07/10/2012

ENTREVISTA DA SEMANA: Marcos Eduardo de Lima (Zulu)

Mestre em Sociologia fala sobre Política, Democracia e Poder

“Escolher um candidato baseado em propaganda eleitoral é como comprar um carro só pela apresentação do vendedor” (Zulu)

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Alex Bússulo

Imparcial e apartidário. Alguém que entendesse profundamente sobre Política, mas que suas opiniões e pensamentos não favorecessem ou prejudicassem nenhum candidato político – essa foi a missão de nossos jornalistas.

Falar sobre política não é apenas interessante como também importante para o progresso da nação. Difícil é fazer isso de maneira isenta. Foi com esse pensamento que voltei às aulas da faculdade de Jornalismo e encontrei o professor Marcos Eduardo Gomes de Lima, conhecido por muitas pessoas daqui e da região como ‘Zulu’.

De opiniões sólidas e marcantes, esse sociólogo, de 33 anos de idade, é natural de Minas Gerais, mas criado no interior de São Paulo. Foi aluno e professor no Unasp Engenheiro Coelho – Artur Nogueira, morando no entorno por 25 anos. Estudou Pedagogia e fez Sociologia posteriormente. Casado com a jornalista e publicitária Ana Paula de Lima, mora atualmente em São Paulo – SP. Também é autor do material didático para Ensino Médio de Sociologia pela Casa Publicadora Brasileira, coleção Sistema Interativo.

Na entrevista desta semana, o Mestre em Sociologia aborda a Política de maneira clara e objetiva, ressaltando a importância da democracia e do voto. Confira:

Muitos eleitores encaram o voto como um fardo e que deveria ser facultativo. Como o senhor analisa essa situação? O voto não é obrigatório, ele é facultativo, o que é obrigatório é dar satisfação ao poder público através da presença na seção eleitoral ou justificando a ausência. Em minha opinião, até mesmo este comparecimento, esta satisfação deveria ser livre. Democracia preconiza a liberdade do indivíduo dentro das normas que preservam e promovem o bem comum e logicamente, esta “satisfação” dada ao Estado não interfere em nada na qualidade de nossa cidadania. Se estiver interessado em votar em alguém, então eu vou, se não, não vou, simples assim. A propaganda política deveria, então, apelar muito mais forte ao cidadão, pois teria que lograr motivá-lo ao voto. A obrigatoriedade do voto é um resquício da ideia estranha de que o “povo” precisa ser conduzido, tutelado. O correto é informar e motivar, não tutelar, obrigá-lo.

Votar Nulo ou em Branco é uma forma de manifestação válida? Tudo que estiver dentro da legitimidade do ato democrático é válido. A opção de se votar em branco ou de anular o voto é válida, pois é uma opção que o cidadão tem para dizer o que pensa. Se dá certo é outra questão. Quando alguém se abstém de votar, ele está dizendo que “quer” que aquele que está na frente ganhe. Isto é simples de entender, se eu vejo alguém prejudicando o outro e não faço nada, eu estou concordando com o agressor, por mais que eu fale, minha atitude de passividade me contraria as palavras. Assim, o voto em branco ou nulo, está favorecendo aquele que está na frente na corrida eleitoral. Ora, este é um efeito colateral do voto que não é contabilizado especificamente para alguém. Contudo, o ato de invalidar seu voto, ou negá-lo a todos os concorrentes, tem um significado claro, “eu não quero nenhum de vocês”. Portanto, ele é legal e é legítimo.

O que é mais importante em um candidato: o passado ou as propostas? As duas. Não há como separar a pessoa de hoje da que ela foi no passado, ambas as coisas são uma só. O passado revela as experiências de uma pessoa, sua vivência, suas escolhas, seu legado. Se foi de serviço ao povo, se foi de serviço a si mesmo. As propostas não são certeza e sim o passado. Propostas são intenções, podem se concretizar ou não. Já o passado é o que é. Não muda. Assim, poderíamos dar mais importância ao passado que as propostas. Contudo, as pessoas mudam, para o bem ou para o mal. Toda eleição é uma aposta. Quem tem a obrigação de ver se a aposta foi boa ou não é o eleitor.

