10/04/2014

Se não fosse este homem, Artur Nogueira provavelmente não existiria

Após herdar as terras da mãe, Fernando Árens Júnior projetou e criou aqui um loteamento. Deixou espaço para a Igreja Matriz, Estação do Trem e até para o prédio onde hoje está a Prefeitura. E, claro, idealizou a principal avenida da cidade, que hoje leva seu nome

Por Mano Fromberg 

Frederico Guilherme Fernando Árens, filho de alemães, nasceu em Nova Friburgo, Rio de Janeiro. Engenheiro formado na cidade alemã de Hamburgo, em 1878 estabeleceu-se em Campinas com uma fábrica de carruagens e máquinas agrícolas. Casado com Felisbina Teixeira Nogueira Garcia, em 18 de abril de 1880 torna-se pai de Fernando Árens Júnior, jovem que aos sete anos segue para Hamburgo, onde cursa o secundário e faz aprendizado em fundição e montagem de máquinas. Volta para o Brasil em 1895, ingressando na Escola Politécnica.

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Em 1904, Fernando casa-se com Lavínia Caldas, natural de Vassouras, Rio de Janeiro, sendo admitido como sócio de seu pai e tios na firma Árens & Irmãos. Um ano depois, em 1905, Fernando faz seu primeiro loteamento em terras herdadas da mãe. À propriedade dá o nome de Sítio Novo. Sem inclinação para a lavoura, resolve loteá-la e dar início a uma cidade, que conhecemos hoje por Artur Nogueira. Nesse loteamento, reservou espaço para a construção de uma igreja – atual Igreja Matriz Nossa Senhora das Dores – um local para a Estação do Trem e pensou também na captação e em um reservatório de água para o povoado, que deveria ser na cachoeira de sua propriedade. Em 1908, construiu o prédio onde está atualmente instalada a Prefeitura de Artur Nogueira. À rua principal do loteamento deu seu nome, Fernando Árens Júnior, estabelecendo assim o início da cidade.

Fernando tinha gosto pela aventura. Em 1910, vai para a Baixada Santista, até então, apenas mata, e em 1911 realiza a primeira compra de terras no litoral, contíguas ao Sítio Mongaguá, organizando, a seguir, a “Companhia Melhoramentos de Praia Grande”, para urbanização da orla praiana. Funda a cidade de Mongaguá.

dormenteEm destaque, Fernando Árens Júnior em cima dos dormentes da ferrovia em construção em Artur Nogueira

Fundação de Indianópolis

Com lucro apurado no primeiro loteamento da Praia Grande, hoje cidade de Mongaguá, Fernando comprou, em 1913, o Sítio Traição, com cerca de quatrocentos e quarenta e dois hectares de campo entre os córregos Uberaba e Traição, a Oeste da Vila Mariana e entre a primitiva estrada para Santo Amaro e Jabaquara. Pouco mais da quarta parte dessas terras acabaram vendidas, para custear o acerto de divisas e iniciar melhoramentos necessários. Fernando fundou, então, a “Companhia Territorial Paulista” e organizou o loteamento da área, à qual deu o nome de “Indianópolis”.

Em uma época em que as máquinas de terraplanagem ainda estavam para serem inventadas, passou a executar esse trabalho com ferramentas manuais – enxadão, machado e picaretas – transportando a terra em carrocinhas puxadas por burros. Traçou a avenida principal, quase uma reta, sobre o espigão do Morro do Uberaba e a batizou com o nome da filha Aracy. Um mês após a constituição da companhia, efetuou a primeira venda de terrenos já urbanizados.

Ao fundar esse que hoje é um dos mais bonitos e habitáveis bairros de São Paulo, Fernando doou terreno para a construção da primeira igreja com culto à padroeira do Brasil, a Igreja de Nossa Senhora Aparecida de Indianópolis; doou o terreno do Hospital da Cruz Vermelha Brasileira e para a construção do Club Suíço, na Avenida Aracy, atual Avenida Indianópolis.

