15/09/2012

ENTREVISTA: Josepino Rossetti

Nogueirense fala sobre Igreja, relacionamento e trabalho

Texto: Alex Bússulo
Produção: Myllena de Luca, Quézia Amorim e Hidaiana Rosa
Fotos: Renan Bússulo

 “Eu vi Artur Nogueira crescer. Antigamente ela se resumia a uma pequena vila, sem asfalto, com poucas casas e com uma igreja, além da Estação Ferroviária” (Josepino Rossetti)

Se tem alguém que conhece e viveu junto com a história de Artur Nogueira essa pessoa se chama Josepino Rossetti. Conhecido por amigos e familiares como ‘Seu Pino’, esse senhor carrega consigo uma história de trabalho, amor e religiosidade.

Com um jeito tranquilo, consegue relembrar fatos que marcaram sua infância e, consequentemente, o início da história do município ‘Berço da Amizade’.

Filho de Luiz Rossetti e Palma Fontana, tem três irmãos: Natalino, Umbelina e Claudina. Casado há 55 anos com Nair Miranda Rossetti, é pai de três filhas: Roseana, Helenice e Regina.

Hoje, aos 76 anos de idade, o nogueirense se orgulha da vida que construiu. Ao lado da esposa, dá uma bela lição sobre relacionamento e amor. Trabalhador, gosta de acompanhar de perto as atividade do supermercado no qual é proprietário, o Rossetti, no centro de Artur Nogueira.

Seu Pino ajudou a construir a história da Paróquia de Nossa Senhora das Dores. Sempre religioso, diz que a presença de Deus é fundamental na vida de um homem.

A entrevista desta semana aconteceu na sala da casa de Pino. O nogueirense respondeu as perguntas ao lado da inseparável esposa e do irmão Natalino e da cunhada Zélia Rossetti. Acompanhe:

O senhor nasceu de parteira há 76 anos em um sítio de Artur Nogueira. Sua história está fortemente ligada ao desenvolvimento da Paróquia Nossa Senhora das Dores e, consequentemente, com a própria história do município. Como era viver aqui naquele tempo? Era muito diferente de hoje. Artur Nogueira se resumia a uma pequena vila. Sem asfalto, com cerca de 30 casas e com uma igreja bem menor da qual existe hoje, além da Estação Ferroviária, que ficava onde é a Praça da Fonte. Naquela época, o local pertencia ao município de Mogi Mirim e era cheio de plantações de cana, café e até de banana onde, hoje, é o centro da cidade.

Logo na sua infância, o senhor, acompanhado dos pais e dos irmãos, foi morar em Cosmópolis. Mas pelo que conta a história, o senhor ficou pouco tempo por lá. O que aconteceu? Nós éramos uma família muito humilde. Meu pai se desdobrava para conseguir colocar o alimento na mesa. As coisas não estavam muito boas aqui em Artur Nogueira e ele, como sempre foi uma pessoa muito ativa, nos levou para morar em Cosmópolis, onde abriu uma sorveteria. Mas as vendas não foram as esperadas e após seis meses ele começou a trabalhar como cortador de lenha. Mesmo morando em Cosmópolis, vinha todos os dias trabalhar em Artur Nogueira. Pouco tempo depois mudamos novamente para cá.

Com quantos anos o senhor começou a trabalhar? Eu tinha nove anos de idade. Meu primeiro emprego foi em uma farmácia aqui em Artur Nogueira. Fazia de tudo, da limpeza da vitrine à fabricação de pomadas. Depois de algum tempo comecei a trabalhar junto com um primo em um armazém como vendedor, depois como projetista de cinema. Com o dinheiro que meu pai foi juntando com o corte de lenha ele comprou um pequeno bar. Depois de algum tempo, meu pai se desfez do bar e entrou como sócio em uma empresa de comercialização de cereais e algodão. Foi no ano de 1953, após um empréstimo, que meu pai comprou o armazém, que hoje é o Supermercado Rossetti. Foi nessa época que eu, junto com o meu irmão, começamos a trabalhar juntos.

