07/04/2012

ENTREVISTA DA SEMANA: Padre Eder Doniseti Justo

Padre da paróquia Nossa Senhora das Dores fala da essência da Páscoa

“Páscoa é celebrar a certeza de que o Cristo, um dia nascido, está sempre conosco” (Padre Eder Justo)

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Alex Bússulo

Em julho deste ano, Eder Doniseti Justo completa 12 anos de dedicação e trabalho em Artur Nogueira. Nascido na cidade de Andradas-MG descobriu logo cedo sua vocação para ser padre. Aos 18 anos entrou para o seminário e desde então dedica sua vida na missão de divulgar a palavra de Deus.

Hoje, aos 46 anos de idade, Eder nos passa uma mensagem de um homem calmo e seguro em suas palavras. O padre responde à todas as perguntas realizadas em aproximadamente 2 horas de entrevista. Em sua sala, na igreja Matriz Nossa Senhora das Dores, que passou recentemente por uma pequena reforma na troca do forro, Eder fala sobre a essência da Páscoa, a polêmica Teologia da Prosperidade e sobre Artur Nogueira.

Por que a Páscoa é mais importante do que o Natal? No Natal nós celebramos o nascimento de Cristo. Na Páscoa, celebramos a certeza de que Ele nunca nos abandonou. Páscoa é ressurreição de Cristo, que um dia nasceu e foi vítima da própria sociedade em que viveu, sendo assassinado por conta de sua postura. Houve um momento em que aqueles que acreditaram em Cristo julgaram estar abandonados. Quando Cristo ressuscita, Ele então realiza a grande promessa de Deus: de que Ele nunca nos abandonaria. Páscoa então é celebrar a certeza de que o Cristo, um dia nascido, está sempre conosco. E mais, na ressurreição de Jesus nos é dada a oportunidade de também ressuscitarmos com Ele. Interessante que quando falamos em ressurreição logo pensamos que se trata de algo apenas depois da morte física. Enquanto que é também, mas não deixa de ser a ressurreição que deve acontecer aqui, nesse tempo, nessa história…

Como assim, padre? Todos nós convivemos aquilo que alguns estudiosos, particularmente os psicólogos, chamam de sombras, que são os nossos limites, as nossas faltas, aquilo que na Teologia se chama de pecado. Quem tem fé nunca deixa de acreditar que o homem pode ser diferente, pode ser melhor. Isso é ressuscitar. É viver, de novo, digamos. Essa ressurreição pode acontecer todos os dias em nossas vidas. Podemos sempre ser homens melhores, mulheres melhores, pessoas melhores. Isso é Páscoa! É sair daquela condição de erros, faltas, pecado ou então de morte, para aquilo que é novo, atual, renovado, refeito, reconstruído, ético, moral, verdadeiro, justo, honesto. Isso é vida. É Páscoa.

Muitas pessoas associam a Páscoa aos ovos de chocolate. Você acha que a essência da Páscoa está se perdendo? Eu acho que o verdadeiro significado nunca se perde. Páscoa é ressurreição de Jesus. Agora, o interesse econômico tem um poder de corrupção, inclusive do religioso. Eu posso transformar aquilo que é religioso, do nível da fé, em algo que dê lucro, que venda, e há aqueles que se sustentam vendendo artigos de fé, de religião. O comércio descobriu um filão em comercializar produtos que de algum modo estão ligados à celebração da Páscoa. O ovo em si é um símbolo de vida, de nascimento. Transformar isso em um ovo de chocolate de tamanhos diversos e vendê-los, dizendo que é mais feliz quem come esse ovo e não aquele, desta marca e não daquela, deste tamanho e não daquele é o comércio que faz. Voltando a sua pergunta, isso não tira o sentido da Páscoa, o sentido é o mesmo, mas há uma tentativa que vem se mostrando capaz de transformar o religioso em produtos que possam ser vendidos e há quem compre, há mercado, por isso continuam sendo vendidos. Eu não acho que devemos demonizar aquilo que é bonito, gostoso. Chocolate é bom, festejar é bom, então não podemos demonizar as expressões festivas, mas devemos nos perguntar quando os interesses particulares começam a corromper aquilo que é sagrado.

