19/06/2017

Moradores de rua enfrentam semana mais fria do ano em Artur Nogueira

Apesar dos serviços oferecidos por entidades, alguns ainda preferem passar as noites nas praças da cidade

Da redação

Tempo nublado, um quarto confortável, um edredom cheiroso, um chocolate quente, um filme para assistir e remédios para o caso de um resfriado. Muita gente aguarda com ansiedade a estação mais fria do ano para se agasalhar e curtir uma rotina mais caseira. Para alguns, porém, menos favorecidos pelo destino, os dias de temperaturas baixas são um desafio desagradável e perigoso.

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Debaixo de quatro cobertores sujos e vestindo um casaco moletom surrado, Gilberto se protege do frio e da garoa sob o teto do coreto de Artur Nogueira. São cerca de 18 horas, e mais uma noite fria se aproxima, trazendo com ela temperaturas que vão beirar os 12°C. O frio e a chuva, porém, farão com que a sensação térmica seja ainda menor.

Com os pés descalços, Gilberto toma goles lentos e esporádicos de uma garrafinha de corote na esperança de se manter aquecido. Não há conforto em seu quarto improvisado, apenas o básico para suportar as noites geladas que se seguirão. Ele sabe o que as próximas lhe reservam, e acabou de passar pelo fim de semana mais frio do ano em Artur Nogueira.

Natural de Caxias (RS), Gilberto passou a morar nas ruas depois que seus pais e um irmão faleceram. Em luto, saiu de casa e nunca mais voltou. Ele não comentou se possui esposa ou filhos, mas chorou ao refletir sobre sua situação. Com os olhos vermelhos, a voz arrastada e pesada, como se prendendo na garganta uma grande aflição, disse que a morte o livraria de sua dor. “Se eu tivesse uma arma aqui, agora, eu acabava com esse sofrimento”, exclamou.

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Apesar disso, o senhor de aproximadamente 60 anos de idade parece preferir viver nas ruas. Contou já ter procurado abrigo e morado numa entidade que acolhe pessoas sem-teto, mas não gostou da experiência e voltou para as praças e marquises. O frio, segundo ele, não é um grande empecilho. Mas, se não fosse a boa vontade de moradores da cidade, dificilmente ele teria com o que enfrentar as baixas temperaturas do final do outono.

Ao lado de Gilberto, usando chinelo de dedo, calção xadrez e um agasalho preto alguns números maior que o ideal, Marcelo também se abriga da garoa. Vindo de Uberaba (MG), o senhor de aproximadamente 45 anos de idade caminhou até chegar em Artur Nogueira, há dois meses. Segundo ele, o frio não é sempre algo simples de se enfrentar.

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“Tem hora que é difícil o frio”, afirma. Ele comenta que nunca procurou os serviços da Prefeitura para solicitar ajuda, mas sempre foi auxiliado por moradores das cidades pelas quais passou. Sentado sobre uma manta vermelha, Marcelo passará a noite fria junto com Gilberto, no coreto, ao lado de garrafas de água e restos de marmita.

Serviços da Prefeitura

Em Artur Nogueira, o acompanhamento dos moradores de rua é realizado pelo Centro de Referência Especializado da Assistência Social (Creas). De acordo com a Assessoria de Comunicação da Prefeitura, 17 pessoas são auxiliadas atualmente pelos serviços do centro: 10 estão acolhidas no Projeto Novo Destino, que recebe uma cesta básica mensal por morador; seis estão na Comunidade Vida Melhor, que recebe um salário mínimo por morador; e um está na Associação dos Idosos Desamparados de Artur Nogueira (Aidan), por ser de idade avançada.

Em nota, a Assessoria destaca que a Comunidade Vida no Altar, dirigida pelo Pr. Maurício Rahmé, também oferece banho, roupas e alimentação para as pessoas em situação de rua. “O Creas atua junto com todos esses atores, inclusive cidadãos que colaboram, indicando o local onde se encontram alguns moradores e a chegada de novos, para que as profissionais possam fazer busca ativa, ocorrência de problemas de saúde, etc”, afirma.

Segundo a Prefeitura, a Clínica Fênix também é um dos locais para onde são encaminhados os moradores de rua. Esse encaminhamento, contudo, só é feito com o consentimento da pessoa. “É necessário que a pessoa queira, pois é cidadão, com direito Constitucional de ir e vir”, explica a nota. “Seguimos um Protocolo para Pessoas em Situação de Rua da Região Metropolitana de Campinas (RMC), portanto, o serviço público tem que seguir regras”, acrescenta.

O Executivo afirma ainda possuir vários casos de restabelecimento desses moradores de rua. Segundo a Assessoria, recentemente um casal conseguiu todos os documentos que precisavam e, em breve, alugarão uma casa. “Ela já está trabalhando, e ele já tem a promessa de trabalho também”, afirma a nota.

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A Prefeitura comenta que o Creas realiza abordagens de rua, criando vínculos com os moradores e mantendo atualizado um cadastro com cópias dos documentos deles, assim como endereço de familiares e telefones. “Os técnicos tomam café da manhã com aqueles que procuram o serviço, a fim de criar vínculos”, ressalta.

O objetivo desse esforço é levar os moradores a um possível retorno às famílias ou à cidade de origem. “Viabilizamos a internação em clínicas especializadas, encaminhamos para acolhimento e oferecemos passagens àqueles que desejam retornar à cidade de origem”, salienta a nota.

Segundo a assessoria, não há planos para construir um abrigo para essas pessoas sem-teto. Isso porque, segundo o Sistema Único de Assistência Social (Suas), Artur Nogueira é um município de porte 2, ou seja, que não necessita ter um abrigo local. Um serviço de hospedagem regional já seria o bastante. “Todavia, a intenção hoje é fortalecer os serviços que já existem [na cidade]”, afirma a nota.

Clima

Após a semana mais fria do ano, com temperaturas que chegaram aos 6°C em Artur Nogueira, a previsão do tempo para esta semana na cidade é de sol e poucas nuvens, com os termômetros variando entre 12°C e 26°C. Ao relento, Gilberto, Marcelo e outros em situação semelhante à deles enfrentarão sensações térmicas nenhum pouco amigáveis. E o inverno só começa na quarta-feira (21).

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