26/03/2017

Casal de Artur Nogueira deixa tudo para ajudar crianças carentes em Bangladesh

André e Camila passarão dez meses realizando trabalho social voluntário no país

Redação

Viajar para o exterior se tornou um sonho cada vez menos distante para muitos brasileiros. A procura por pacotes de turismo, ou mesmo de experiências de intercâmbio, tem aumentado a cada ano. No entanto, um casal de Artur Nogueira resolveu atravessar metade do planeta para realizar um trabalho social voluntário em um país muito peculiar: Bangladesh.

Localizado no sudeste asiático, bem ao lado da Índia, esse distante país confina 150 milhões de habitantes numa área do tamanho do estado do Amapá. Com uma população predominantemente islâmica, Bangladesh é palco de hábitos culturais muito diferentes dos nossos. E nesse cenário de comidas, roupas, práticas e idiomas tão exóticos, o casal nogueirense André Marquetto e Camila Moyano vão realizar um trabalho especial durante dez meses.

Durante os 304 dias que passarão no país, André e Camila darão aulas para crianças carentes do país e buscarão conscientizar as famílias locais sobre as consequências nocivas dos casamentos e abusos infantis praticados por boa parte da população bengali. Confira na entrevista desta semana como o casal está se preparando para imergir na cultura de Bangladesh e saiba como você pode colaborar com o projeto social deles:

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Como vocês têm se preparado para imergir numa cultura tão diferente?

André: Bom, com muitos vídeos de YouTube, muitos sites [risos].

Camila: A preparação começou dois anos atrás, quando a gente decidiu ir. Primeiro teve todo o cadastro. A gente teve que fazer a documentação, passaporte, o cadastro no site de voluntariado, estudo de inglês, a gente tem pegado firme no inglês, também estudamos livros sobre voluntariado, sobre como é estar em outro país, um país islâmico. Para a gente, que está nessa cultura cristã, quando se fala em país islâmico já se pensa em bomba caindo. Então a gente tem que estudar e se preparar. E quando decidimos ir para Bangladesh, começamos a estudar especificamente sobre aquele país. E qualquer notícia que sai sobre Bangladesh a gente lê. A gente conversa com muitas pessoas que já estiveram por lá. E perguntamos tudo. E é engraçado porque, como é uma país muito diferente, a gente pergunta até as coisas mais simples: ‘Tem buchinha de lavar louça aí?’ ‘Não, aqui não tem; vocês têm que trazer outra coisa’. É completamente diferente, então as coisas mais simples têm que perguntar.

André: Eu tenho um conhecido que foi para lá, e ele disse para mim que o que a gente vê como higiene aqui, eles veem como frescura lá. Eu achei legal essa frase porque, coisas básicas, como lavar o cabelo, usar talher, lavar a mão antes de comer, para eles é frescura. Eles comem com a mão mesmo, tomam banho sei lá quantas vezes por semana.

Camila: A roupa também é completamente diferente. A gente teve que pesquisar sobre isso. A gente descobriu que não vamos poder andar de mãos dadas por lá. Então vamos ter que nos acostumar a ficar sem contato físico na rua. De vez em quando a gente treina na rua.

André: A gente sai no mercado e um de nós diz ‘vamos treinar para Bangladesh?’. Daí a gente solta as mãos e faz as compras.

Vocês viajam no dia 2 de abril, certo?

André: Sim, no momento, estamos apenas esperando os vistos chegarem de Brasília. Ainda temos que fazer muitas compras de coisas que vamos ter que levar.

Camila: É porque lá não tem feijão e coisas assim. Daí vamos levar.

André: Vamos levar pelo menos uns dois sacos, porque chegar lá e já começar a comer o que eles comem vai ser estranho. Tem que ser aos pouquinhos.

Camila: Lá é tudo bem apimentado. Eles têm arroz e bastante carne, como aqui.

André: A gente aqui, do Ocidente, olha e acha nojento, mas, na rua, eles fazem umas comidas em frigideiras bem grandes, tudo junto. Eles vão colocando tudo ali, misturado. Daí você vai lá comprar comida e o cozinheiro pega um pedaço de papel qualquer. Tipo, ele foi numa empresa e pegou as folhas que estavam sobrando de relatórios que o pessoal não usava mais. Daí eles pegam esse papel, todo impresso mesmo, e usam para servir a comida.

Camila: Essa é a comida de rua deles.

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Como vocês se conheceram e de onde veio a ideia de iram para o outro lado do mundo realizar um projeto social?

Camila: Nossa, faz muito tempo que a gente se conheceu.

André: A gente tem um relacionamento há dez anos. Já terminamos e voltamos, como qualquer relacionamento normal. Mas, desde que começamos a namorar, faz dez anos.

Camila: Foi a primeira vez que a gente namorou.

