Há 88 anos, Artur Nogueira vivenciava batalhas da Revolução de 32
9 DE JULHO: Moradores relatam histórias e recordações do maior movimento armado do país no século XX
Nesta quinta-feira, 9 de julho, o Estado de São Paulo recorda o aniversário de 88 anos da Revolução Constitucionalista de 1932, podendo ser considerada a data cívica mais importante para o Estado.
Muitas pessoas não dão a devida importância ao feriado, pois não sabem que aqui, onde hoje é o município de Artur Nogueira, muitas batalhas foram travadas. Nesta reportagem, o Portal Nogueirense traz a história de nogueirenses que vivenciaram batalhas ou tiveram familiares presentes, de alguma forma, na Revolução.
A revolta deixou marcas evidentes e algumas delas foram encontradas em Artur Nogueira, tais como uma bala de fuzil, capacete, carregador de munição, trincheiras localizadas em um sítio e até uma casa que serviu como abrigo para soldados, além é claro de muitas recordações.
Revolução
A Revolução ocorreu no período de julho a outubro de 1932 e foi o maior movimento armado do país no século XX. O evento envolvia a ruptura de alternância de poder entre os estados de Minas Gerais e São Paulo e teve como objetivo derrubar o Governo Provisório de Getúlio Vargas, além da promulgação de uma nova constituição para o país, a chamada República Velha ou república do Café com Leite.
Segundo relatos históricos, aproximadamente 135 mil homens aderiram à luta. O número de mortos passou de 900. Várias cidades do interior de São Paulo sofreram danos devido aos combates, mas nem todos foram registrados.
Para realizar o combate contra as tropas mineiras os soldados paulistas vinham de cidades próximas, como Mogi Mirim (SP) e Campinas (SP).
Em Artur Nogueira
A nogueirense Terezinha Gazotto presenciou os conflitos da Revolução em Artur Nogueira e até hoje se lembra das tropas invadindo o sítio de seu pai, onde atualmente é a EMEF Prefeito Ederaldo Rossetti (Caic). “Lembro de tropas chegando, caminhões cheio de soldados passando pela rua, fazendo buracos fundos (trincheiras) e até aviões passando. Eu me lembro de tudo isso, mesmo tendo apenas três anos de idade. Uma coisa que nunca me esqueço também é de estar no colo de minha mãe e ao mesmo tempo minha irmã segurando a mão dela, chorando e com muito medo. Nesse momento um dos soldados passou pelo lado de fora e ficou olhando por uma fresta na janela. Depois esse mesmo homem veio acalmar minha irmã, dizendo que ela não precisava chorar. Acho que era um soldado paulista”, conta Terezinha.
Ao se recordar da Revolução, Terezinha se emociona e mostra uma foto tirada logo após o término das batalhas, onde estão seus pais, Luís Gazotto e Ema Pinato, e seus irmãos. Era a mais nova dos 11 irmãos. Na foto, apenas a irmã mais velha, já casada na época, não estava presente. “Foi um terror, todos estavam amedrontados. Quando terminou a Revolução, ficou um homem importante das tropas, alojado em baixo dos pés de jatobá do sítio. Ele foi quem retratou essa foto”, relembra a nogueirense.
Reinaldo Germano Stein não presenciou a revolução, mas seu pai, também chamado Reinaldo, viveu os transtornos de uma guerra. Segundo ele, o pai teve caminhão requisitado pelas tropas, veículo que usava para trabalhar e nunca mais chegou a vê-lo.
“Em 1932, meu pai tinha um engenho de pinga e usava um caminhão para carregar a mercadoria. O caminhão foi requisitado pelo Estado. Esse veículo funcionava a álcool, já naquela época. Meu pai destilou a pinga, transformando em álcool combustível. Naquele tempo era proibido combustível a álcool, mas não tinha aonde comprar gasolina. Então, ele mesmo produziu o seu combustível. Infelizmente, as tropas requisitaram o caminhão, veículo que ele nunca mais viu. A história é meio parecida com a do meu avô, que no mesmo período também teve o seu caminhão requisitado, mas ele morava no sul do Estado”.
Reinaldo também conta que o pai comprou, anos depois da Revolução, uma casa que fica na Rua 1º de janeiro, atual nº 1536, na época conhecido por Rua Dona Maria. Essa casa havia sido utilizada como abrigo para as tropas paulistas.
“Meu pai adquiriu essa casa em 1943. Ela foi construída em 1931 por Antônio Andrade, proprietário das terras da 1º de Janeiro, inclusive na esquina onde antigamente tinha o Bar Floresta e agora é uma loja de calçados. Na época, a família morava em um sítio e vieram para essa localidade, no centro. Em 1932, as primeiras pessoas que ocuparam a casa, antes de alguém se mudar para lá, foram justamente as tropas paulistas, vindas para defender o Estado. A casa tinha acabado de ser construída quando foi requisitada pelo Estado. Ficaram na casa em período de mais ou menos 4 meses. O fato curioso é que eu nasci nessa casa em 1954”, relata Reinaldo.
O nogueirense não sabe o número de pessoas que usaram a casa como alojamento. Os que habitaram ali, saíam para batalhas e para montagem de trincheiras em bairros como o Caveiras, Pinheiros e o Paiol de Telhas. “Eram os bairros considerados os pontos mais avançados de Artur Nogueira. Esse pessoal saia da casa e se dirigiam para esses locais”.
