamento de uma pessoa com deficiência do Brasil irá acontecer nesta quarta-feira (17) em Artur Nogueira. A união de Rosana Aparecida Oliveira de Lima, de 43 anos, e José Francisco Dias, 53, será celebrada às 15h30 no cartório local e só foi possível devido ao Estatuto da Pessoa com Deficiência que entrou em vigor em janeiro deste ano. Muito feliz, o casal não contém os sorrisos e repete que isso é a “realização de um sonho”.

Rosana vive junto com Dias há 19 anos, mas até então os dois não podiam se casar devido a dois motivos: o divórcio inconcluso do primeiro casamento de Dias e uma lei federal, desconhecida pelos dois. Quando a papelada da separação ficou pronta, em dezembro do ano passado, o casal buscou o cartório de Artur Nogueira e então recebeu a notícia de que o Estatuto da Pessoa com Deficiência passaria por mudanças em janeiro de 2016 e que entraria em vigor no dia 5, liberando o casamento para pessoas como Rosana. “Eu não sabia que existia uma lei assim. Até tive medo quando o pessoal do cartório avisou”, conta Rosana sobre a notícia. Ao mesmo tempo que foi surpreendia com a existência do Estatuto, soube que a mudança permitiria que ela e Dias oficializassem a união, o que já era um sonho do casal. “Nossa, fiquei muito feliz. Mais ainda porque soube que seremos o primeiro casal do Brasil a oficializar a união! Isso é mais que a realização de um sonho”, comemora.

casal defici 2

Rosana teve paralisia infantil aos seis meses de vida, mas isso nunca a impossibilitou de levar uma vida normal. Ela cresceu na cidade de São Paulo, com seus pais, quando, em 1997, conheceu Dias.

A mãe dela, dona Maria José Ferreira Oliveira de Lima, de 64 anos, conta que a filha já havia tido uma desilusão amorosa na época. Por isso quando ela apresentou o rapaz ficou surpresa, mas ao mesmo tempo feliz pela filha. “Meu marido disse para ele [Dias] que se ele fizesse algo para ela ele ia ver”, lembra. A sentença nunca soou como ameaça para Dias que estava seguro das suas intenções.

Hoje o casal comemora 19 anos juntos, tem um filho de 17 e se preparara para o casamento que será realizado no mesmo dia em que Rosana comemora aniversário.

Juntos, eles dão uma lição no preconceito. Não raras vezes Dias ouviu que poderia escolher uma mulher “normal” para ficar com ele, e Rosana, que ficaria sozinha, sem nunca se casar. “O deficiente pode fazer qualquer coisa, como outra pessoa. A gente ama também. Então agora estou aqui, pronta pra me casar, fazendo o que muitas pessoas disseram que eu não conseguiria.”

Há 13 anos o casal mudou-se de São Paulo para Artur Nogueira e vive em uma casa com o filho no Parque dos Trabalhadores. Henrique Oliveira Dias, de 17 anos, fruto dessa união, também não esconde a alegria de ver a realização do sonho dos pais. “Todo mundo fica feliz com isso”, vibra.

Estatuto

O Estatuto da Pessoa com Deficiência, também conhecido como Lei Brasileira da Inclusão (LBI) (Lei 13.146/2015) foi instituído para regulamentar a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da Organização das Nações Unidas (ONU), segundo o qual “as pessoas com deficiência gozam de capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas em todos os aspectos da vida”.

Até então a lei brasileira trazia expressa vedação ao casamento de pessoas com enfermidade mental (arts. 3º, II, e 1.548, I, CC), consideradas absolutamente incapazes, o que encontrava seu fundamento na necessidade de pleno discernimento para praticar o ato repleto de consequências no plano pessoal e patrimonial. Com a vedação, buscava-se proteger a pessoa. A mudança implementada pelo novo Estatuto faz parte do abandono do paradigma da exclusão, em busca da plena e efetiva inclusão da pessoa com deficiência no convívio social.

Na condição de separação, havendo vícios de consentimento ou manifestação de vontade, será apenas anulável o casamento (art. 1.550, inciso IV, do Código Civil). A regra é a validade, sendo exceção a anulação do matrimônio, que deverá ser buscada judicialmente, momento em que serão produzidas as provas cabíveis.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, 10% da população em países em desenvolvimento possuem algum tipo de deficiência, sendo que metade destes são pessoas com deficiência intelectual.


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