22/03/2014

ENTREVISTA: Armando relembra como foi abrir a primeira lanchonete da cidade

Ele saiu há 43 anos de São José do Rio Pardo para combater a malária em Artur Nogueira. Depois de algum tempo se apaixonou pelo município ‘Berço da Amizade’. Foi o primeiro a abrir uma lanchonete na cidade e hoje é tido como o autor do lanche mais tradicional de Artur Nogueira. Na entrevista desta semana conheça a história do Armando do Bar

Armando

“Para fazer um bom lanche é necessário muito mais do que bons ingredientes, é preciso carinho” (Armando)

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Alex Bússulo

Aos 73 anos de idade, Armando Antônio Garcia pode ser considerado como o dono do lanche mais tradicional de Artur Nogueira. Proprietário do ‘Armando Bar’ localizado no auto posto Xanfra, na Avenida 15 de Novembro, o nogueirense possui uma história de trabalho e dedicação no município.

Difícil quem nunca tenha experimentado um lanche, uma vitamina ou então o arroz doce do Armando. Mas poucas pessoas sabem como foi que ele veio parar aqui em Artur Nogueira.

Armando nasceu no dia 31 de maio de 1941 em São José do Rio Pardo/SP. Filho do casal Antônio Garcia Rodrigues e Arnalda Bertaglia Garcia, teve dez irmãos. Aos 12 anos, já sabia sobre a importância do trabalho. “Durante o período da manhã eu trabalhava em um mercadão, vendendo frutas. Meu pai tinha uma loja dentro do espaço e, junto com meus irmãos, eu o ajudava. Trabalhava até às 11 horas depois ia para casa, tomava um banho, me arrumava e ia para a escola”, conta Armando.

Foi nessa mesma época que ele aprendeu a fazer lanches. Fazia bicos como chapeiro na lanchonete da Rodoviária de São José do Rio Pardo. “Foi lá que aprendi a fazer o meu Americano, X-Tudo, X-Salada e todos os lanches que fiz em toda a minha vida”, relembra.

Aos 18 anos de idade, ele se alistou no 17º Regimento de Cavalaria, no Exército de Pirassununga. “Sempre tive o sonho de ser militar. Queria entrar para as Forças Armadas e trabalhar por meu país. Fiquei seis meses como recruta, depois prestei concurso para motorista e passei a dirigir para um importante coronel. Ia para São Paulo, Rio de Janeiro, onde ele precisava ir eu o levava. Ao todo fiquei 14 meses no exército, depois tive que sair pois não tinha os estudos exigidos para continuar”, afirma Armando.

Com 19 anos, ele retornou à casa dos pais, em São José do Rio Pardo. Foi quando o destino dele começou a ser traçado rumo à Artur Nogueira. “Eu tinha um irmão que era chefe da ‘malária’, um departamento de Saúde do Governo do Estado de São Paulo, que combatia a doença, transmitida pelo bicho barbeiro, em todo o estado. Antigamente, a malária matava muita gente. Por isso o governo tinha um programa para erradicar a doença. Eu estava em busca de emprego e meu irmão me convidou para prestar um concurso, em Campinas. Como precisava, prestei o concurso para ser chefe de equipe de combate à malária. Passei e fui destinado para o Posto de Saúde de Artur Nogueira. Isso em 1961. Nunca tinha ouvido falar de Artur Nogueira. E a profissão exigia que eu e minha equipe nos mudássemos para a cidade”, relembra.

Armando

Ele conta que quando chegou aqui, a cidade era bem diferente dos dias de hoje. “Quando cheguei aqui o município de Artur Nogueira era bem maior que agora, pois também abrangia Engenheiro Coelho e Holambra. Me recordo que havia muito mais casas na zona rural do que na cidade. A Avenida Dr. Fernando Arens era de cascalho, não de asfalto como é hoje. Dava para contar nos dedos os comércios que tinha”, conta.

Armando chegou pela primeira vez em Artur Nogueira, já com as malas, na noite de um domingo. Ele veio liderar a equipe de combate da malária. Ao lado de mais quatro homens, ele chegou em uma camionete cabine dupla. “Foi a primeira camionete deste tipo que entrou em Artur Nogueira. Chegamos e fomos direto para o Bar Antártica, pedir informações sobre onde morava o prefeito, Jacob Stein, que havia solicitado a nossa equipe”, afirma.