O inventor Fernando Árens Júnior

No mesmo ano em que iniciou o loteamento de Indianópolis, Fernando foi procurado pelo mecânico francês Dimitri Sensaud de Lavoud; dizendo-se aviador, este lhe relatou peripécia que teria sofrido ao pilotar um aeroplano cujo motor fundira. Ao abri-lo para reparos, Dimitri disse ter encontrado em seu interior um pequeno anel de estanho, que supunha ter se formado pela centrifugação a que fora submetido pelo motor. Sugeria o francês que Fernando, aproveitando a ideia, projetasse uma máquina para a fabricação de anéis de segmento, de larga aplicação nos motores de explosão que começavam a ser fabricados em larga escala para a indústria automobilística, que desabrochava espetacularmente. Ora, se conseguisse fazer o anel, por que não ampliá-lo também para tubos de ferro, material fartamente utilizado na época e de difícil execução.

Assim raciocinou Árens e inventou, ao cabo de algumas semanas, uma máquina para a fundição de tubos de ferro por centrifugação, o que veio reduzir o penoso processo utilizado até então, de mais de uma dezena de horas, para alguns minutos. A máquina original foi por ele construída na oficina naval, em Santos, da firma paulistana de J. Martin, onde foi inaugurada com grande sucesso.

A máquina foi patenteada, no Brasil, em nome de ambos e Fernando constituiu, a seguir, para explorar o invento, a Companhia Brasileira de Metalurgia, localizando-a no Bairro de Indianópolis, onde até hoje (Metalúrgica Barbará) se encontra.

A companhia se desenvolveu e em 1914 Fernando voltava a Mongaguá, preocupado com a urbanização praiana. Ali, utilizando-se, ao que se sabe pela primeira vez no mundo, o processo de aterro hidráulico, retirava terra de um barranco por meio de jato de água expelido de um canhão e dirigia a lama daí proveniente para a depressão de um terreno a ser preenchido. O canhão serviu ainda, por volta de 1932, para aterrar grande área no Cambuci, São Paulo, pela firma Pegado e Souza.

Em 1916, Árens retornou para o que era então conhecido apenas como “Estação Artur Nogueira”, no município de Mogi Mirim e trabalhou para que a localidade passasse a distrito. O jornal “A Comarca” registrou seu esforço em vários artigos desse ano e abriu dois deles da seguinte forma: “Árens Júnior, Novo Distrito de Paz”. Uma pálida homenagem ao grande benfeitor dessa terra.

Em 30 de dezembro de 1916, pela Lei nº 1542, Mogi Mirim ganhou um novo distrito, não Árens Júnior, mas Artur Nogueira, outro benemérito que impulsionou o crescimento da região. Em 1917, Árens comprou uma serraria em Itanhaém e contratou o arruamento e saneamento da parte alagadiça da vila onde ela se localizava, recebendo seu pagamento em terrenos.

Encerrado esse trabalho, terminou também a Primeira Guerra Mundial e Árens foi para Nova York e Toronto tratar da venda de sua patente para a fabricação de tubos, quando foi surpreendido pelo fato de seu sócio na mesma, Dimitri, já tê-la vendido, à sua revelia, apenas em seu próprio nome. Após três meses de litigação no estrangeiro, parte dos quais hospitalizado devido a malária, Fernando concordou em ceder os direitos que lhe haviam sido subtraídos. Deixou a seu sócio os direitos de patente para os Estados Unidos e Canadá, reservando para si os direitos para o resto do mundo, inclusive para os melhoramentos que viesse a introduzir no processo; tudo isso mediante a indenização de um milhão de dólares em ações da United States Cast Iron Corporation, empresa à qual seu sócio primitivo cedera os direitos.

