09/02/2013

ENTREVISTA: Rei Momo de Artur Nogueira já foi vereador, lixeiro e até palhaço

Rei Momo de Artur Nogueira já foi vereador, catador de lixo e até palhaço

Benção“Sempre fui pobre, mas isso nunca foi motivo de tristeza, acho que a maior alegria são as pessoas que a gente carrega no coração” (Bênção)

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Alex Bússulo

Antes de você, leitor, começar a ler este texto, deixo aqui o aviso de que esta foi uma das mais descontraídas e divertidas entrevistas que já realizamos. De um jeito humilde e sempre alegre, conversamos esta semana com Wagner Júlio, conhecido como ‘Bênção’, que foi eleito Rei Momo do Carnaval de Artur Nogueira.

A eleição para escolha da Corte da Folia aconteceu na noite de 20 de janeiro no anfiteatro da Escola Modelo. Quando ‘Bênção’ entrou no palco e começou a sambar ninguém teve dúvida – ele seria a realeza da folia 2013.

Na última terça-feira (5) entramos em contato com ‘Bênção’ para convidá-lo para uma entrevista. O Rei Momo aceitou o convite no mesmo instante e deixou o encontro marcado para às 10h45 do dia seguinte. Disse que teria que ser nesta hora, pois coincidia com o tempo do almoço.

Na quarta-feira, esperamos o entrevistado chegar na redação. Deu o horário combinado e nada. Como sabíamos que o tempo dele era escasso, começamos a nos preocupar. Os minutos foram passando e nada de ‘Bênção’. Todas as tentativas de ligação davam na caixa postal. Já estávamos quase desistindo quando, de repente, ouvimos “oh bênção! É aqui que vai acontecer a entrevista?” – esquecemos de dizer que ele chama todo mundo que encontra de ‘Bênção’ – por isso o apelido.

O entrevistado entrou na redação pedindo desculpas e começou a explicar o motivo do atraso. “Eu estava vindo de carro e acabou a gasolina. Tive que ficar esperando até alguém aparecer e me ajudar”. Após as risadas, fomos para o estúdio e iniciamos a gravação.

O Rei Momo de Artur Nogueira é um homem simples, que sempre gostou de estar em contato com outras pessoas. Nascido em Araras, viveu boa parte da vida em Conchal, com os pais e os seis irmãos. Já trabalhou na roça, catou lixo, foi vereador e até palhaço. Desde 2009 mora com a esposa em Artur Nogueira.

Durante a entrevista, descobrimos que ‘Bênção’ também tem outro apelido e que saiu triste de Conchal, cidade que morou antes de vir para Artur Nogueira. Saiba o porque a seguir:

Você praticamente tem duas identidades. Em Conchal todos te conhecem como ‘Jacaré’. Aqui, em Artur Nogueira, você é o ‘Bênção’. De onde surgiram esses apelidos? Olha, me chamo Wagner Júlio, mas ninguém me conhece por esse nome. O apelido de Jacaré pegou lá em Conchal depois de eu ter participado de um concurso de dança. Isso faz um tempão. Me convidaram para concorrer ao lado de várias mulheres, uma mais linda que a outra, tinha mais de dez candidatos, e eu acabei ganhando. No momento da entrega do prêmio o apresentador brincou comigo e disse que eu era o Jacaré do grupo ‘É o Tchan’ [risos]. Depois disso todo mundo de lá passou a me chamar de Jacaré e o apelido pegou.

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E Bênção? Nasceu depois de uma conversa que eu tive com um pastor em Paulínia. Ele me disse que nesta vida devemos agradecer a todo o momento a graça que Deus nos dá. Disse que vivemos uma bênção todos os dias. E eu coloquei isso na cabeça e comecei a chamar todo mundo de ‘Bênção’. O resultado voltou para mim e fiquei como aquele que dizia ‘Bênção’ pra todo mundo [risos]. Lá atrás tive outro apelido também. Na época em que eu colhia laranja, o pessoal costumava me chamar de ‘Cleber do Palmeiras’, porque diziam que eu era parecido com o jogador. Mas esse apelido não pegou por muito tempo. Hoje, eu sou o Jacaré em Conchal e o Bênção em Artur Nogueira. Meu pai também tem um apelido engraçado. O nome dele é Antônio, mas no começo todos o chamavam de ‘Ticão’, com o passar do tempo o apelido foi mudando e hoje todos o conhecem como ‘Cão’ [risos].

Você disse que já colheu laranja. Quais outras funções já exerceu? Nossa, já fiz quase tudo nessa vida. Nunca nada de errado, graças a Deus, mas já trabalhei muito. Comecei a trabalhar na roça cedo para ajudar meus pais. Sempre fui pobre, mas isso nunca foi motivo de tristeza, acho que a maior alegria são as pessoas que a gente carrega no coração. Na roça, colhi laranja e cortei cana, mas não estava satisfeito com aquela vida. Queria trabalhar no meio do povão. Sempre fui daqueles que gostou de conversar com as pessoas. Daí prestei Concurso Público na Prefeitura de Conchal e passei. Fui trabalhar como catador de lixo. Foi uma época muito boa na qual fiz muitas amizades. Catava o lixo dando risada, cantando, brincando com os moradores e esse meu jeitão foi conquistando o povo de lá. Trabalhava na Prefeitura durante o dia e à noite eu era palhaço.

