24/03/2012

ENTREVISTA DA SEMANA: Carlos Caressato

Sociólogo fala sobre relacionamentos descartáveis, animais e política

“Vivemos em uma sociedade onde tudo é descartável, inclusive as pessoas” (Carlos Caressato)

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Alex Bússulo

Ele tem 53 anos de idade, sendo 28 como morador de Artur Nogueira. Crítico, Carlos Caressato tem opiniões formadas que se traduzidas para a prática poderiam resolver vários problemas da sociedade.

Formado em Sociologia, Filosofia e Pedagogia, também é especialista em Gestão Ambiental, além de ser mestrando em Educação.

Desde o ano passado, Caressato preside a Rede de Proteção Animal e Ambiental (RPAA), uma associação criada em Artur Nogueira para cuidar e defender os direitos dos animais, constituída por professores, engenheiros, sociólogos, veterinários, advogados e amantes dos bichos.

Recebemos o sociólogo na redação do Nogueirense na última segunda-feira (19). Em uma conversa de aproximadamente duas horas, Caressato falou sobre política, relacionamentos e animais. Confira.

Você é uma pessoa que defende muito a coletividade. O que tem contra a individualidade? A individualidade não leva a lugar nenhum. Ninguém consegue caminhar sozinho na vida. A coletividade dá força a uma causa, a um ideológico. Um grupo de agricultores que se una ou uma classe de alunos que decida montar um grêmio estudantil vai ter muito mais expressão em suas buscas. Não estou dizendo que as pessoas devam perder a sua individualidade, veja bem, ninguém deve perder suas opiniões próprias, suas ideologias e características. Defendo a ideia de que devemos nos unir para termos uma sociedade mais justa e digna de se viver.

Acha que a sociedade perdeu um pouco esse interesse em querer mudar, reivindicar mudanças? Totalmente. Isso aconteceu porque os partidos que lideravam essa conscientização crítica do sistema, do modo de viver, era os partidos de esquerda, como o PC do B, o PT, entre outros, que hoje estão no poder. Não vemos mais manifestações nas ruas, exigindo melhorias, criticando os atos do presidente por esse motivo. O Collor saiu do poder por muito menos do que algumas posturas que o próprio Lula e o PT tiveram. Aquelas histórias mal contadas de dinheiro na cueca, encontros escondidos entre José Dirceu, Palocci e o Lula, ficou muito mal explicado.

Já que citou o nome do ex-presidente, qual a sua opinião sobre Lula? Eu tiro o chapéu para ele. Simplesmente porque ele é um grande estrategista, um grande estadista, assim como Juscelino Kubitschek foi. Lula revolucionou o modo de pensar, de fazer e de agir. Não sei se foi uma mudança tanto para o bem, mas que ele conseguiu, ele conseguiu. Ele costurou forças políticas que até então não conseguiam nem sequer sentar para conversar. Com toda aquelas denúncias no governo não vi nenhuma manifestação contra ele. Nenhum estudante saindo nas ruas protestar contra a situação. Porque a UNE, a CUT é PT e PC do B. Você entende? Nenhum partido vai reclamar se tiver um pedacinho de um ministério, se partilhar o governo. Simplesmente por isso não vemos as manifestações nas ruas.

A sociedade perde com isso? Perde, porque ela deixa de pensar, de refletir. O sistema está montado de uma forma que faz com as pessoas deixem de serem críticas. O cidadão está assistindo ao telejornal quando é pego por uma notícia de desvio de verba, que certo político desviou dinheiro da merenda escolar de uma escola. No momento, o telespectador fica revoltado, indignado com a situação, querendo manifestar contra a sujeira que existe no país, mas logo em seguida, logo depois dessa notícia, o jornalista vem com ‘mais um atleta brasileiro ganha medalha’. E o que o povo faz? Relaxa. Esquece. Do jeito que a coisa é transmitida não existe espaço para a reflexão.

Falta mais crítica? Não é apenas a crítica pela crítica. Refiro-me a crítica construtiva. A uma reflexão maior do por que se está pagando determinado imposto, por que está faltando comida no país. As pessoas estão pensando menos porque o nosso sistema de vida impõe essa realidade, ele faz com que caminhemos para o individualismo e não pensemos no coletivismo. Vivemos em uma sociedade onde tudo é descartável. As mercadorias são descartáveis, o carro é descartável, as pessoas são descartáveis. As relações humanas estão totalmente descartáveis. Tudo é baseado em cima de interesses.

Por que os relacionamentos estão descartáveis? Porque tudo ficou mais fácil de conseguir. Vou parecer moralista agora, mas é a pura verdade. Antigamente, em um namoro, existia todo um processo para um rapaz chegar até uma moça. Era mais difícil. Por isso a recompensa era maior e, consequentemente, mais valorizada. Lembro que as mãos suavam quando se pensava em conversar com uma mulher. O primeiro toque era algo inesquecível. Que marcava de uma forma indescritível. Depois o primeiro beijo, enfim, era um processo bem diferente dos dias de hoje, onde as pessoas se drogam e vivem apenas aquele momento. O homem bebe uma, duas latinhas de cerveja e já ganha “coragem” de chegar e puxar assunto com uma, duas, três, quantas mulheres quiser. Tudo resulta em falsas relações.

