29/02/2016

Lei anti-bullying deve cobrar mais ações de escolas em Artur Nogueira

Em vigor desde fevereiro em todo Brasil, texto prevê que escolas e clubes reforcem atenção a este tipo de violência. De acordo com psicóloga, danos de bullying podem ser irreversíveis.

Por Isadora Stentzler

Em vigor desde o início de fevereiro deste ano a Lei anti-bullying (Lei 13.185), como é conhecida, deve causar impactos diretos nas escolas de Artur Nogueira. Isso porque a nova legislação delibera que as instituições de ensino, clubes e agremiações recreativas promovam medidas de conscientização, prevenção e combate a todos os tipos de violência, com destaque às práticas recorrentes de constrangimento físico ou psicológico. Para especialistas a lei é uma importante medida preventiva e deve trazer impactos a outras gerações.

De acordo com o artigo 4º do texto, as entidades, incluindo as unidades de ensino, deverão capacitar os docentes e a equipe pedagógica para lidar com situações de bullying além de prestar orientações e assistência aos alunos e pais para evitar que essas situações ocorram. Além disso, é determinado que as entidades produzam e publiquem relatórios bimestrais das ocorrências de intimidação sistemática (bullying) nos estados e municípios para o planejamento das ações. As regras também valem para o cyberbullying, ou seja, à agressão praticada via Internet (comum em redes sociais).

Em Artur Nogueira a Secretaria de Educação informou que já trabalha para incluir a pauta dentro do currículo escolar de uma forma satisfatória.

Segundo o secretário João Gazzoli um cronograma tem sido elaborado para que os gestores, coordenadores pedagógicos e professores de cada unidade escolar estudem a lei e apontem projetos para serem realizadas. “A Secretaria está buscando parcerias com outros órgãos públicos para desenvolver ações de capacitação dos profissionais envolvidos na educação da rede municipal de ensino para o efetivo cumprimento dos objetivos da lei”, frisa Gazolli.

Uma das ações a ser tomada pela cidade será a criação de um livro de notificações para cada unidade escolar, onde deverão ser apontados casos de bullying a serem informados à Secretaria e ao Conselho Tutelar.

Para o advogado Eli Alves da Silva, presidente da Comissão de Direito Anti-Bullying da OAB/SP, a lei é um importante passo na prevenção desse tipo de delito. Segundo o especialista, ela coloca no ordenamento jurídico o assunto e impõe responsabilidades sociais a um grave comportamento que por muito tempo foi levado como algo comum. “Isso é extremamente sério e deve existir um trabalho de prevenção. Algo que será colhido nas próximas gerações. A conscientização vem com um tempo, que pode ser curto, médio ou longo. Mas a preocupação deve existir desde os bancos escolares”, defende.

Devido ao caráter preventivo, a lei não prevê punições aos agressores e nem as instituições que deixarem de realizar os balanços bimestrais. Porém, Silva aponta que embora não haja punição prevista em lei ela poderá acontecer de uma forma civil ou criminal em casos de instituições que forem palco desse tipo de delito e omissas ao assunto. Já em relação ao praticante do bullying, o presidente defende que a punição nesses casos pode resultar um efeito contrário.

Impactos

Assunto sério, a psicóloga e mestranda em psicanálise Vanessa Marques aprova a iniciativa da lei e aponta que o bullying gera emoções negativas, podendo provocar transtornos graves e levar ao suicídio ou a prática do homicídio, em casos mais sérios.

O mesmo é defendido por Silva, com a ressalva de que é necessário ter atenção ao comportamento da criança e do adolescente, pois muitas vezes o bullying vem fadado de uma brincadeira, porém com consequências até fatais. “O limite entre a brincadeira e o bullying é extremamente difícil de ser definido. Isso poderá ser determinado de acordo com cada caso e de acordo com a vítima. Há pessoas que aceitam naturalmente, de acordo com sua estrutura psicológica, uma ‘agressão’, digamos assim, e a outras em que uma brincadeira pode ser uma agressão extrema. Por via de regra tudo o que for feito e que possa atingir a pessoa não preparada para aquele fato deve realmente ser prevenido.”

Vanessa ainda acrescenta que a exposição da criança ao comportamento agressivo por tempo prolongado durante a infância pode causar danos psicológicos irreversíveis, pelo fato de que ocorrem em um momento de desenvolvimento cognitivo e emocional da criança, o que afeta a capacidade de aprendizagem e o desenvolvimento intelectual. “Dentre os danos observados por pesquisadores estão a ansiedade, tensão, medo, raiva, irritabilidade, dificuldade de concentração, déficit de atenção, angústia, tristeza, desgosto, apatia, cansaço, insegurança, sensação de impotência e rejeição, sentimentos de abandono e de inferioridade, mágoa, oscilações do humor, depressão desejo de vingança e pensamento suicidas”, lista. “Por isso o método mais eficaz para combater a prática do bullying é a prevenção.”

Superação

Em Joyce Corrêa as marcas do bullying chegaram bem cedo. No período da escola a menina negra e franzina não passava da “magricela” e “cabelo Bombril”, enquanto assistia as outras garotas recebendo elogios. A atitude dos colegas fizeram com que Joyce demorasse para se aceitar. Achava que havia problemas com ela e que sua existência pudesse ser um erro. “Tinha muita vergonha do que eu era. Ficava me perguntando porque eu era daquele jeito, com um corpo tão feio e pra piorar com o cabelo ‘ruim’, enquanto outras meninas tinham o estereótipo perfeito. Julgava aquilo como um verdadeiro castigo”, conta.

As palavras dos amigos a feriram tanto como um cutelo, pois atingiram sua alma e a impediam de se socializar. O medo de aceitação começou a surgir e a autoestima da garota diminuiu, o que a levou, aos 15 anos, a alisar o cabelo, acreditando que isso lhe daria “o triunfo”, o fim dos problemas.

Enganada, o alisamento do cabelo não mudou o que se passava com ela e precisou mais um ano para que a jovem entendesse isso.

Foi só aos 16 então que Joyce aprendeu a se amar e conseguiu superar o bullying da infância. “Percebi que isso não devia interferir na minha vida, que eu deveria ser feliz e me aceitar exatamente como sou”, conta hoje feliz, pela pessoa que se tornou.

Como resultado desse empoderamento, Joyce não alisou mais o cabelo e também participou do primeiro concurso de beleza – sonhos de infância. O ponto auge disso foi quando seus cachos começaram a surgir de novo e ela sentiu após anos uma sensação de liberdade ante os grilhões do bullying e do racismo. Hoje, aos 19 anos, está feliz e sabe que as marcas da infância não lhe são mais um problema. “Me libertei! Porque era assim que eu me sentia, uma prisioneira de um padrão que não me pertencia. Hoje o jogo virou, faço o que quero e coloco sempre a minha opinião à frente do que quero, tenho a maior riqueza desse mundo: o amor próprio.”

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