25/07/2015

Presidente da Associação dos Advogados fala sobre a demora da Justiça em Artur Nogueira

Para Dra. Maria Barboni, “a demora na solução de uma ação acarreta uma sobrecarga de processos em andamento e o sentimento de injustiça para quem busca a justiça”.

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Isadora Stentzler / Alex Bússulo

Quando o número de processos ideal para um juiz é 5 mil, o Fórum de Artur Nogueira apresenta 19.891 para uma juíza substituta, que ainda se divide com trabalhos em outras cidades. O caso chamou a atenção após a saída do juiz Dr. Lucas Eduardo Steinle Camarg, na última semana, e a posse da juíza substituta Dra. Roseli José Fernandes Coutinho.

De longe o quadro não satisfaz a advogados e àqueles que prezam por agilidade nos processos.

Para entender a situação, o Portal Nogueirense conversou com a advogada Dra. Maria Barboni, presidente da Associação dos Advogados de Artur Nogueira (AAAN), que apontou números e deixou claro que a situação não é animadora. “Apesar dos esforços da doutora [em relação à Roseli] ela vem acumulando o Fórum de Artur Nogueira, Conchal e Mogi Guaçu, ficando humanamente impossível agilizar os feitos”, explica.

Dra. Maria tem 55 anos e é formada em Ciências Contábeis e em Direito, pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo (FDSBC). É natural de Santo André/SP e veio para Artur Nogueira com o esposo, Victório Barboni Jr., com quem tem duas filhas.

Nesta entrevista ela fala ainda sobre processos, o papel do cidadão e concorda que atrasos nos julgamentos ajudam a criar uma imagem de impunidade no Brasil. “A morosidade da justiça tem frustrado direitos, desacreditando a sociedade na eficiência do Poder Público e especialmente o Poder Judiciário: ‘Justiça tardia não é justiça e sim injustiça’.”

Quantos processos parados o Fórum de Artur Nogueira possui atualmente? Do que se trata a maioria destes casos? Não digo processos parados, mas processos em andamento. No total são 19.891, dados consolidados até o mês de maio de 2015. Eles estão divididos em civil (10.609), criminal (2.773), execução fiscal (3.813), infância e juventude (1.188), juizado especial criminal (1.428) e juizado especial civil (80).

Quanto tempo leva normalmente para um processo ser julgado hoje em Artur Nogueira? Qual seria o tempo adequado? Depende muito do processo, mas em média de quatro a cinco anos em primeira instância, podendo ter recursos. O tempo razoável em primeira instância seria de um ano e meio, em média.

Por que esse atraso é ruim? É ruim em todos os aspectos. A demora na solução de uma ação acarreta uma sobrecarga de processos em andamento e o sentimento de injustiça para quem busca a justiça. Adaptando uma frase de Ruy Barbosa: “A justiça tardia não é justiça e sim injustiça” ou a justiça que tarda, falha. E falha justamente porque tarda.

Qual é o número ideal de processos para um juiz os despachar nos devidos prazos? Quando da instalação do Fórum Distrital em dezembro de 2007, em visita ao Tribunal em São Paulo, o desembargador da época informou que o volume adequado para cada juiz em primeira instância seria por volta de 4.500 a 5.000 processos. Sendo que naquela época o processo eletrônico, estava apenas iniciando.

Quantas pessoas são afetadas com isso? Pensando que um processo pode envolver duas ou mais pessoas. Considerando que geralmente são duas partes, teríamos em média 40.000 pessoas, esperando por uma solução judicial.

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De que forma esse atraso afeta os advogados? Em tudo. Principalmente no descrédito de seus clientes. Normalmente acham que a culpa é só dos advogados. Temos prejuízos também financeiros, pois a maioria das causas depende de resultados financeiros no final dos processos, onde recebemos honorários. A Ordem dos Advogados do Brasil, em nosso código de ética, recomenda a cobrança de honorários quando não dependem de resultados financeiros, que sejam cobrados em três partes, sendo 1/3 no início do processo, 1/3 no meio do processo, após a primeira audiência ou instrução do feito, onde serão ouvidas as partes e suas testemunhas e 1/3 no final da demanda (sentença).

O juiz de Artur Nogueira deixou o Fórum na semana passada dando lugar para uma juíza substituta. De que forma isso agrava a situação dos processos acumulados? Apesar dos esforços da doutora, ela vem acumulando o Fórum de Artur Nogueira, Conchal e Mogi Guaçu, ficando humanamente impossível agilizar os feitos da mesma forma que o juiz titular que ficava exclusivamente em Artur Nogueira. Dificulta também o acesso do advogado ao juiz para despachar processos urgentes e liminares.

Há previsão para a chegada de um juiz definitivo? Como funciona esse processo? Obtive informações junto à escrevente chefe que o edital do concurso para remoção/promoção foi publicado no dia 13/07 e que levaria em média de quatro a cinco meses, provavelmente até dezembro, para termos um juiz ou juíza titular.

