10/04/2018

Autora relembra criação do hino de Artur Nogueira há 48 anos

Aos 82 anos, professora Cidinha fala da trajetória de amor e compromisso com o município “Berço da Amizade”

Alex Bússulo

Em comemoração ao aniversário de 69 anos de Artur Nogueira, que será celebrado nesta terça-feira, 10 de abril, escolhemos homenagear uma nogueirense que fez história no município ‘Berço da Amizade’. Nascida em Ribeirão Preto há 82 anos, Aparecida Alves da Silva Posi descobriu cedo a paixão pelos estudos e pela música. Aos 18 anos concluiu o Magistério e começou a dar aulas. Anos depois, saiu de Campinas (SP) e se mudou para Artur Nogueira, onde se tornou uma das primeiras professoras da cidade.

Dando aulas no antigo Grupo Escolar Francisco Cardona, sempre arrumava tempo para ensinar a arte da música aos alunos. Foi a professora que criou e organizou a ‘bandinha rítmica’, que reunia mais de 70 crianças e que até chegou a se apresentar em um famoso programa de televisão. Há 48 anos, Cidinha foi convidada para compor o Hino Nogueirense. Pedido que aceitou, tendo a honra de escrever a letra e fazer a música.

Dona Cidinha é viúva do saudoso Renê Marcos Posi, um dos primeiros a pensar em Cultura em Artur Nogueira, e que hoje empresta o nome para o Teatro Municipal, localizado no Centro da cidade. Renê foi um homem que lutou pela arte e pela construção do teatro, mas não conseguiu ver seu sonho realizado, pois perdeu a vida em um trágico acidente.

Nesta entrevista especial, você é convidado a fazer uma viagem à história de Artur Nogueira. Já aposentada, dona Cidinha fala sobre sua missão como professora, como escreveu o hino do município e sobre a vida do marido.

Por que escolheu ser professora? Porque eu sempre gostei de crianças. Sempre gostei de ensinar e dar aula para os pequenos. Por muitos anos eu lecionei para as primeiras séries. Gostava muito de ensinar os meninos e meninas a ler e a escrever. Alfabetização sempre foi uma paixão que eu carreguei no coração. No meu tempo, as crianças eram boas, muito educadas. Era muito prazeroso dar aula e ensinar. Hoje, eu já estou aposentada, mas, pelo que escuto falar por aí, as coisas estão mais difíceis para os professores.

A senhora morava em Campinas quando decidiu se mudar para Artur Nogueira, em 1964. O que a trouxe ao município ‘Berço da Amizade’? Vim para esta cidade justamente para dar aula. Eu tinha uma tia que morava aqui e fiquei sabendo que estavam precisando de uma professora. Saí de Campinas (SP) e me mudei para trabalhar no antigo Grupo Escolar Francisco Cardona, que naquela época ficava localizado na Avenida Dr. Fernando Arens, onde hoje está o prédio desativado da Biblioteca Municipal.

Cidinha

E como era a cidade naquele tempo? Olha, faz mais de cinquenta anos que eu me mudei para Artur Nogueira e posso garantir que tudo mudou. Lembro-me que, quando cheguei aqui e vi aquela avenida sem asfalto e com aquela luz bem fraquinha que iluminava à noite, foi um choque. Eu morava em Campinas (SP), uma cidade muito maior e desenvolvida do que Artur Nogueira, que na época fazia poucos anos que tinha sido emancipada. Tinha poucas casas e comércios. Mas depois que me mudei e comecei a trabalhar aqui, me apaixonei pelas pessoas e pela cidade. Gostei tanto que estou aqui até hoje e nunca pensei em me mudar. Foi aqui que eu trabalhei, criei meus filhos, fiz amigos e é aqui que eu pretendo ficar até a minha morte.

A senhora foi uma das primeiras professoras de Artur Nogueira. Como era lecionar naquela época? O Grupo Escolar Francisco Cardona tinha como diretor o senhor Érico Conti e outras poucas professoras. Vim para dar aulas como professora substituta; foi só depois que consegui me efetivar. Eu tinha um relacionamento de amizade e de respeito com as crianças. Ao todo, fiquei 22 anos dando aula apenas para a primeira série. Muitos homens e mulheres, profissionais bem-sucedidos nos dias de hoje, me encontram na rua e me recordam que foram meus alunos. Isso me deixa muito feliz.

Cardona

Tem também uma história de que a senhora organizava uma tal de ‘bandinha’ com os alunos. Do que se tratava? Ah, sim [risos]. A bandinha era formada por meus alunos. Como já disse, eu dava aula para as crianças pequenas. Na época eu lecionava Matemática e Português. Nas horas vagas, eu juntava os alunos e tocávamos vários instrumentos. Criamos uma bandinha rítmica com cerca de 70 crianças. No começo, apresentávamos na própria escola; depois, fizemos grandes participações na região e até na televisão. Lembro-me que fomos convidados para nos apresentarmos na extinta TV Tupi, em São Paulo (SP). Saímos daqui com um ônibus lotado de alunos e aparecemos para todo o Brasil. Foi emocionante e inesquecível. Depois disso, sempre tocávamos em dias comemorativos, tais como o aniversário da cidade, Descobrimento do Brasil, Independência, entre outros. Apresentávamos também no clube da cidade e também no antigo cinema.