Como assim? Eu ganhava dinheiro animando festas. Era conhecido como o ‘Palhaço Jacaré’. Sempre fui de brincar. Pra mim era um puro divertimento que ainda ajudava em casa com o dinheiro que ganhava. As crianças adoravam e até os adultos entravam na brincadeira. Eu caia no chão, levava aqueles tombos, contava piadas e todo mundo ria. No Natal, me fantasiava de Papai Noel e ia para a praça conversar com a criançada.

Foi nessa época que você decidiu entrar para a política? Foi sim. Me convidaram para ser candidato a vereador e eu topei. Concorri e fui o candidato mais votado. Conquistei 876 votos. Durante todo o legislativo também fui presidente e vice-presidente da Câmara Municipal de Conchal. Mesmo tendo sido vereador continuei exercendo a função de catador de lixo por algum tempo. Eu amo política. Sempre gostei de estar no meio do povo e ajudar aqueles que mais precisam.

Benção

Você foi eleito vereador em 2004 com quase 900 votos. Nas eleições de 2008 tentou a reeleição mas obteve apenas dois votos. O que aconteceu? Fui traído pelo meu partido. Me deram vários papeis para eu assinar, e como eu confiava nas pessoas, assinei sem ler o conteúdo. O documento mudava o meu número de 20012 para 20004. Todo santinho e material utilizado durante a minha campanha foi baseado no número 20012. Eu saía nas ruas pedindo que meus eleitores votassem nesse número. No final fui surpreendido com o resultado. Na época falei com o juiz, mas não havia mais nada para ser feito. Sei que tive centenas de votos, mas quem votou em mim, inclusive eu, votou em um número que não existia e foi anulado. Fiquei muito triste com isso.

Benção

E depois? Como era concursado na Prefeitura, voltei para o cargo de Serviços Gerais. Me colocaram para trabalhar no Centro de Zoonose de Conchal. Entre minhas funções, eu tinha que recolher animais, como gato e cachorro, que estavam mortos em ruas e praças da cidade. Nunca reclamei da situação. Sempre gostei de trabalhar. Mas alguns amigos começaram a dizer pra mim que aquilo que estavam fazendo comigo era perseguição política. Fui colocando aquilo na cabeça e não aguentei. Foi aí que me mudei para Artur Nogueira.

Já conhecia o município ‘Berço da Amizade’? A família da minha esposa sempre morou aqui. Minha mulher veio pra cá primeiro. Eu fiquei lá em Conchal pra ajeitar as coisas. Me lembro como se fosse hoje. Saí de lá à noite, por volta das 11 horas da noite, fui pra pista e peguei carona pra cá. Quando cheguei no trevo de Artur Nogueira comecei a chorar, porque estava abrindo mão de um sonho em Conchal. Eu não tinha, e ainda não tenho, nada aqui. Aluguei uma casinha e fui procurar emprego, mas não deu muito certo. Da necessidade daquele momento minha esposa aprendeu a fazer trufas de chocolate e eu saí pelas ruas vender. Isso foi uma verdadeira bênção em minha vida. Foi vendendo trufa cedo, à tarde e à noite que consegui me estabilizar.

Profissionalmente, hoje, como você vive? Trabalho como jardineiro em um condomínio aqui em Artur Nogueira. Limpo os terrenos, planto flores e árvores, mantenho o lugar organizado. Mas ainda continuo vendendo trufas. Nas horas vagas, pego minha caixinha e saio visitar os clientes. É um renda a mais que ajuda muito no final do mês.

Como já me disse você já trabalhou na roça, já foi catador de lixo, palhaço, vereador, vendedor de trufas e jardineiro. Como foi que teve a ideia de concorrer ao título de Rei Momo do Carnaval de Artur Nogueira? Quem me convidou para participar foram meus amigos Didi e Amilton, que trabalham na Secretaria Municipal de Cultura. Eles me pararam na rua e disseram que eu deveria me candidatar. Não sei se eles falaram sério, mas eu coloquei na cabeça e fui. Lembrei da época em que participei daquele concurso de dança em Conchal, no qual começaram a me chamar de ‘Jacaré’, e fui com tudo. Achei que seria coisa pequena, mas o concurso aqui foi tenso. Tinham vários outros candidatos, teve a prova da comida, que tivemos que comer uma macarronada depressa e sem deixar cair nada. E claro, o samba no pé. Tinha muita gente na Escola Modelo, mas no final deu tudo certo. Fui eleito e estou pronto para movimentar a folia nogueirense.

Você vai desfilar em cima do carro da Corte da Folia ao lado de lindas mulheres. A rainha Wanessa Pamplona e as princesas Adrielle e Jeynifer. A sua esposa não ficou com ciúmes? Sabe que no começo ela nem percebeu esse “detalhe” [risos]. Na semana passada, eu estava falando com ela de como vai ser bonita a minha fantasia e ela parou por um instante e disse, dando risada, que era pra eu ‘tomar cuidado’. Demos risadas e tudo está bem.

Também espero que tudo fique bem [risos]. Não posso terminar esta entrevista sem te fazer uma pergunta. Você pretende se candidatar para vereador em Artur Nogueira? Ainda é muito cedo para dizer qualquer coisa. Isso vai depender do cenário político que vamos ter no município. Uma coisa não é segredo para ninguém: eu amo política e, como já disse, gosto de ajudar a população. O futuro a Deus pertence.

BençãoFotos: Renan Bússulo

Benção
Caricatura: Tomás de Aquino


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