Em sua opinião, a Democracia é o melhor regime político? Sim. Democracia é o regime imperfeito, feito por pessoas imperfeitas que gera resultados imperfeitos, porém, melhores que os outros sistemas políticos. Como a democracia é um processo e não um produto acabado e nós somos impacientes, alguns acham que uma ditadura possa ser melhor, mas ela só é melhor para quem manda, nunca para quem obedece. Algumas pessoas, menos esclarecidas louvam momentos da ditadura no Brasil, aludindo a violência de hoje, e aos problemas econômicos, estes não enxergam que numa ditadura, as coisas ruins não são noticiadas, a corrupção, que foi maior do que nunca, não era julgada, todos, globalmente, eram iludidos fantasticamente, por jornais nacionais e regionais. Quem ousasse divergir das informações oficiais era censurado, torturado, expulso do país ou morto. Não consigo ver absolutamente nenhuma virtude num tipo de sistema como este, a não ser a rapidez, se é que esta é uma virtude. Contudo, se economicamente crescemos rápido, caímos rápido, pois foi crescimento baseado na miséria do povo e no endividamento, regado com uma ideologia de patriotismo cego. Monarquia e outros tipos de sistemas baseado em hereditariedade, por si só é estúpido, sangue nunca fez alguém capaz. Algo que eu particularmente gostaria de ver no Brasil é uma evolução do presidencialismo para o parlamentarismo, isto daria uma estabilidade maior ao sistema. Embora nossas experiências parlamentaristas tenham sido virtuais e fracas, ainda é um sistema mais evoluído de República. Como imagino que isso não ocorrerá, até por força da tradição política no Brasil, eu tenho defendido com muita veemência o voto distrital, pelo menos, corrigiríamos alguns defeitos graves de nosso sistema eleitoral e aperfeiçoaríamos nossa democracia.

Política e Religião podem andar de mãos dadas? De forma alguma. Política e religião jamais devem andar juntas. Quem tem o monopólio da força física, não pode ter religião. Ou seja, o Estado deve ser laico e pronto. Isto não significa que o Estado deva agir sempre contra os interesses das denominações religiosas, pois estas, como qualquer outro grupo social, tem sua importância e papel dentro da sociedade. Assim, em muitos casos uma demanda que é defendida por uma determinada denominação religiosa, pode ser uma coisa boa para toda a sociedade. O Estado não deve ser inimigo da religião, o Estado deve zelar por todos os interesses da sociedade, venha ele de onde vier.

Você é a favor de pesquisas eleitorais? O que essas pesquisas interferem no voto? Sim, sou a favor, não creio que pesquisas atrapalhem o andamento do processo eleitoral, acho que até o protegem de fraudes, pois se todas as pesquisas apontam para um vencedor, fica mais difícil para que o resultado seja uma surpresa, ou seja, fica mais difícil manipular as urnas de maneira criminosa. Agora, as pesquisas podem estimular algumas pessoas as votarem em determinados candidatos, mas não creio que isso ameace a democracia e a eleição. Existem pessoas que vão com a maioria, mas existem pessoas que “são do contra” e votam justamente em quem não está ganhando, assim, se isto fosse um problema, seria um dos últimos a exigir uma solução. Nossa democracia sofre de outros males, que considero mais reais.

Hoje, ainda existe ideologia nos partidos brasileiros? Sim, existe, mas em sua maioria, os partidos se tornaram parecidos. Palavras como gestão, tem substituído a política. Assim, parece que ser “administrador” é algo desejável e ser “político” é ser indesejável. Besteira. Político de verdade é um administrador por si só, se não de recursos, com certeza de pessoas. Um líder não precisa necessariamente ser um gerente financeiro. Ele saberá se cercar de especialistas que trabalharão tecnicamente para que o projeto político seja efetivado. A tradição dos grandes partidos não é uma realidade no Brasil. Nossos partidos estão na casa dos 30 anos, acompanhando o processo na Nova República. O MDB, que virou PMDB, se perdeu, a democracia veio e eles perderam a vanguarda da evolução democrática. Lutaram por algo e quando conseguiram não souberam o que fazer com ela. O PT, o maior fato político da Nova República se perdeu no Poder, assumindo posturas que não são dignas de sua história. Assim, embora a ideologia ainda exista, ela está fraca dentro do coração da política partidária, e isso reflete a própria sociedade brasileira. Nós brasileiros não somos apegados a pensamentos elaborados, a reflexão profunda, ao cálculo ao esforço mental. Somos mais da criatividade, da alegria da aventura e das soluções inusitadas. Desvalorizamos muito facilmente as tradições e nos apaixonamos facilmente pelas novidades. Assim, uma sociedade plástica, gerará uma política, também, plástica. Soma-se a isso, o fato de que os partidos deixaram de nos representar, e a via de representação partidária já não interessa ao grosso da população. Tudo isso, emoldura o quadro da política partidária brasileira.