Bandinha

Como foi que a senhora escreveu o hino de Artur Nogueira? Em 1970, o diretor do Cardona, Érico Conti, chegou em mim e disse: “Cidinha, todas as cidades tem um hino municipal, e até hoje ninguém escreveu o de Artur Nogueira. Por que você não o escreve?”, ele me perguntou. Depois daquele dia, coloquei aquilo na cabeça e não tirei mais. Os dias passaram e eu comecei a escrever. Não sei quanto tempo eu levei para terminar, mas me recordo que não foram poucos dias. Eu ia escrevendo cada frase e tocando no piano. Assim, a letra e a música ficaram prontas quase que juntas. Só os meus alunos ensaiavam e cantavam. O resto da cidade ainda não tinha conhecimento do trabalho. Até que apresentamos para o prefeito Jacob Stein. Todos aprovaram e gostaram da letra e da música. Mas a oficialização, através de lei, aconteceu apenas três anos mais tarde, em dezembro de 1973.

De onde a senhora tirou inspiração para a letra? Anterior ao ano em que eu escrevi o hino, foi escolhido o slogan do município. Assim como a bandeira e o brasão, a cidade também adotou o lema ‘Berço da Amizade’. No trecho ‘Que tu sejas, Artur Nogueira, sentinela avançada do Brasil’, eu desejei que a cidade alcançasse o progresso, porque naquela época ela era tão pequenininha, não tinha empresas, lojas, quase nada. Hoje, a cidade cresceu e ficou mais bonita.

O hino municipal foi escrito há 48 anos. Se a senhora pudesse mudar ou acrescentar algo a letra nos dias atuais, o que colocaria? Nada. Mesmo após todo esse tempo eu não mudaria nenhuma vírgula. Quando escrevi a letra, pensei em homenagear aquele município que me acolheu tão bem anos atrás. O nosso hino é uma homenagem a Artur Nogueira e, principalmente, ao povo nogueirense.

Qual é o sentimento que a senhora tem quando houve o hino do município? Fico muito emocionada. Posso ouvir quantas vezes for que ele sempre toca o meu coração. Porque ele foi feito com tanto cuidado, tanto amor. Quando ouço me recordo das crianças cantando e de tudo aquilo que Artur Nogueira já foi e conseguiu se transformar nos dias atuais. Já visitei muitas escolas do município e já recebi muitas homenagens das crianças. Também já recebi o título de Cidadã Nogueirense pelas mãos dos vereadores.

A senhora é viúva de Renê Marcos Posi, que hoje empresta o nome para o Teatro Municipal de Artur Nogueira. Quero falar um pouco sobre seu finado marido, uma vez que ele marcou a cultura nogueirense. Como vocês se conheceram? Na época em que eu dava aula, com os meus vinte e poucos anos, eu tinha colegas professoras que davam aulas em escolas rurais do município. Eram professoras que vinham de outras cidades, assim como eu. Em um determinado momento, fui morar com essas colegas em uma república de professoras. Eu tinha uma amiga que era de Mogi Mirim (SP) e que era prima do Renê. Em uma das visitas que fiz na casa da família dela, eu conheci o homem que anos mais tarde se tornaria o meu marido. Ele morava em Mogi Mirim (SP) e era músico. Tocava piano como ninguém. Isso despertou a minha atenção [risos]. Começamos a namorar e nos casamos em 1969. Ele se mudou para Artur Nogueira e foi aqui que construímos a nossa família.

A senhora disse que ele era músico, mas não era somente da arte que ele vivia? Não. A família dele era proprietária de bares. Depois que nos mudamos, ele e os irmãos compraram o Bar Antártica aqui de Artur Nogueira. O Renê era um homem muito especial. Amava a cultura como poucos. Sua paixão era ouvir música erudita. Ele era muito culto e inteligente. Lia muito. Era um amante da arte, da música, dos livros…

Família

E do teatro? Principalmente [risos]. Foi ele quem produziu uma das primeiras peças do município. Ele tinha uma turma que também adorava teatro. Lembro-me que eles queriam um lugar para os ensaios e principalmente para as apresentações culturais em Artur Nogueira. Então, ele e os amigos “atores” foram falar com o prefeito da época, o senhor Cláudio Alves de Menezes. E ele permitiu e começou a construir o teatro no fundo do prédio do Grupo Escolar Francisco Cardona, que neste período já funcionava como Biblioteca – para a alegria do meu marido. Nossa, como ele gostava daquele lugar! Ele acompanhava todo o processo da construção. Era um apaixonado. Pena que ele morreu antes mesmo da inauguração.

Como foi a morte dele? Foi em um acidente de carro há 30 anos. Foi muito triste e difícil para mim e para os meus filhos. Um verdadeiro choque. Lembro-me que ele saiu daqui com outras três pessoas. Ele estava dirigindo um fusquinha e foi sentido a Cosmópolis (SP). No caminho, foi atingido por uma Perua Kombi que entrou na pista. Ele e outras duas pessoas morreram na hora. O acidente aconteceu na noite do dia 28 de setembro de 1988. Ele saiu daqui sorrindo e voltou no caixão. Eu sofri muito. Minha mãe veio morar comigo. Foi difícil superar. Tive que continuar. Tirei uma semana de licença e depois voltei a trabalhar, pois tinha que sustentar meus filhos.

Renê

Para finalizar, a senhora considera que Artur Nogueira ainda é o município ‘Berço da Amizade’? Este é o lema que Artur Nogueira sempre deve buscar. Amizade é muito importante. Há cinquenta anos, essa cidade me acolheu de braços abertos. Ela me abraçou de uma forma tão forte que me segurou aqui até hoje. Artur Nogueira sempre será uma sentinela do Brasil, reconhecida em todos os cantos como aquela cidade onde a amizade nasce.


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