Disse que trabalhou como projetista. Como foi isso? O cinema era uma das poucas distrações que tínhamos aqui. Além dos bailinhos, o Cine Marajó atraía os jovens e os adultos aos finais de semana em uma pequena sala na Av. Dr. Fernando Arens. Eu era o responsável por tudo, desde a limpeza da privada até a colocação dos rolos dos filmes. Essa foi a minha adolescência. Enquanto todo mundo estava se divertindo assistindo os filmes, eu estava trabalhando.

O senhor está casado há 55 anos. Como começou essa história de amor que dura fortemente até os dias de hoje? Eu tinha 17 anos e a Nair, 14. Nosso primeiro encontro aconteceu no cinema [risos]. Eu estava rodando o filme lá em cima quando a vi com uma colega, sentar em uma das poltronas. Conversei com um amigo que também trabalhava no cinema e o deixei cuidando do projetor. Desci lá embaixo e comecei a assistir o filme com ela.

Foi nesse primeiro encontro que começou o namoro? Não! Demorou alguns meses ainda! [risos] O pai dela era muito bravo e não queria que a filha dele namorasse ninguém. Me lembro como se fosse hoje a vez em que eu estava conversando com ela na praça da igreja e vi ele chegando de bicicleta. Não pensei duas vezes e saí correndo. Achamos melhor esperar um pouco. Sabíamos que um casaria com o outro um dia, bastava só um pouco de paciência. Às vezes eu a via passando em frente de minha casa e nós apenas trocávamos olhares. Até que em certo dia a mãe dela a chamou para conversar e disse que o pai havia concordado com o namoro, mas que teríamos que namorar dentro de casa na presença dos dois.

Depois disso começou o namoro? Sim, mas ainda teve outra coisa. Tive que ir pedir permissão para namorar. Lembro que coloquei o único terno e gravata que tinha e fui falar com o futuro sogro. Ele me disse duas coisas. A primeira era se eu já tinha feito o Serviço Militar. A segunda é que ele já queria marcar a data do casamento.

Mas já no primeiro encontro? Sim. Disse que eu tinha um ano para arrumar as coisas. Eu pedi mais alguns meses e ele concordou. Depois disso começou o namoro, que acontecia somente aos sábados e domingos, das 19h às 21h, ao lado da sogra. De vez em quando saia uns beijinhos roubados [risos].

E dava para namorar? Dava. Mas é bom falar que o namoro daquela época é bem diferente dos atuais. Naquele tempo, o mais importante era o amor, não o sexo. Aliás, sexo só acontecia depois do casamento. E nós, namorados, não nos importávamos com isso. Sabíamos que teria o momento certo. Havia muita seriedade, pureza e respeito. O processo da conquista era mais difícil. Hoje, as coisas estão muito fáceis. O casal mal se conhece e já tem relações sexuais. Vivemos em uma sociedade onde o sexo é mais valorizado do que o amor. Os valores foram invertidos.

