16/10/2014

Conheça a história do rio mais importante de Artur Nogueira

POQUINHA: As águas dele já abastecem há muito tempo parte das casas de Artur Nogueira. Em um futuro próximo este rio deve se tornar a grande fonte hídrica do município – até mesmo maior que a Represa Cotrins

Isadora Stentzler

Correm os filhos de Dona Castorina para se refrescar do calor. Era verão e a melhor parte do dia era nadar no rio ao fundo de casa. Mergulhar nos dois metros de profundidade e de lá sair só depois de muito brincar. Mas isso, só quando o marido não pescava, porque cada coisa deveria ser feita na sua hora.

É que nos fundos da casa de dona Castorina Forti, uma senhora que veio com o marido de Piracicaba para Artur Nogueira em 1965, há um rio, o conhecido Rio Poquinha.

O nome verdadeiro é Ribeirão da Boa Vista, um riacho de cerca de 16 km de extensão e 3 metros de largura, começando na divisa entre Artur Nogueira e Mogi Mirim e terminando no bairro Bom Retiro. Ele é resultado do desemboco dos córregos Cachoeira, Sertório, Mato Dentro e Taperão – todos nogueirenses.

Ali há comunidade de peixes pequenos que migram conforme o movimento do rio. São cardumes de lambaris, tainhas e bagres pequenos que oras estão à beira dos afluentes, oras na grande bacia do Piracicaba.

O casal que veio jovem à Artur Nogueira e fala sobre o rio, tem 73 anos cada e mora hoje no bairro dos Correias. Os cabelos são grisalhos e os olhos claros, mas apesar da idade as lembranças são bem vivas. “Eu já pesquei ali”, começa a relembrar seu Antônio Forti, marido de dona Castorina. “Pegava umas tabaranas grandes assim”, e abre as mãos numa distância de 10 centímetros para mostrar o tamanho. “Mas hoje… pescar até dá, o difícil é saber se você vai pegar algo. Do tempo que eu vim morar aqui até agora, da pra bem dizer que ele ta seco.”

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Com o tempo o nível do Poquinha diminuiu em algumas partes – como se viu no trecho que passa pelo bairro dos Correias –, mesmo assim, o rio continua sendo importante à cidade exatamente no quesito hídrico. “Hoje o Rio Poquinha tem grande importância agrícola, ecológica e sobretudo hídrica para o município”, ressalta o secretário do Meio Ambiente de Artur Nogueira, Helton Bassi Filippini. É que o Ribeirão da Boa Vista tem o maior montante hídrico de Artur Nogueira, com 70 km² de bacia, maior que a própria represa Cotrins, mas apenas 17% da água do rio é destinado ao consumo. “Mas no futuro a maior parte da captação de água de Artur Nogueira dependerá do Rio Poquinha, porque não há mais o que fazer com a represa Cotrins. A não ser que que os reservatórios sejam ampliados, o que é inviável”, pontua Filippini.

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Segundo aponta a projetista Maria Augusta P. Machado, do Serviço de Água e Esgoto de Artur Nogueira (Saean), para que a água do Poquinha chegue aos consumidores, ela é submetida a seis etapas. A primeira é a coagulação. Após ser captada, a água recebe uma dosagem de coagulante para que as partículas se tornem mais sólidas. Feito isso o líquido coagulado é levado à tanques para a floculação, onde é transformado em flocos mais pesados. Nesse período também ocorre a aglutinação das impurezas da água e os flocos de impurezas se separaram da água, iniciando a decantação, que coloca os detritos no fundo dos tanques. A água que resta da decantação passa pela filtração a fim de que se eliminem dela as impurezas mais finas e que receba cloro (desinfecção). A última etapa consiste na fluoretação, que adicionada à água fluorsilicato de sódio – substância que ajuda a reduzir a incidência de cárie dentária. Ao término do processo, a água segue para os reservatórios distribuídos pela cidade e então às casas. Algumas que datam do início do século 20.

Riberinhos do Poca

A colonização dos arredores do Rio Poquinha começou em meados de 1.900, quando um projeto do estado de São Paulo incentivou a chegada de imigrantes, sobretudo alemães e italianos, no local. Na época o mundo vivia a primeira guerra mundial, o que levou a evacuação de inúmeros europeus para às Américas.

A chegada dos imigrantes e sua estadia em lotes fez com que a mata ciliar dar margens diminuísse. Hoje, estima-se que 40% foi perdido com a ocupação da área. Mas a Secretaria do Meio Ambiente já trabalha na elaboração de um projeto para recuperação do local. Filippini explica: “Queremos recuperar a mata ciliar em 100%. Para isso faremos um levantamento das áreas degradadas e depois um mapeamento junto dos produtores para saber a quantidade de área que precisa ser revitalizada. Em seguida colocaremos os dados em um projeto e o apresentaremos ao órgão estadual. Com a aprovação poderemos executar e selecionar as mudas para o reflorestamento.”

No percurso do ribeirão é possível identificar áreas com vegetação rala, cobrindo não mais que dois metros de extensão após a margem. Já em outros, a vegetação tomou conta do que era o rio, uma vez que o atual nível do Poquinha difere do de 40 anos atrás.

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O casal Forti se recorda dos primeiros anos em que viveram próximos ao rio. A casa deles ficava há 20 metros do ribeirão, mas tiveram que deslocá-la para cima porque na época o rio era cheio. “Quando chovia muito a água subia bastante, mas graças a Deus nunca atingiu nossa casa”, frisa dona Castorina. O marido da aposentada também conta que havia dias em que a água vertia do solo.

“Hoje dá uma tristeza, né, olhar pro rio desse jeito. Eu lembro que eu descia lá pra lavar a roupa. Iam as outras mulheres também e ficávamos umas três horas lá. Conversávamos e tudo. Era bonito de ver. As crianças também nadavam no rio, mas hoje não tem o que fazer. Nem olhar ele dá gosto. Por que vou descer lá para olhar o quê?”, desabafa Castorina.

Poquinha

Segundo mapas datado de 1915, Artur Nogueira era conhecida como município de Campinas, em que o nome Arthur Nogueira [sic] era citado apenas em referência à estação. Naquele período o Rio Poquinha também era conhecido por outro nome: Ribeirão da Machina.

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Conforme data Filippini, a referência mais antiga para o nome Poquinha é de 1936. “Pesquisei e vi que Poca é uma palavra de origem indígena e que significa estourar”, explica. “Mas também ouvi que um índio chamado Poca morou perto do rio e quando ele morreu as pessoas passaram a chamar o ribeirão de Poquinha, mas não sei mais do que isso.”

Do dicionário de origem de nomes, Poca é identificado como um nome indígena com o significado literal de “aquele que possui beleza”. No aspecto mítico, o nome também estaria relacionado à pessoas que buscam a paz a qualquer custo.

Mas dona Castorina nunca ouviu falar nem de índio Poca, nem de Machina. “Quando cheguei já era Poquinha. O porquê eu não sei”.

Até porque importam à aposentada as histórias vividas naquele rio, que há 49 anos mesclou a própria nascente com a vida da senhora dos olhos verdes.

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