27/09/2014

ENTREVISTA: Lutador nogueirense, Maicon Kene vai competir no mundial de Kung Fu

Filho de um campeão no Kung Fu, Maicon Kene Ambrósio vem se destacando no Brasil com a arte marcial. Com apenas 23 anos de idade, este nogueirense já coleciona importantes títulos.

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“Ter a chance de enfrentar os melhores do mundo é uma grande honra”

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Alex Bússulo

No próximo ano, Maicon participará de um dos mais importantes campeonatos de Kung Fu do mundo, que reunirá lutadores de todo o planeta em Hong Kong. Para isso ele intensificou os treinos e promete dar o melhor de si, representando Artur Nogueira e o Brasil.

Nascido em Cosmópolis, ele sempre morou em Artur Nogueira. Vendo o pai treinar aprendeu cedo a admirar o mundo das lutas. É graduado em Kung Fu e participante das modalidades de Exibições, Armas, Boxe Chinês e FullContact.

No dia 29 de agosto, Maicon foi homenageado em uma importante cerimônia. Ele recebeu um diploma de Homenagem Esportiva conferido pela Assembleia Legislativa de São Paulo. O evento reuniu grandes nomes do esporte brasileiro.

Na entrevista desta semana, o lutador nogueirense fala sobre os preparativos para o Campeonato Mundial e os planos de implantar um projeto social em Artur Nogueira. Confira:

Como surgiu seu interesse pelo Kung Fu? Pratico Kung Fu desde os 15 anos. Meu interesse por essa arte marcial surgiu quando eu tinha 8 anos ao ver meu pai treinando. Tive a curiosidade, mas não tinha muita paciência na época. Na adolescência tinha os valentões da escola e eu queria aprender a lutar para brigar com eles, mas com os treinos aprendi que o kung fu não era feito para a violência e sim para a paz interior, força e agilidade. Com isso aprendi a ter disciplina que me ajudou na escola e na vida social. Aos 20 anos conheci o Mestre Vanildo de Oliveira, campeão mundial de kung fu, do Complexo Esportivo Dragão Chinês. Foi aí que me tornei o atleta que sou hoje.

Seu pai é o Edson Ambrósio, faixa preta e campeão internacional de kung fu. Como é a influência dele em seus treinos? Meu pai sempre foi meu maior inspirador, afinal todo filho quer ser como o pai. Mas eu era preguiçoso e não conseguia treinar kung fu com ele, mesmo ele me incentivando não tive vontade de praticar, tentei outros esportes mas nunca me saí tão bem, depois de anos pedi para ele me treinar. Foi quando ele me influenciou a me dedicar de verdade e ser um atleta profissional, então pesquisei várias academias de kung fu e achei a Dragão Chinês do Mestre Vanildo de Oliveira, que estava se destacando em muitos campeonatos e tendo seus atletas se tornando profissionais me interessei e conversei com o Mestre. Comecei a treinar mas, mesmo com o incentivo do Mestre Vanildo, não conseguia me dedicar 100%, foi aí que meu pai resolveu entrar na academia comigo e dar uns puxões de orelha. Acredito que foi por isso que me tornei o atleta dedicado que sou hoje. Se não fosse meu pai teria desistido há muito tempo atrás, devo tudo isso a ele.

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Qual a maior dificuldade quanto competidor? A maior dificuldade em ser um competidor é a desvalorização que o atleta, infelizmente, sofre no Brasil. O atleta pode ser o melhor, mas sem patrocínio ou incentivo fica muito difícil competir. Existe a bolsa atleta, mas nem todos tem esse privilégio. Quando você busca patrocínio nem sempre é visto com bons olhos pelas empresas, que na maioria das vezes pensam que estamos aplicando algum tipo de golpe. Em Artur Nogueira, por exemplo, tem muitos atletas de artes marciais de nível internacional que não tem o devido reconhecimento por falta de investimentos e oportunidades. Deveria ter mais espaço para esses atletas, como o projeto que é feito com o Judô, ou preços nas academias de artes marciais mais acessíveis a esses atletas que nem sempre tem uma condição financeira para ter um treinamento adequado. Pensando nisso estou abrindo uma filial do complexo aqui em Artur Nogueira com preços acessíveis a todos que desejam ser competidores filiados as maiores federações do Brasil e do mundo, além de projetos sociais que pretendo realizar aqui na cidade, não só para pessoas de baixa renda como para deficientes físicos e deficientes intelectuais.