Anos depois, quando a família se estabeleceu na localidade, foram encontrados na casa carregadores de munição e balas de fuzil, deixados pelas tropas. “Em 1949 meu pai foi trabalhar na prefeitura e ele era responsável por cuidar das estradas de Artur Nogueira, então, juntamente com sua equipe, ao limpar as estradas, ainda encontravam muitas coisas, resquícios da guerra”.
Inês Stein, irmã de Reinaldo, se mudou com a família em 1943 para cidade, quando tinha nove anos. Nascida no sítio onde seu pai tinha o engenho de pinga, Inês não viu a revolução, mas recorda de resquícios. “O que me recordo é que meu pai vendeu o engenho de pinga e fomos para o centro. Eu não era nascida na época da revolução, mas lembro que no sítio onde eu nasci ainda havia trincheiras. Eram trincheiras fundas, bem cavadas, mas na minha época já estava tudo tomado por mato”, conta Inês.
Uma bala usada na revolução foi encontrada pelo bisavô do ex-secretário de Cultura, Leandro de Queiroz (Gugu), Rodolfo Rossetti, que presenciou a revolução. “Eu vivia na casa do meu avô que contava essas histórias. Ele achou a bala de festim assim, amassada, e disse que naquela época o chumbo era raro. Existia uma pessoa que atirava de um lado e outro soldado ia lá onde estava a bala e recuperava o material. Eles faziam isso para dizer que tinham munição, então os soldados usavam e reaproveitavam abrindo a bala para recarregar com pólvora. Para essa bala ter sido encontrada, o soldado tinha que ter saído correndo quando deixou cair, porque ele não abandonaria a munição”, afirma Queiroz, que ainda conta que a avó dele, Maria Rossetti Oliveira, chegou a visualizar uma batalha aérea no município.
“Ela disse que viu um avião vindo de Minas Gerais, que jogou uma bomba onde hoje é o Jardim Leonor. O avião sobrevoou a cidade até chegar ao centro, quando outros dois aviões, aparentemente vindos de Campinas, se aproximaram para realizar o combate, foi quando o primeiro avião foi abatido e caiu quando tentou voltar sobrevoando no sentido Mogi Mirim”, relata Gugu, em memória da avó.
O nogueirense Delei dos Santos também guarda uma preciosidade da Revolução: uma bala de canhão de 30 centímetros e quase 15 quilos.
“As tropas ficaram acampadas no fundo da casa dos meu avós, Antônio e Tereza Andrade dos Santos, onde hoje é a loja do Boticário, no centro de Artur Nogueira. Após a Revolução, os soldados deixaram para trás um capacete, um cantil de água, que um primo meu levou para Campinas, além desta bala de canhão, que está comigo desde a minha infância”, relembra Delei.
Ademir Giroldi mantém em sua casa uma relíquia, um capacete utilizado por um soldado na época.
“Meu avô recebeu vários soldados em sua casa na época da Revolução. Com isso, acabaram esquecendo um capacete e um carregador de munição. Esse capacete estava com a minha tia, Ivone Giroldi, e agora foi passado para mim. Ele não tem mais a pintura original, foi pintado tempos depois, mas ele foi realmente usado pelas tropas”, afirma.
No sítio do avô de Giroldi, próximo ao antigo lixão de Artur Nogueira, existe uma trincheira que foi usada pelos soldados paulistas, que na batalha atiravam no sentido de Mogi Mirim, onde se encontravam as tropas mineiras. Na época essa área perto do lixão pertencia ao município de Mogi Mirim.
A nogueirense Ivone Giroldi Tetzner, prima de Ademir, mora no sítio. Ela contou para a equipe do Portal Nogueirense em 2012, que na época da Revolução seus avós presenciaram a batalha e os soldados paulistas. “A trincheira ficava, no máximo, há cem metros da casa. Os soldados sempre dormiam e comiam no paiol do meu avô. Meus avós me contavam que os soldados paulistas entravam na casa deles para comer e pegar o que viam pela frente. Lembro também que meu avô me contou que os soldados paulistas batalhavam de um lado enquanto os mineiros atiravam do outro lado. Os meus pais me contaram que esse tempo era temeroso para todos que moravam no município”, relatou dona Ivone.
Antes de morrer, Ricardo Berni deu uma entrevista para o Portal Nogueirense e contou que na revolução tinha 20 anos de idade, porém lembrava um pouco do que aconteceu.
“Artur Nogueira era uma vila, não chegava a ter mil pessoas. Lembro que os mineiros chegaram a Artur Nogueira e quando eles viam algum paulista, eles zombavam, e os paulistas tinham medo. Eles não gostavam dos paulistas, roubavam tudo, ninguém podia ter nada. Uma vez quando estava próximo a uma capela, cheguei a ouvir o estrondo dos tiroteios que ecoavam na mata”, afirmou Berni.
Hoje, Artur Nogueira possui duas praças em homenagem a Revolução 1932. Ambas se chamam ‘Praça 9 de Julho’, uma delas por decreto.
.……………………………………..
Tem uma sugestão de reportagem? Clique aqui e envie para o Portal Nogueirense.
Comentários
Não nos responsabilizamos pelos comentários feitos por nossos visitantes, sendo certo que as opiniões aqui prestadas não representam a opinião do Grupo Bússulo Comunicação Ltda.