Por que isso é ruim? Porque não é real. A partir do momento em que você necessita de química para dar vazão a um relacionamento, ele se torna doentio, porque você não pode passar 24 horas por dia drogado. O álcool não é uma droga individual, ele é um problema social, que acaba e ilude com os relacionamentos.

Como resolver o problema das drogas lícitas, tais como o tabaco e o álcool? Já ouviu aquele ditado que diz ‘dificulte as coisas para vender facilidade’? É isso. Deixe-me ilustrar o problema. Certas pessoas costumam jogar lixo próximo a suas casas, aí começam a aparecer ratos e eu, ao invés de proibir o despejo de lixo, começo a vender dedetização. Imagine se obrigassem a Coca-Cola a recolher 30% de seu Pet. O problema da poluição dos rios por garrafas plásticas estaria resolvido. Falando das drogas lícitas, imagine se obrigassem as empresas que produzem bebidas alcoólicas, não adicionar no preço da mercadoria, mas tirar de seu lucro um percentual para tratamento dos drogados. Seria uma solução. Outra medida que acho que já deveria ter sido tomada é a publicidade. Assim como proibiram as empresas de tabaco a fazer propaganda na televisão e mídia em geral também devem proibir a das bebidas alcoólicas.

Vamos falar de política municipal. Como analisa a atual administração? O prefeito Marcelo Capelini tirou Artur Nogueira das mãos dos coronéis. Em questão administrativa ele revolucionou o município. Está fazendo um bom trabalho. Claro que, como em qualquer outro lugar, existem suas deficiências.

Diga uma que te incomoda. A questão dos lixos nas vicinais. Isso é terrível. Nós passamos ao lado das lixeiras e notamos aquela quantidade enorme de resíduos. Um problema de saúde pública, pois aquilo atrai roedores, como ratos, que transmitem doenças.  Se você for toda semana na estrada do antigo lixão municipal vai encontrar cachorros mortos jogados nas lixeiras, isso é bem comum. As pessoas não entendem que esse animal morto vai atrair uma varejeira e essa mosca vai sentar no seu prato de comida, na comida de seu filho, e trazer doenças para a sua família. A população precisa se conscientizar, se unir e pedir por melhorias.

Como poderíamos minimizar o problema do lixo? As pessoas produzem muito lixo porque consomem demais. Consomem coisas desnecessárias. Recentemente fui comprar um remédio para uma cadela. A caixa era enorme para um único e minúsculo comprimido. Algo totalmente desnecessário. As empresas precisam criar um novo conceito para evitar tanto desperdício.

Você é a favor das sacolinhas plásticas nos supermercados? As pessoas criticam dizendo que isso é uma jogada de marketing dos supermercados, mas eu acredito que toda ação, por menor que seja de contribuir para o meio ambiente deve ser apoiada. Vou além, acredito que deveríamos voltar àquela prática passada, em que íamos ao supermercado e comprávamos o arroz, o feijão sem embalagem. Só comprávamos o que íamos consumir. Não a embalagem, o rótulo. Quer ideia melhor do que essa?

Como surgiu a ideia de criar a RPAA? Ela nasceu da necessidade de transformar o individual em coletivo. Já existiam no município várias pessoas que cuidavam de animais de rua. Só que eram ações isoladas. Pela experiência que tenho se não tivermos uma grande quantidade de pessoas unidas em prol de uma causa o projeto pode acabar com muito mais facilidade. Uma ação não pode depender apenas de uma pessoa. Imagine uma pessoa que cuida de dez, vinte cães. Se ela faz isso no individual, esses animais dependem unicamente dessa pessoa, que pode ficar doente, morrer, perder o emprego. E daí? Qual será o futuro desses animais? Também vão sofrer. Em grupo isso não acontece, porque a ação é coletiva, não fica presa a apenas uma pessoa.

Qual é o objetivo da rede? Trabalhamos com os pilares de adoção, denúncia, educação ambiental, além da castração, que está sendo nosso maior objetivo atualmente. Gostaria de aproveitar a oportunidade e agradecer, em nome da Rede de Proteção, o secretário de Saúde, Dr. Flávio de Almeida, que, sinceramente, foi além do que nós esperávamos dele. Ele já cedeu para a associação 180 castrações. Nosso trabalho é voluntário, ninguém da RPAA ganha nada para fazer o que faz. Fazemos por amor. Também estamos trabalhando com a Secretaria de Educação, através do secretário Alcebíades de Sá, para que possamos distribuir cartilhas educacionais nas escolas. Nós precisamos de mais pessoas nessa luta. Que defendam a causa. Pessoas que saiam do individualismo. Fazer cada um a sua parte, hoje, já não é mais suficiente. Temos que unir forças.

Fotos: Renan Bússulo

 


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