22/11/2016

Ivan Bueno: O século XXI e a triste realidade da infância perdida

“Atualmente, tenho me preocupado muito com as crianças, pois tem brincado muito pouco. E quando brincam o fazem de maneira equivocada e sem a profundidade que o brincar exige. Dedicam mais tempo à televisão e a internet do que ao exercício saudável da brincadeira”

A infância é um dos períodos mais importantes na vida de qualquer pessoa. É na infância que construímos nossa identidade, trabalhamos nossa personalidade, desenvolvemos nosso potencial ético, moral, estético, social, cultural, intelectual, espiritual, entre outros aspectos. Na infância, através da brincadeira, as crianças aprendem a projetar-se para dentro da realidade, trilhando passo a passo, ludicamente, os caminhos em direção a vida adulta.

A brincadeira proporciona à criança a possibilidade de vislumbrar um mundo ao qual ainda não faz parte, mas que, naturalmente, com o passar do tempo, adentrará a esse universo, dando continuidade ao que a vida possibilita a cada indivíduo. É como se a brincadeira lúdica fosse um ensaio para a vida adulta real, através da imaginação da criança. Diante disso, podemos afirmar que brincar é fundamental na vida de qualquer criança, principalmente, nos primeiros anos de vida.

Através do ato de brincar as crianças vão compreendendo e diferenciando aos poucos a realidade dos objetos concretos do mundo, bem como a complexidade daquilo que é abstrato. Conceitos abstratos como o amor, a saudade, a bondade e conceitos filosóficos, por exemplo, só serão amplamente compreendidos, se antes, isso for experimentado de modo lúdico na infância.

Brincar faz com que a criança se prepare para a vida adulta por meio da experimentação de tudo. Brincando a criança simula situações, cria e recria mundos novos, descobre lugares imaginários, cria e revive personagens, testa possibilidades, compara, classifica, seleciona, além do fato de que por meio da brincadeira a criança estabelece suas primeiras relações sociais com indivíduos do grupo onde está inserida.

Quando criança tive o privilégio de viver minha infância no final dos anos 70 e começo dos anos 80. Foram tempos mágicos para mim e, certamente, para as crianças que tiveram sua infância nesse período. Como brincávamos! E brincávamos do jeito mais saudável possível.

Para começo de conversa antigamente o lugar onde mais brincávamos era na rua. Coisa que hoje não acontece mais e nem pode acontecer devido ao aumento da violência.

Na rua da minha casa havia um grupo de meninos e meninas que brincava desde a hora que a gente acordava até o momento onde todo mundo ia dormir. Brincávamos de carrinho de rolemã, de amarelinha, de empinar pipa, de bolinha de gude, de bater figurinha e até de brincadeiras de roda, onde muitas vezes os adultos participavam também. Tudo era muito divertido e criativo.

Como todas as crianças da rua eram muito pobres, as vezes construíamos nossos próprios brinquedos de papelão, sucata, madeira. Tudo era possível aqueles meninos e meninas em nome da alegria e da imaginação.

Atualmente, tenho me preocupado muito com as crianças, pois tem brincado muito pouco. E quando brincam o fazem de maneira equivocada e sem a profundidade que o brincar exige. Dedicam mais tempo à televisão e a internet do que ao exercício saudável da brincadeira.

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É fato que a internet, por exemplo, tem tirado das crianças o prazer e a diversão que as brincadeiras possibilitam a elas. Obviamente que, brincar com jogos eletrônicos na rede ou nos aparelhos eletrônicos não cumprem os objetivos que a brincadeira tem, conforme já falamos. Além do fato de que os aparelhos eletrônicos e as redes sociais tem feito com que a maioria das crianças, assim como muitos adultos, se tornem em indivíduos alienados do mundo real, fechando-se como ostras numa condição insalubre, equivocada e perigosa.

Outro problema preocupante, é que no mundo atual, onde os valores estão completamente invertidos, e isso parece ser do conhecimento de todo mundo, os adultos, cada vez mais sem tempo e paciência, tem criado uma agenda de afazeres para as crianças que faz com não tenham mais tempo para brincar. É natação, é computação, é balé, é todo tipo de coisa e distração para ocupar o precioso tempo das crianças.

Até nas escolas, o lugar sagrado para as crianças, tenho visto professores e educadores orgulhosos ao falar da agenda sobrecarregada que impõe aos alunos, que, simplesmente, não brincam mais, justamente, num lugar seguro onde poderiam brincar.

Há uma pressa no ar, em relação as crianças. Tem chegado cada vez mais novos à escola, e a própria escola, equivocadamente, com mais pressa de alfabetizá-las e de ensinar conteúdos sem sentido para certas idades. Não é por acaso que temos visto no Brasil os piores índices de desempenho e aprendizagem dos alunos do Ensino Médio e Fundamental. Isso é resultado dos equívocos de escolas e professores apressados, misturados aos grandes problemas sociais e familiares que já conhecemos.

Em suma, podemos dizer que, as crianças de hoje fazem de tudo, menos o que mais deveriam fazer que é brincar. E brincar é uma necessidade para que uma criança se torne em um adulto saudável fisicamente, emocionalmente, psicologicamente, intelectualmente.

Então, por um mundo mais feliz, mais equilibrado, mais criativo, que possamos criar condições para que as crianças brinquem sem pressa, sem medo, aproveitando seu tempo de infância.

Criança que brinca é mais feliz. Viva a alegria!

Ivan Bueno da Fonseca é Especialista em Educação Especial, Inclusão Social e Mestre em Educação Sócio Comunitária.


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