Como será esse projeto? Esse projeto será voltado às pessoas que tenham vontade de praticar artes marciais mas que não tenham condições financeiras, ou tenham algum tipo de limitação, seja ela física ou intelectual. Eu já vi em campeonato um competidor com deficiência intelectual, mas faixa preta em kung fu, sendo campeão ao competir com atletas sem deficiência. Achei muito legal e resolvi fazer um projeto desse tipo aqui na cidade, sem fins lucrativos, abrindo as portas para esses atletas. Logo começaremos esse projeto e tenho a certeza que aparecerão muitos campeões. Só é limitado quem quer ser limitado.

Como é seu treino? Meu treino é dividido em etapas. (1º) Condicionamento Físico: onde trabalho com todas as partes do meu corpo com exercícios leves e pesados. (2º) Técnico: onde treino armas, katis, calejamento e outros movimentos tradicionais do Kung Fu. E (3º) Combate: onde treino meus chutes, socos, defesas. Em média me dedico de 5 a 6 horas por dia, de segunda a segunda. Só não estou treinando quando estou arbitrando lutas, pois também sou arbitro de MMA, e Muay Thai pela A.B.A.L (Associação Brasileira de Arbitragem de Luta).

Quais prêmios já conquistou? Tenho várias conquistas. As mais importantes são: uma medalha de ouro no FullContact e uma de prata em Armas no Internacional de Artes Marciais, que aconteceu em março de 2013 no CEU Azul da Cor do Mar, em São Paulo/SP, onde atletas de países como Argentina, Uruguai, China, Japão, EUA, entre vários outros participaram. Uma medalha de ouro, no PanAmericano de Artes Marciais realizado em agosto de 2014, no Ginásio Municipal de Santa Isabel/SP. Além de duas medalhas de ouro no FullContact e Exibição e um cinturão de kung fu boxe chinês na categoria 90Kg no Campeonato Brasileiro de Artes Marciais, essas conquistas para mim foram as mais importantes até aqui.

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No próximo ano, você vai para Hong Kong onde participará de um Campeonato de Artes Marciais. Como conquistou essa vaga? Isso mesmo. Ano que vem, em agosto, irei viajar para Hong Kong para participar de um Campeonato de Artes Marciais promovido pela mundialmente conhecida Chin Woo, mesma federação dos astros das artes marciais, Jackie Chan e Jet Li, na qual também sou filiado. Bom, nem eu sei como consegui essa vaga (risos), mas creio que foi pelas minhas conquistas e pelo reconhecimento que estou tendo aqui no Brasil.

O que esse campeonato representa para você? Representa muito! Será o mais importante na minha carreira, pois participar de um campeonato no país onde nasceu o Kung Fu e ter a chance de enfrentar os melhores do mundo é uma grande honra. Como todo sonho de jogador de futebol é jogar uma Copa do Mundo, de um lutador de Kung Fu é lutar em um campeonato na China.

Qual o nível de dificuldade deste campeonato? Acredita que tem chances de vencer? É um nível muito alto, porque além de reunir os melhores lutadores do mundo, estarão os donos da casa, os chineses. No Brasil nascemos já jogando futebol, na China eles nascem sabendo lutar Kung Fu. Além de ser obrigatório o Kung Fu como matéria escolar na China é o primeiro amor de uma criança chinesa. Esses atletas vivem disso, o primeiro requisito para você entrar em uma empresa na China é ter no currículo o Kung Fu. Então, dá pra imaginar que lá não tem luta fácil, mas acredito que quando você está determinado pode tudo, eu estou muito determinado e creio que consigo sim vencer, mesmo não vencendo ficarei muito feliz de ter participado. Claro que quero a vitória, mas o importante é dar o seu melhor independente se vai ganhar ou não.

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Como está se preparando? Estou treinando dobrado, me dedicando por completo. Até minha esposa entrou no meu treino (risos). Além do meu pai e do meu mestre, minha esposa também me ajuda a treinar. Ela também luta. Portanto, treino exercícios e combate com ela, estou correndo diariamente, tendo uma alimentação mais rigorosa, participando de campeonatos amadores e profissionais. Mas, o mais importante do meu treino é o psicológico, estou treinando muito o meu psicológico para ficar focado nesse campeonato.

Como pretende pagar os custos desta viagem? A maior parte dos custos dessa viagem eu mesmo irei pagar, mas também conto com a ajuda de alguns patrocinadores que possuo. Essa viagem não é muito barata e também tem hospedagem, alimentação, transportes entre outras coisas, espero conseguir mais patrocinadores para me ajudar. E os que se interessarem em ser meus patrocinadores podem entrar em contato comigo.