De volta ao Brasil, Fernando delegou aos sócios a gestão de seus empreendimentos e levou a família para Hamburgo, instalando-a posteriormente na Inglaterra, por dois anos e por mais dois, ainda, na Suíça. Enquanto isso, cuidou do aperfeiçoamento do processo de centrifugação e venda do mesmo a diversos países, notadamente Inglaterra, Suíça e Itália.

Mas o trabalho de Fernando foi novamente explorado por pessoas de pouco escrúpulo. Na Inglaterra, o engenheiro Hume, da fábrica Stanton Ironworks, de quem ele se tornara amigo, com sua concordância e cooperação adaptou o processo para a fabricação de bueiros de concreto armado, patenteando-o em seu próprio nome. Na Alemanha, tendo contratado um “desenhista” para auxiliá-lo na preparação da documentação necessária à patente pretendida, tarde demais Fernando verificou que esse era, nada mais nada menos, engenheiro e diretor de importantíssima fábrica de tubos, que consegue impugnar seu intento.

Ainda na Alemanha, Fernando não esqueceu de seus projetos brasileiros e incumbe um engenheiro da fábrica Voight, de turbinas, de vir ao Brasil com a finalidade de instalar uma usina hidráulica em Mongaguá, para suprimento de energia elétrica a essa vila e à de Itanhaém, para a qual estendeu linha transmissora.

Em 1924, retornou ao Brasil, sendo nomeado para prover o abastecimento de gêneros da cidade de São Paulo, assolada pela revolução encabeçada pelo General Isidoro Dias Lopes, que estourou dia 05 de junho.

Três anos depois, em 1927, fundou a S/A Autoestrada, para a construção de uma estrada de concreto, com 24 metros de largura e 13,5 km de extensão, ligando São Paulo a Santo Amaro e o Ibirapuera a Santa Sofia.

Idealizou o Parque do Ibirapuera, na área então conhecida como “invernada dos bombeiros”, ideia aceita pelo prefeito José Pires do Rio, seu amigo e colega, o qual lhe pedira simples arruamento para a formação de novo bairro.

De volta ao litoral, planejou o transporte por cabo aéreo, numa extensão de 5 km, da fazenda Rondônia, na Bacia do Rio Aguapeú, à estação ferroviária da Praia Grande, hoje Mongaguá. A operação reduziu a uma hora o que por terra seria transportado em um dia.

Exaurido pelo investimento na autoestrada, carente de retorno devido à crise mundial gerada pelo “crack” da Bolsa de Nova York e por sucessivos ataques de malária contraída no litoral, em 1931, Fernando vendeu sua indústria de tubos, até então a maior fundição do Brasil, ao empresário gaúcho Baldomero Barbará.

Sobrevinda a Revolução Constitucionalista de 32, Fernando iniciou a produção de sal em Mongaguá, com água bombeada do mar, a fim de abastecer São Paulo de um elemento de primeira necessidade que fora tolhido pelas forças getulistas. Ali mesmo começou, como pioneiro, a secagem de bananas, a cujo produto deu o nome de “banana passa”, processo que mais tarde transfere a seu amigo e ex-sócio, Luís Franco Amaral Júnior, o qual o batiza novamente, dessa vez de “banana flakes”.

Em 1935, com as finanças e a saúde combalidas, defendeu-se, anos a fio, das investidas, principalmente de grileiros acobertados por funcionários corruptos, objetivando despojá-lo das propriedades que vinha adquirindo desde a mocidade.

Aos 62 anos, sem jamais ter se recuperado física e financeiramente, Fernando Árens Júnior morre em São Paulo, no dia 05 de setembro de 1942, vitimado de câncer no rim. Fernando teve quatro filhos: Aracy, Odila, Renato e Mariana. Aracy, que foi esposa de Caio Luiz Pereira de Souza, filho do ex-presidente da República Washington Luís, foi quem nos forneceu as informações a respeito de seu pai. Aracy Árens faleceu em 28 de novembro de 2013, aos 108 anos de idade.

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