O atraso pode fazer com que uma pessoa presa, não culpada, fique mais tempo reclusa indevidamente? Na esfera criminal os prazos são estabelecidos segundo ao Código Processo Penal, a demora na prolatação da sentença, faz com que o acusado fique além do tempo estabelecido por Lei “preso”, o que é um atentado ao Direito Constitucional de “liberdade” até que prove o contrário. Por exemplo, o acusado que responde por furto “art. 155, caput do CP”. Temos processos que se arrastam há mais de três anos, quando a pena base para um réu primário é de dois anos. O tempo adequado para o exemplo acima, seria de no máximo um ano, partindo da denúncia em que haja o flagrante, segundo uma colega criminalista.

Além da pouca demanda de juízes, o que mais influência para atrasar o julgamento de um processo? Até 2006, antes do processo eletrônico, a demora no trâmite judicial era a falta de funcionários, de treinamento dos funcionários existentes e de equipamentos de informática e material de escritório, pois me lembro de que em Mogi Mirim a maioria dos computadores era dos escreventes e não do tribunal e quando fizeram o pedido de cartuchos de tintas para as impressoras, o tribunal não autorizou a compra, devido não ter computadores e nem tampouco impressoras, registrados de tais equipamentos. Hoje, temos equipamentos de informática de sobra, mas faltam funcionários e treinamentos. O Cartório, embora seja invisível para muitos, é uma peça fundamental para o andamento da justiça. Em pesquisa recente no cartório do Fórum de Artur Nogueira, temos 15 serventuários concursados junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo, sendo 02 chefes e 01 supervisor, 11 escreventes e 01 auxiliar judiciário. Fazendo uma conta rápida cada escrevente é responsável por 1.700 processos, sendo um número excessivamente grande, comparado com uma pesquisa no Fórum Central de São Paulo feita pela OAB em 2007, demonstrando que cada escrevente é responsável por 580 processos. Estamos precisando de mais funcionários e de alguns milagres.

Cabe processo disciplinar pela demora no julgamento dos casos? Se não, em que situações ele seria cabível? Não digo processo disciplinar, mas pela demora nas decisões dos feitos, pode responder o juiz correicionalmente, se causadas por dolo, culpa ou desídia, que não é o caso de Artur Nogueira.  Hoje o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) é competente para fiscalizar os atos dos juízes. Se a demora se tem por negligência dos serventuários da justiça, cabe representação junto ao Tribunal.

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Acredita que esses atrasos ajudam a manter a imagem de impunidade no Brasil? Com certeza. A morosidade da justiça tem frustrado direitos, desacreditando a sociedade na eficiência do Poder Público e especialmente o Poder Judiciário, pois como já mencionei a “Justiça tardia não é justiça e sim injustiça”.

Ano passado a Associação dos Advogados completou 15 anos e no aniversário comentou sobre a luta pela instalação da OAB em Artur Nogueira e pela criação da 2ª vara no Fórum. Como está o andamento dessas duas pautas? Hoje estamos focados em articulações para que o Fórum Distrital se transforme em Comarca e a instalação da 2ª Vara, que possibilitaria a vinda de mais um juiz e serventuários da Justiça. Estamos esbarrando na falta de previsão orçamentária e cortes em orçamentos pelo Estado. Estamos focados também na instalação da Ordem dos Advogados de Artur Nogueira, ficando assim com independência de Mogi Mirim, respondendo diretamente para a Seccional de São Paulo. Já temos a casa alugada pela Prefeitura de Artur Nogueira e a Prefeitura de Engenheiro Coelho e Prefeitura de Holambra ficarão responsáveis pela contratação de dois funcionários. Estamos trabalhando junto à Subseção de Mogi Mirim, através do nosso Presidente Dr. André Barbosa, para que até o final de sua gestão em dezembro de 2015, possamos inaugurar a sede em Artur Nogueira, que vai beneficiar a população de Artur Nogueira, Engenheiro Coelho e Holambra, que necessitarem da Defensoria Pública, não precisará se deslocar até a Cidade Judiciária em Campinas.

Essas duas conquistas desafogariam os processos? Sim. Para a população carente que não tem condições de contratar um advogado, a triagem para nomeação de um profissional através do convenio da OAB e Defensoria Pública, será feito aqui na cidade, não necessitando de deslocamento até Campinas. Já a transformação do Fórum Distrital em Comarca, passaríamos de entrância inicial para entrância intermediária, sendo que teríamos mais recursos humanos e orçamentários, desvinculando da Comarca de Mogi Mirim para responder diretamente ao Tribunal de Justiça em São Paulo.

Há algo que as pessoas podem fazer para acelerar os processos? Ou estão de mãos atadas? Sim. A conciliação. Em Artur Nogueira, temos medidas bem sucedidas: a informatização e a solução amigável de conflitos (CEJUSC’s) convênio com a Prefeitura de Artur Nogueira e o Unasp.

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Acima, Dra. Maria entre a vice-presidente Dra. Cirley Matiusso e do tesoureiro Dr. Marcos Capelini – todos das AAAN


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