Às 21 horas bateram na porta da casa do prefeito. Armando conta que Jacob Stein recebeu a equipe com um grande sorriso no rosto, pois sabia da importância dela para a saúde da população nogueirense. O prefeito subiu na camionete e acompanhou a equipe até a pensão da dona Antônia Pedreiro, uma velha senhora que era dona da única pensão da cidade, que acolhia médico, delegado, mecânico, entre outros profissionais que prestavam serviços para o município. Era uma pensão simples que ficava localizada na esquina das Ruas Ademar de Barros e São Sebastião.

A partir daí, Armando passou a coordenar a equipe que visitava e fazia a dedetização nas casas. “Nós chegávamos nas residências, pedíamos licença e, com a autorização do dono da casa, afastávamos os móveis para o meio da casa, cobria tudo com um encerado e dedetizava as paredes, atrás dos móveis e quadros. No final colocávamos uma pequena placa atrás da porta, constando o dia e o ano em que a residência foi dedetizada”, resume.

Armando se diverte ao se lembrar de algumas situações engraçadas por qual passou. “Em uma das visitas, uma mulher correu atrás da nossa equipe com uma foice, porque ela achava que nós íamos passar um veneno que iria prejudicar a saúde dela. Tivemos que buscar ajuda da polícia para conseguirmos dedetizar a casa da senhora [risos]”, afirma.

Armando

“Também teve uma vez que fomos dedetizar uma fazenda que produzia linguiça. O pessoal do local havia colocado vários gomos para secar em um varal e um dos meus funcionários não resistiu e pegou quase um quilo de linguiça. Ele escondeu a mistura dentro de uma bolsa, junto com alguns produtos e sacolas. Quando terminamos o trabalho, o dono da fazenda veio até mim e me pediu alguns saquinhos com veneno para dedetizar outras áreas. Falei que tudo bem e que ele poderia pegar dentro da bolsa. Ele foi até lá e encontrou a linguiça. Eu não sabia onde colocar a cara de tanta vergonha. Pedi desculpas pelo ocorrido. O funcionário negou até a morte que não tinha pegado a linguiça. No final deu tudo certo. O fazendeiro levou na brincadeira e ainda nos deu quase três quilos de linguiça para cada um da equipe”, relembra.

Armando é casado há 48 anos com a nogueirense Tereza Magossi Garcia, com quem teve duas filhas: Márcia e Maura. Ele conheceu a esposa durante uma dedetização, poucos meses após chegar em Artur Nogueira. “Eu fui falar com o dono da casa e vi que ele tinha uma filha muito bonita. Troquei alguns olhares com a moça, mas não conversamos. Foi a casa que eu mais demorei para dedetizar [risos]”, relembra.

digitalizar0073Foto: Geso Franco de Oliveira (Casa da Memória)

Ele ficou interessado na jovem moça e descobriu que ela frequentava a missa aos domingos. “O melhor lugar para arrumar uma namorada era na missa, de manhã. No outro domingo fui o primeiro a chegar na igreja. Ela também chegou e, mais uma vez, trocamos alguns olhares. Naquela época, os jovens faziam ‘a praça’, na frente da Igreja Matriz. Os homens circulavam de um lado e as mulheres do outro. Sempre cruzando de frente. Foi em um desses passeios que eu perguntei a Tereza se eu poderia acompanhá-la até a casa dela. Ela disse que até a casa não podia, mas que eu poderia levá-la até a Padaria Ypê. Conversamos e no final nos despedimos com um aperto de mão. Depois disso nos encontramos em algumas festas. Depois de 6 meses, fui pedir a mão da Tereza. Namoramos por dois anos e nos casamos na Igreja Nossa Senhora das Dores”, conta Armando.

Antes do casamento, Armando decidiu deixar o trabalho contra a malária. “Nosso serviço em Artur Nogueira estava acabando e a nossa equipe seria transferida para outra cidade. Mas eu já havia me apaixonado por este município que me acolheu. Portanto, tive que escolher ficar aqui. Pedi minha demissão e dei início a mais uma fase da minha vida, a que levo até hoje”, afirma.