Além do jejum, a esmola e a oração também são práticas que podem ser observadas durante a quaresma. Qual o significado de cada uma delas? A oração é de fato a possibilidade de que nós, pessoas humanas, não nos tornemos “bichos”. Porque quem não reza, pode virar “bicho”. A oração nos coloca em uma atitude de diálogo superior. A importância da oração é justamente o fato de que ela nos humaniza. A esmola, que hoje a Igreja prefere usar o termo ‘a prática da solidariedade’, embora haja controvérsias, naquela esmola que você dá para uma criança que está no semáforo ou a um homem que está na calçada, porque segundo algumas pessoas isto pode vir a favorecer o circulo da pobreza e da miséria daquele sujeito, eu tenho comigo certa preocupação de que esta fala, de algum modo, queira nos deixar livre do compromisso de ser solidários. Então, acho que não seria bom que houvesse uma legislação sobre isso, dizer que eu posso ou não dar a esmola, eu acho que só eu, na minha consciência, diante daquele que naquele momento me pede algo, uma ajuda, é que devo concluir diante de Deus, se eu devo ter esse ato de caridade ou não. Mas, o fato é que a esmola nos chama a atenção e nos remete para aquilo que hoje se chama solidariedade. Não preciso dizer que o ato de ser solidário nos faz sentir pessoas mais humanas.

E o jejum? O jejum, feito apenas de modo ritual, ou seja, na Sexta-feira Santa, Quarta-feira de Cinzas ou em outro dia que eu, por convicção, não como esta ou aquela comida, não bebo esta ou aquela bebida, e acho que pelo simples ato de não ter comido ou bebido este gesto ritual puro e simplesmente me colocou em harmonia com Deus. Quem pensa assim se engana. Também o jejum precisa ser uma experiência que de algum modo me ajude a rezar e que me ajude a praticar a solidariedade.

O que se fazer, então? O aconselhável é se eu não comi tal comida, não bebi tal bebida, eu tenha a dignidade de fazer a conta de quanto eu economizei com esse jejum e converter este meu jejum em um bem, ou seja, eu tenho que transformar este valor em uma cesta básica, em alguns litros de leite enfim, em algo que possa ajudar quem precise. O jejum terá sentido no momento em que a pessoa se colocar em comunhão, em atitude de solidariedade, de fraternidade com os empobrecidos.

O que as pessoas devem levar de aprendizado após esse período de quaresma? Nós dizemos que a quaresma é um tempo propício a nos preparar para a Páscoa. Todo domingo é dia de Páscoa, porque celebramos a missa, que é a celebração da ressurreição de Jesus. Portanto, nós revivemos semanalmente, e até diariamente, na celebração da eucaristia, esse grande mistério da Páscoa, que é a vitória da vida sobre a morte. O grande ensinamento é que as pessoas devam estar todos os dias de suas vidas empenhadas com as vitórias da vida sobre qualquer expressão de morte.

Por que é que a Matriz Nossa Senhora das Dores não realiza mais a encenação da Via-Sacra? Simplesmente porque até onde eu sei não temos pessoas em números suficientes para assumir todas as responsabilidades que advém deste compromisso. A dificuldade quando realizávamos a encenação era achar pessoas interessadas em participar. Achar particularmente homens para participar dos ensaios, da preparação. Também existe a dificuldade em encontrar quem coordene o trabalho. A qualquer momento, que encontrarmos pessoas interessadas, poderemos retomar essa ação. O que eu, particularmente, não estou disposto a fazer é convocar toda a comunidade e toda Artur Nogueira para ir ao Campo Municipal para ver um evento que não seja de qualidade. Porque, de fato, nós tivemos lá no Campo Municipal, nos últimos anos, belíssimas apresentações. Então, eu particularmente, não me contentaria em fazer qualquer coisa só para dizer que fizemos.

Algumas Igrejas, que pregam a Teologia da Prosperidade, estão em constante disputa na mídia. Como o senhor vê isso? Ultimamente eu tenho parado para pensar e confesso que sou muito grato a Deus por viver em um país democrático. Eu acho formidável que todos possam dizer aquilo que pensam e apresentar as suas propostas. Entendo que a matéria desta briga, pelo que andei lendo, já está sendo movimentada na Justiça. A sociedade dispõe de instrumentos que permitem que tudo que seja apontado como irregular possa ser averiguado e investigado pela Justiça. A apropriação de bens dos fieis é uma acusação muito grave. E os envolvidos nessa história terão que se justificar perante a lei.