Recentemente, você e o seu pai receberam um diploma de Homenagem Esportiva conferido pela Assembleia Legislativa de São Paulo. Como foi isso? Essa homenagem é feita aos brasileiros que se destacaram no esporte, já acontece há alguns anos. Anteriormente era feita em Brasília, esse ano foi na Assembleia Legislativa de São Paulo. Foi uma grande surpresa quando ficamos sabendo que seriamos homenageados. Esse diploma é conferido aos professores, técnicos, mestres e atletas de diversos tipos de esporte. Eu e meu pai recebemos não só por ser atleta mas também pelo ensino do Kung Fu. Ficamos felizes ao saber que éramos reconhecidos por várias pessoas de diferentes estados. Eu mesmo fui tirar uma foto com o atleta do UFC, Marcos Rogério “Pezão”, que participou do The Ultimate Fighter Brasil, e ele me reconheceu. Trocamos algumas experiências. Isso me mostrou que realmente meu trabalho estava sendo reconhecido, isso mostra que quando você é dedicado, cedo ou tarde o reconhecimento vem. Esse reconhecimento não fez a gente pensar que podíamos relaxar, ele fez a gente querer treinar muito mais, porque o limite não é o fim mas o começo.

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Na sua opinião, qual a importância do Kung Fu na vida de uma pessoa? Eu acho que o Kung Fu muda não só a condição física de uma pessoa, mas também o caráter, a disciplina e o modo como vemos o próximo. Quando você começa a praticar Kung Fu descobre que não é só o ensino de luta, movimentos, mas ensina a disciplina. A base do Kung Fu é a disciplina. Muitas pessoas mudaram depois que conheceram essa arte marcial, eu mesmo mudei. Na nossa academia colocamos os boletins escolares dos alunos em um mural, para todo mundo ver a mudança que o Kung Fu faz. Muitos pais nos procuram porque o filho é rebelde, não vai bem na escola. E esses mesmos pais voltam e nos agradecem porque o filho mudou radicalmente. Nossos atletas, por exemplo, depois de algum tempo de treino, mudam seus hábitos alimentares para melhor, mudam seu jeito na sociedade. Tem pessoas mais idosas que treinam também, porque o médico disse que eles estão com a saúde debilitada, então eles vão praticar e percebem a mudança na saúde, autoestima. O Kung Fu não tem limite de idade, não tem restrição contra ninguém, basta a pessoa ter força de vontade para mudar, ninguém nasce pronto, é preciso esforço e determinação.

Qual a principal diferença do Kung Fu quando comparado com outras lutas? A principal diferença do Kung Fu é a disciplina, que é muito mais rigorosa que outras artes, não que elas não tenham disciplina, é que no Kung Fu você precisa ter uma disciplina muito maior, mas também existem outras diferenças, que são: os movimentos, que são decorrentes das observações dos ataques dos animais, de onde se originou-se o Kung Fu, controle físico, controle emocional e mental, isso pra mim são as principais diferenças, em relação com outros tipos de artes marciais.

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Algumas pessoas associam o Kung Fu, assim como outras lutas, com a violência. Como você vê essa situação? Existem muitas pessoas que ainda associam as artes marciais com a violência, eles julgam desse modo, porque não tem um conhecimento mais profundo sobre elas, só querem ver a parte ruim. Elas consideram violência quando duas pessoas estão em cima de um rinque, trocando socos e chutes. Estão completamente erradas! Em cima do rinque somos rivais sim, mas depois disso, temos uma convivência com essa pessoa que estávamos lutando, ou seja, viramos amigos. No futebol, por exemplo, eles quebram perna, braço, as vezes saem todo ensanguentado, desmaiado e até morto de campo, tem toda aquela violência nos estádios das torcidas, sem contar que você não pode levar seu filho para assistir um jogo, porque não sabe se vai voltar, além de seu filho escutar todo tipo de discriminação, insultos. E essas pessoas não acham que o futebol é violento, agora se você leva seu filho pra ver uma luta, ele vai ver que depois que acaba, os lutadores se abraçam, saem sorrindo do ringue, isso mostra que a luta não é violência, aí essas pessoas falam que os lutadores brigam nas entrevistas e etc. Isso é tudo marketing, você não iria ver uma luta se os lutadores se abraçassem na entrevista, iria achar que não teria nenhuma emoção. Eu particularmente acho que essas pessoas deveriam conhecer mais antes de sair julgando.

Quais são seus planos? Quero abrir meu complexo esportivo aqui na cidade até janeiro de 2015 e continuar os projetos que fazemos em outras cidades. Agora, aqui em Artur Nogueira, quero transformar muitas vidas com o esporte, mas especificamente com as artes marciais. Ter o trabalho que estamos desenvolvendo reconhecido pela sociedade em geral e conquistar os títulos que ainda me faltam.

Fotos: Isadora Stentzler

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