Armando

Na época havia quatro bares em Artur Nogueira: Antártica, Bar da Igreja, Floresta e o Bar Carrari, este último que ficava ao lado do Bradesco. Mas nenhum deles fazia grandes lanches. O que alguns preparavam eram pão com linguiça e queijo. Não tinha nenhuma lanchonete ou trailer de lanche. “O Leonel e o Chico Carrari estavam cansados de lidar com o bar e me ofereceram o ponto. Foi o negócio que eu esperava. Sabia fazer lanches e sabia que era um bom negócio aqui na cidade. Então comprei meu primeiro ponto, que transformei em uma lanchonete”.

Nascia assim o Armando Bar, o primeiro ponto que fazia grandes lanches em Artur Nogueira. “Em um único final de semana, eu chegava a fazer 1.300 lanches, isso numa época muito atrás. Vinha gente de todo o lugar comer o meu lanche. Eu cheguei a ter 10 garçons. O bar funcionava praticamente 24 horas por dia aos finais de semana. Calculo que eu já tenha empregado mais de 300 funcionários. Pessoas que passaram por mim e hoje são grandes profissionais”, relembra.

Depois de oito anos, Armando vendeu o ponto ao lado do Bradesco e comprou outro bar, em frente à Praça do Coreto, onde hoje é a Loja da Claro. Ficou por mais seis anos e se mudou para outro ponto, agora em frente ao Supermercado Rossetti. Depois de cinco anos, vendeu novamente o bar e comprou outro, conhecido na época como Sputnik. Este ponto é o único local que passou pelas mãos de Armando que ainda hoje continua sendo bar, em frente a base da Guarda Municipal, no centro.

digitalizar0080Foto: Geso Franco de Oliveira (Casa da Memória)

“Em 1990, o Rubinho e o Xanfra estavam construindo um posto de combustíveis na Avenida 15 de Novembro e me convidaram para montar uma lanchonete de conveniência. Eu topei. Vendi o Sputnik e montei a lanchonete onde estou até hoje”, afirma Armando.

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O principal lanche do Armando, mais pedido pelos clientes, é o Americano, feito com pão de forma. Ele também prepara um prato doce que atraí e fideliza clientes há anos: o tradicional arroz doce do Armando. “Quem me passou essa receita foi a minha sogra. Depois minha esposa começou a fazer e, hoje, sou eu mesmo que preparo. Muita gente vem aqui só por causa do meu arroz doce. Eu até dou a receita para os clientes, mas ninguém consegue fazer igual ao que eu faço [risos]”, afirma.

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Armando trabalha todos os dias da semana. De domingo a domingo. Não fecha nem em feriado. Das 8 da manhã às 22 horas. Ele conta que já parou de trabalhar em duas situações, mas voltou logo na lanchonete. “Sempre gostei de trabalhar. Sou muito feliz fazendo o que eu gosto. Para fazer um bom lanche é necessário muito mais do que bons ingredientes, é preciso carinho”, conta.

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Em novembro de 2013, Armando teve uma ameaça de AVC. “Comecei a passar mal, minhas mãos e pernas começaram a adormecer. Fui socorrido pelo Dr. Décio Queiroz, que me encaminhou com urgência para o Hospital Vera Cruz, em Campinas. Fiquei internado por três dias. Saí do hospital no sábado às 10 horas da manhã e, às 16 horas, já estava trabalhando na lanchonete”, revela.

Outra paixão de Armando são os Fuscas. “Sempre tive Fusca. Um carro fácil de estacionar, fácil de arrumar, não quebra, pode deixar com a chave no contato que ninguém rouba. Para mim é o carro. Tenho outros veículos, mas a paixão está no Fusca”, conta o nogueirense.

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O segredo do sucesso de Armando está no amor que ele coloca no trabalho. Está há mais de 60 anos fazendo lanches e agradando clientes de toda a região. Um nogueirense que faz o que gosta e é admirado pelos deliciosos pratos, sejam eles doces ou salgados.


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