E no âmbito religioso? A Teologia da Prosperidade é… É uma pena que temos que chamar isso de Teologia, porque isso é uma ofensa aos grandes teólogos e teólogas. Eu vejo com grande tristeza, pessoas que queiram se valer da fé para prosperarem entre elas próprias e isso nós encontramos inclusive dentro da Igreja Católica. Não é prerrogativa desta ou daquela religião ter pregadores que se valem dessa tal Teologia da Prosperidade para prosperarem. Cabe à pessoa que tem bom senso, que tem informações, que tem cultura e conhecimento, separar o joio do trigo. Mas, apesar dessa minha opinião, eu ainda acho que o mais interessante é que as pessoas possam apresentar as suas convicções, as suas certezas de fé, até da Teologia da Prosperidade, mesmo eu não concordando com ela.

Algumas pessoas criticam a campanha para a troca de forro da igreja, que vai sortear um carro, ou dar o dinheiro para aqueles que participarem. Como o senhor vê essa crítica? Com muito respeito. Ponto. As pessoas tem todo o direito de expressar suas opiniões. A decisão de fazer a campanha deste modo foi tomada pelo Conselho Administrativo Paroquial, que é formado por mim e por mais outras nove pessoas. Fizemos uma reunião para discutir a necessidade de se fazer a troca do forro da Igreja Matriz e procuramos meios de levantar os fundos necessários. Entre as possibilidades, o Conselho Administrativo entendeu que lançar essa campanha seria uma possibilidade real de angariar recursos.

Era realmente necessária a troca do forro? Sim. Na verdade, a troca do forro não estava dentro de nossas prioridades. A paróquia Nossa Senhora das Dores, por exemplo, tem um compromisso com a paróquia Santa Rita de Cássia, que é dar a nossa contribuição para a construção de um espaço para celebração e de salas de encontros que está sendo construído na comunidade São Benedito. A nossa paróquia tem esse compromisso assumido com aquela comunidade, até porque no passado essa comunidade também soube ser solidária com outras obras, que quando foram feitas foram prioridades. Quando durante uma missa de domingo, à tarde, uma placa do forro se desprendeu e caiu no corredor central eu fiquei muito assustado, me perdi completamente, outras placas já haviam caído, mas nunca durante uma missa. Foi quando eu me perguntei se iria esperar cair uma placa na cabeça de uma pessoa para somente assim tomar uma providência.

Para finalizar, como o senhor está se sentindo atualmente, após quase 12 anos exercendo a função de padre em Artur Nogueira? Eu me sinto muito feliz em Artur Nogueira, já se passaram quase 12 anos e confesso que às vezes eu penso que já está na hora da paróquia Nossa Senhora das Dores fazer uma nova experiência. E eu também.

Como assim? Eu penso que após 12 anos a gente se torna um pouco repetitivo, mal acostumado, e as pessoas também. A renovação me parece que é um princípio saudável. Então, eu me sinto feliz e completamente disponível. Se eu receber um chamado da Igreja para servir em outro lugar ficarei sentido, mas acho que será bom ir. Porque eu não tenho dúvida de que seria muito bom para a paróquia Nossa Senhora das Dores acolher outro padre. Com isso, não estou querendo dizer que eu esteja para ser transferido, pelo menos que eu saiba [risos]. Mas, na hora em que isso acontecer eu direi sim, de modo nenhum triste, não posso ir para algum lugar triste, nem sair daqui triste, mas muito grato a Deus pelo tempo em que Ele me concedeu em ser padre em Artur Nogueira. No ano passado participei de um retiro espiritual, em que o pregador era Dom João Bosco, arcebispo em Minas Gerais, e ele disse algo que ficou em minha memória: “quando um padre é transferido de uma paróquia 10% dos paroquianos ficam entristecidos e chateados, outros 10% soltam foguetes de alegria e falam aliviados ‘até que enfim ele foi embora’, e os outros 80% não estão nem aí”. É isso!

Fotos: Renan Bússulo

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