Após mais de cinco décadas de união, podemos perceber que o senhor e a dona Nair vivem um relacionamento de dar inveja a muitos casais. Qual é o segredo para uma união dar certo? É a paciência. Sem paciência é quase impossível um relacionamento ter futuro. Trabalhei muitos anos na Pastoral dos Noivos, e pude passar e também receber muitas lições. Tem uma história que gosto muito que narra bem a importância da paciência. Havia um casal que vivia brigando, sempre discutindo, um querendo ter mais razão que o outro. Até que um dia, a mulher cansada de tanta discussão procurou um sacerdote. O padre deu um pequeno frasco contendo água benta, que deveria ser colocada e segurada na boca toda vez que um dos dois iniciasse uma briga. Dito e feito. A mulher foi para a casa e quando começou a briga, foi e encheu a boca com a água milagrosa. E lá ficou quietinha no canto, só ouvindo o marido falar. E assim aconteceu por várias semanas. Toda discussão que começava, a mulher logo enchia a boca com a água. Passado algum tempo, ela procurou o padre novamente e disse que o líquido havia lhe salvado o casamento e que ela queria mais da água benta. O padre deu risada e disse que não foi a água benta que havia salvado o casamento, que o segredo de tudo aquilo era a paciência que um estava tendo com o outro. É isso. Muitas vezes um quer ser melhor do que o outro. Quer ganhar a discussão. Não há relacionamento que resista às discussões. Mas ter paciência não é fácil, porém necessário. Sempre que deito com a Nair e um dos dois está chateado, damos as mãos e rezamos um Pai Nosso. É preciso ter coragem para fazer isso. Ser tolerável e humilde. Conversamos com Deus e as coisas se ajeitam.

Vamos falar sobre a Paróquia Nossa Senhora das Dores. O senhor praticamente cresceu junto a esta Igreja. Como analisa essa história? Com muito amor e admiração. Você me perguntou qual era o segredo para um casamento perfeito e eu disse que é a paciência. Deus me dá essa paciência todos os dias. Antigamente existia apenas uma capela, dedicada a São Sebastião. Foi a Diocese de Campinas que criou a Paróquia de Nossa Senhora das Dores. A população nem ficou sabendo. Vinha um padre de Mogi Mirim para cá uma vez por mês, quando vinha. A comunicação de Mogi Mirim e Campinas era muito difícil, não tinha telefone, por isso demorava muito. Tempos mais tarde, um padre de Cosmópolis vinha fazer as celebrações uma vez por mês em Artur Nogueira. Em 1970 comecei a trabalhar com a equipe de noivos e com a equipe de batismo. Em 1973, fui escolhido para ser ministro extraordinário de Eucaristia, passando a ajudar também nas comunidades rurais. Também tive a felicidade de contribuir para a construção das comunidades de Santa Rita de Cássia, no Jardim Planalto, e de São Sebastião, no Itamaraty. Também trabalhei para a introdução do Dízimo na paróquia. Hoje, devido a idade, diminui um pouco minhas atividades na Igreja, mas continuo ajudando nas missas e levando a comunhão aos velhinhos e doentes.

O que a devoção a Nossa Senhora das Dores lhe ensinou? Nossa Senhora presenciou de maneira muito forte as dores de Jesus Cristo. Foi ela quem sempre esteve presente na vida e também no momento da morte do Filho. Ela nos dá uma belíssima lição de amor e de esperança, de que podemos superar as dores e os obstáculos da vida quando entregamos as nossas angustias a Jesus. Minha fé e amor por ela são incondicionais.

Aos 76 anos de idade, o senhor não pensa em parar de trabalhar? De forma alguma. Eu sou o primeiro a entrar e o último a sair do supermercado. Gosto de trabalhar e isso me faz bem. Como já disse, comecei a trabalhar aos nove anos de idade e até hoje não parei. Atualmente lidero cerca de 50 funcionários. Gosto de visitar e acompanhar todos os setores. Vou na padaria, no açougue, no depósito, converso com os funcionários e também com os clientes. Esse contato é muito importante para o negócio funcionar. Uma coisa que me arrependo é não ter aprendido a mexer em computador. Todo final de mês, faço o balanço das despesas e do lucro. Tudo manuscrito, no meu caderninho. Foi assim que aprendi com o meu pai e faço assim até hoje. E não faço isso sozinho não. A Nair sempre me acompanha. Também gosta de estar por dentro dos negócios. A gente sempre brinca um com o outro sobre a questão da morte, o que um vai fazer sem o outro. É difícil, mas sabemos que um dia passaremos por isso. Mas essa discussão nunca nos levou a nada. Continuamos com as nossas vidas. O dia que chegar, chegou. Até lá é ter paciência. É isso.

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