André: Eu sou dois anos mais velho que ela. A gente estudava na escola adventista ali perto da Lagoa dos Pássaros nessa época. E a gente se conhecia de lá. Eu lembro que, na época, eu gostava de uma amiga dela. Só que a escola inteira gostava da mesma menina. Daí eu deixei quieto isso e comecei a conversar com a Camila. E a gente foi se conhecendo.

Camila: Eu demorei um pouco para perceber que ele gostava de mim, porque eu era muito novinha. Daí, quando eu fiz treze anos, a gente começou a namorar. Então ele se formou no Ensino Médio e eu fui cursar o Ensino Médio em outro colégio da rede adventista, lá em Hortolândia. Ele foi comigo. Eu fazia o Ensino Médio, e ele fazia a faculdade. Daí eu terminei os estudos e fui cursar a faculdade em outro lugar, em São Paulo. Ele ficou em Hortolândia. Daí a gente deu uma brigada e terminamos. Quando eu estava no meio da minha faculdade, a gente voltou a se falar. Ele já tinha terminado a faculdade dele, tinha ido embora de Hortolândia. Foi então que a gente voltou a se falar e também voltamos a namorar. E desde essa volta, que foi em 2013, começamos a planejar o casamento, e foi aí também que surgiu a ideia do voluntariado.

E quando vocês casaram?

André: Dezembro

Camila: Dia 11 de dezembro de 2016.

André: Eu me formei em 2013 e fui morar em Santa Catarina. E ela ficou aqui. Então a gente se via a cada quatro meses.

Camila: Quando tinha feriado prolongado, a gente aproveitava para se ver.

André: Estávamos esperando ele terminar a faculdade. Ela terminou no final de novembro do ano passado. Daí casamos em dezembro, e eu vim de volta para cá.

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E por que vocês escolheram Bangladesh?

André: Então, lá no site de voluntariado, você entra e escolhe para onde quer ir. Mas, no nosso caso, foi o contrário. Foi Bangladesh que escolheu a gente. A gente já conversava há dois anos sobre isso, e sempre procurávamos oportunidades de voluntariado. A gente tentou ir para vários países, mas nenhum estava dando certo. Ou eles exigiam um nível muito avançado de inglês, e a gente é intermediário, ou eram para solteiros, e a gente estaria casado.

Camila: A maioria é para pessoas solteiras.

André: A gente procurou por dois anos e não achamos nada. Daí eu já disse para ela: ‘Ah, vamos deixar isso quieto. Vamos casar, ficar por aqui um tempo, e depois tentamos de novo’. E, no dia seguinte ao que eu disse isso, um professor dela, que já estava em Bangladesh para fazer esse mesmo projeto, ligou para a Camila. E disse: ‘Camila, estou aqui em Bangladesh fazendo esse projeto, mas eu vou embora e preciso de alguém que continue no meu lugar. E você e o André vão casar, não vão? Vocês dois não querem vir aqui ajudar no projeto?’ Daí a Camila me contou, e a gente viu que era para ser esse. Porque, até ali, não tínhamos encontrado nenhum outro e, quando a gente desiste, aparece esse chamado no dia seguinte.

Camila: Nós estamos indo lá para ajudar, e não tem como não ser útil em Bangladesh, porque lá eles precisam de tudo: dinheiro, comida, atenção, conversa, cuidados médicos. Qualquer coisa que você fizer lá, será útil.

E como a família e os amigos reagiram quando vocês anunciaram que vão para Bangladesh?

André: Acho que o normal dos pais, se a gente dissesse que vamos para os Estados Unidos, seria uma reação totalmente diferente. Mas quando a gente fala Bangladesh, até a ficha deles cair de que a gente está indo porque a gente quer, a gente teve que ouvir bastante preocupação deles. Tipo: ‘Vocês têm certeza? Lá é muito diferente, vocês vão estranhar. É um ano inteiro? Tem certeza?’.

Camila: ‘O país nem é bonito. O que que vocês vão fazer lá? [risos] Ás vezes a gente recebe no Whatsapp notícias de coisas ruins que estão acontecendo lá.

André: E quando a gente lê a notícia, vê que ela é de três anos atrás. [risos].

Camila: E a gente que tem que acalmar as pessoas. Mas nossos pais nos apoiam desde o início. Eles acham legal a ideia, mas têm aquela preocupação de pais.

André: Já os amigos não parecem tão preocupados, eles parecem mais empolgados mesmo.

Camila: Ou é empolgação ou é, tipo: ‘Meu, que loucura. Fiquem aqui no Brasil. O que vocês vão fazer lá?’.

E o que exatamente vocês vão fazer lá?

André: Vamos ser professores. Dar aulas.

Camila: Essa escola em que vamos trabalhar é para crianças carentes. E lá tem os professores que dão as matérias normais de escola.

André: São matéria em que precisa ser falado o idioma deles porque eles falam pouco inglês.