O que decide uma eleição: popularidade, experiência, propostas, coligações, pesquisas? Momento. Momento econômico, sobretudo. Se nós não somos muito chegados a ideologias, a pensamentos elaborados, por outro lado somos práticos. Assim, a centro de interesse do brasileiro médio é a comida, o carro, a roupa, escola dos filhos. Se isto estiver dando certo, não há uma grande vontade de mudar. Se isto estiver indo mal, a resposta vem rapidamente nas urnas, veja o caso da eleição do Lula e agora da Dilma.

Como era a Política municipal na época do militarismo, antigo regime político do Brasil? Nas pequenas cidades, as famílias dominavam (e dominam) travestidas no partido do governo militar ARENA, hoje elas se travestem em dezenas de partidos, dependendo dos interesses de ambos. Nas grandes cidades, a Arena impunha seus candidatos, ou o prefeito era nomeado pelos ditadores. Ao MDB, partido que fazia oposição “comportada” ao regime, cabia eleger seus vereadores até o limite da paciência dos militares.

Qual a importância da oposição ao Poder Executivo dentro da Câmara Municipal? Sem oposição não existe democracia. Consenso perfeito é só na sociedade dos anjos. Sem o contraditório, a preocupação com a fiscalização, sem a opção de se fazer outra coisa, ou a mesma coisa, mas de outro jeito, a democracia estaria ameaçada. O problema da maioria dos ditadores personalistas é que eles acreditam, doentiamente, que seus planos são perfeitos e, portanto, qualquer pessoa que pense diferente é louco ou mal intencionado. O problema das oposições que elas tem “rabo preso”, tem “teto de vidro”. Tem assuntos, cruciais para a população, que as oposições nunca vão fiscalizar, denunciar, ou sequer falar sobre, pois apareceria a sujeira toda, e mostraria que dependendo da situação e digo, em quase todas as situações, que “são farinha do mesmo saco”. De um modo geral, só falamos de problemas que a solução é óbvia, mas de problemas que exigem mudança radical de postura de toda a sociedade, quase ninguém ousa falar, e se fala, é pura bravata.

Por que se briga tanto pelo Poder? Porque dá dinheiro, não porque se quer fazer alguma coisa. Poder para o povo mais dá trabalho que lucro. Se o exercício do poder político fosse exercido no espírito republicano, não haveriam tantos candidatos afim. Estar no poder, abre portas para os interesses particulares.

Onde as pessoas mais erram ao pensar em Política? Erram em não querer pensar em política, erram por preguiça de estudar história, filosofia, sociologia. Erram por não lerem jornais e revistas e pior que não ler, muitos leem o mesmo jornal e a mesma revista e por isso são manipulados pelo dono do jornal ou da revista. Erram em só falarem mal, fazer piadas e dar de ombros. Erram por não se lembrarem em quem votou, principalmente para os cargos legislativos, onde se escondem verdadeiras quadrilhas, erram por só pensarem em candidatos em ano eleitoral, quando temos uma vida inteira para observar pessoas, no mínimo, olhar a trajetória de alguém por quatro anos. Escolher um candidato baseado em propaganda eleitoral é como comprar um carro só pela apresentação do vendedor. Erram não lendo a história dos partidos, erram não lendo a história do Brasil e de si mesmos.

O que é um bom governo municipal? Bom para quem? Depende. Escolas, saúde, segurança, cultura, atração de investimentos, quantas coisas um prefeito e uma Câmara devem pensar… Contudo, não deixar deteriorar o que está bom, avançar em pontos que a população identifique como prioritários. Daí a necessidade de aprofundar a democracia, a participação da população.

Como o senhor avalia a Lei da Ficha Limpa? Um avanço. Uma demonstração de amadurecimento político da população e do Parlamento. Infelizmente nosso parlamento é cínico e se finge de morto quando se trata de erigir novos marcos legislativos que aprofundem a democracia e aprimorem o sistema político, pois afrontaria os interesses deles mesmos. Então, já é louvável quando a pressão popular dá resultado, como foi o caso da proposta que chamamos de Ficha Limpa. O Congresso pelo menos nos ouviu. Cabe a nós não nos acomodarmos com essas migalhas de democracia, essas gotas que respingam do Congresso. E isto vale também para as Câmaras Municipais.


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