Camila: Lá eles falam o bengali. É um negócio bem esquisito. A gente tem um aplicativo aqui, mas não conseguimos entender nada [risos]. Então tem esses professores das matérias essenciais. Eles é que vão fazer os alunos conseguirem um nivelamento para a realização da prova de qualificação. As matérias que nós dois daremos não existem na grade normal de lá. E muitas crianças de lá são abusadas pelos pais ou vendidas em casamento.

André: Abusadas em vários sentidos, tanto em trabalho quanto fisicamente. Elas começam a trabalhar cedo. Com sete anos de idade, pelo que vimos em vídeos, elas já estão com martelo na mão, quebrando pedras.

Camila: As crianças das famílias carentes não entram na escola, elas não têm essa ambição. Então elas serão trabalhadoras para o resto da vida. E é por isso que a Psicologia lá será importante, pois a gente pode conversar, tentar descobrir quais dessas crianças são abusadas em casa, talvez a gente consiga conversar com os pais. Lá, aos onze anos de idade, as meninas são vendidas em casamento. Também é algo sobre o qual a gente pode tentar conversar e lidar. Porque é mais importante para os pais o dinheiro que eles vão receber por essa criança do que o dinheiro que eles vão ter que gastar na educação dela. E a Educação Física é algo que eles não têm lá. Não existe.

André: A gente vai meio que trabalhar juntos as nossas matérias. Por meio do esporte, a gente aproxima bastante as pessoas. E, através desse contato que teremos com as crianças por meio do esporte, vamos conseguir trabalhar essas coisas que a Camila falou.

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E esses abusos que vocês mencionaram são algo cultural do país ou são atitudes combatidas?

André: Então, é cultural, não tem muito como combater.

Camila: Eu acho que a gente não vai conseguir mudar a realidade.

André: Mas podemos tentar melhorar a vida das crianças de lá.

Camila: Se a gente conseguir aliviar o sofrimento de uma criança, conseguindo ter uma abertura com os pais, já é alguma coisa. Mas lá é realmente uma cultura. Não são só as crianças que são abusadas. As mulheres também, porque lá a cultura é bem machista. As mulheres ficam em casa, têm que tampar o corpo todo; quando você olha as fotos, só tem homem na rua, só homens trabalhando.

E o que motiva vocês a desenvolverem esse projeto social do outro lado do mundo e não aqui?

Camila: As pessoas sempre falam: ‘Por que vocês não fazem o trabalho aqui? Aqui também tem gente que precisa”. Eu sei que aqui tem gente que precisa, mas aqui tem muitas pessoas que podem ajudar aquele que precisa. Mas são poucas as pessoas que querem ir lá do outro lado do mundo e ajudar lá também. Bangladesh é uma país inteiro pobre, inteiro. Então as pessoas de lá, de dentro do próprio país, não conseguem se ajudar. Então eu penso que nós somos parte de um grupo pequeno de pessoas que querem ajudar do outro lado, e aqueles que estão aqui e que precisam de ajuda têm gente que pode os ajudar por aqui.

André: No começo, quando entramos nessa de procurar um lugar, queríamos um país onde poderíamos aprender uma nova língua e conhecer novos lugares. E não estávamos conseguindo. Daí, quando apareceu Bangladesh, eu tive dificuldade de aceitar. A gente tinha combinado que eu ia escolher um lugar para a gente ir e, se não desse certo, ia ser a vez de ela escolher. E íamos trocando. Eu escolhi um e não deu certo. Daí ela escolheu a Tailândia. Tentamos, e não deu certo. Aí escolhi outro, que não deu certo. Daí já pensei em deixar isso quieto. Foi quando o professor dela a chamou.

Camila: E era a minha vez de escolher. [risos]

André: E agora eu tenho que aceitar. Mas depois de pesquisar sobre o local, comecei a ter vontade de ir também. E estou feliz porque estamos indo para lá.

Camila: A nossa ideia é imergir mesmo na cultura deles, não é fazer turismo. Queremos entrar o máximo possível em contato com eles. Não adianta nada chegarmos lá de calça jeans e camiseta e querermos que eles nos escutem. Então estamos indo realmente para comer o que eles comem, viver onde eles vivem, vestir o que eles vestem, tentar falar a língua deles, que é bem difícil, ouvi-los para saber quais as necessidades deles. Por isso que vamos ficar lá por 10 meses.

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Colabore

O trabalho de André e Camila é totalmente voluntário. Eles não receberão salário pelo serviço realizado. Por isso, além do dinheiro que ajuntaram durante dois anos, eles dependem da ajuda de amigos e familiares. Você também pode apoiar o trabalho do casal com qualquer quantia em dinheiro. Basta depositar na conta deles:

Banco Bradesco
Conta Poupança: 1004475-8
Agência: 314
André Luis Anselmo Marquetto

Telefone para contato: (19) 98293-3201.

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