25/02/2012

ENTREVISTA DA SEMANA: Pastor Paulo Martini

Diretor geral do Unasp fala sobre educação, projetos e religião

“Não se trata de religião, se trata de ensinar valores espirituais e morais para a vida” (Pastor Paulo Martini)

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Alex Bússulo

Hoje, aos 52 anos de idade, José Paulo Martini responde por um dos maiores complexos educacionais da região. Trabalhando desde o início de 2004, como diretor geral do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp), Campus Engenheiro Coelho – Artur Nogueira, Martini relembra, de maneira calma e pausada, como foi o seu trajeto até conquistar o cargo atual.

O pastor passou boa parte de sua infância e adolescência na mesma cidade em que nasceu: São Miguel do Oeste, em Santa Catarina, e desde pequeno já demonstrava talento para o que escolheu seguir.

Fez o Ensino Médio em um colégio de regime de internato e logo que concluiu mudou-se para a cidade de São Paulo, onde fez sua primeira graduação, Teologia.

Voltou para Santa Catarina, onde posteriormente foi nomeado como diretor do Sistema Educacional Adventista do Estado, em que respondia pela direção de 17 escolas.

Também estudou e formou-se em Administração Escolar e logo foi transferido para o Rio de Janeiro, onde foi responsável por quatro anos pelo Sistema Educacional Adventista do Estado.

Além de atuar por dez anos como diretor de uma escola em regime de internato no norte do Paraná. Depois fez mestrado e veio ocupar o cargo atual.

Em uma conversa de mais de uma hora, Martini fala sobre sua vida, educação, religião e sobre um projeto visionário de construir uma Arca de Noé no Unasp. Confira.

Como você analisa o processo educacional no Brasil? O Brasil tem um processo educacional bastante interessante. Hoje, nós temos mais flexibilidade, ao contrário de algumas décadas passadas, em que o sistema era bastante rígido. De maneira geral, o que falta é qualidade na educação brasileira. E isso tem vários fatores que contribuem. Um deles é o fato de que as crianças não vão para a escola com o hábito da leitura, o próprio lar muitas vezes não dá uma compreensão correta da vida. Também temos o problema de infraestrutura básica nas escolas, onde muitas das escolas não possuem salas de aulas adequadas, com ventilação, iluminação, carteiras adequadas. Outro problema é o corpo docente, dos próprios professores, que em muitos casos não são bem preparados, talvez por uma consequência da própria remuneração que se tem para o professor. São fatores como esses que deixam o Brasil atrás de países com menos recursos.

A família é a maior responsável pela educação da criança? Compreendendo que os primeiros anos de vida de uma criança podem definir como será o seu futuro, eu diria que a maior parcela está sob-responsabilidade da família. Porque uma criança que vive em um lar onde os pais tem um bom linguajar, uma boa leitura, onde os programas que assistem são de um nível melhor já terá uma educação diferente. A família pode ser pobre, mas quando essa criança entrar na escola ela já terá um diferencial. Não estou dizendo que todo o problema está na família, de forma alguma, estou dizendo que uma boa parcela da responsabilidade está na estrutura familiar. Os outros fatores são aquilo que eu já mencionei: condições físicas da escola e do preparo dos professores.

Uma das características do Unasp é o ensino da doutrina cristã. Qual a importância disso para a formação profissional? Nós compreendemos o ser humano como um todo. Acreditamos que não basta dar apenas uma boa formação acadêmica para a pessoa. É claro que isso é muito importante e nós zelamos por isso. Zelamos pela qualidade acadêmica. Nós zelamos por uma boa aula, um bom conteúdo, para que o professor tenha uma boa metodologia. Mas de que adianta ser uma pessoa altamente competente se ela não tem relacionamento com as pessoas. De que adianta ser uma pessoa altamente competente se ela não sabe ser um pai competente, um esposo ou esposa competente. De que adianta ser altamente competente em uma área do conhecimento se ele não cuidar da própria saúde? Se de repente se tornar um alcoólatra, um viciado? Então, nós, como uma instituição denominacional, zelamos para dar uma formação mais integral, zelamos pelo conteúdo acadêmico da carreira que o estudante escolheu, mas temos uma preocupação muito grande na formação do ser humano em todas essas áreas e também na área espiritual, porque nós acreditamos que uma pessoa que tem o conhecimento e a consciência de que existe um Deus que criou e mantém todas as coisas e que tem um plano especial para cada ser, essa pessoa será diferente, porque ela sabe de onde ela veio, porque está aqui e para onde está indo. Isso vai definir que tipo de pessoa você é. Não estamos falando de proselitismo religioso, de fazer lavagem cerebral nas pessoas, que as pessoas devem pertencer da Igreja A, B ou C. Não se trata de religião, se trata de valores espirituais e morais para a vida. Esta instituição tem a preocupação de formar o cidadão como um todo.

Qual a importância do estudo na vida do homem? Nos dias de hoje ele tem um valor enorme. Vivemos em um mundo altamente competitivo. Somos ou deixamos de ser contratados pela competência que temos, pelo conhecimento que adquirimos. Hoje, para se operar uma máquina, das mais simples que existe, dentro de certa complexidade, você precisa saber ler, interpretar, saber compreender corretamente as coisas, ter a compreensão de outro idioma. A importância é fundamental. Atualmente, já é difícil um jovem entrar para o mercado de trabalho se ele não tiver uma boa base acadêmica. Há pouco tempo atrás se falava que tínhamos que ter pelo menos o Ensino Fundamental, depois houve a época do Ensino Médio completo, hoje, já estamos passando da exigência da pessoa ter graduação. O diferencial já é ter pós.

Como você concilia a função de pastor com a de administrador? Eu tenho a formação na área de Teologia e também tenho a formação na área de Gestão. Atuei como pastor, cuidando de igrejas por seis anos. Depois passei a trabalhar na Gestão Educacional. A minha formação como pastor me deu uma compreensão maior sobre as necessidades do ser humano. Uma compreensão dos conflitos que eles vivem e isso me ajuda muitas vezes em aconselhamentos e decisões que tenho que tomar no dia-a-dia.

Qual é a função mais difícil? Cada carreira, trabalho, profissão tem seus desafios. Tem seus ganhos. A formação teológica permite dar um bom embasamento em qualquer que seja a profissão escolhida, porque quando se estuda Teologia também se estuda muito as necessidades do homem, como resolver muitos conflitos dentro de uma administração. A Gestão te realiza, mas na Teologia a realização é maior, pois você tem a oportunidade de ver e ajudar pessoas que até então estavam indo para outros caminhos, se distanciando daquilo que realmente é importante, e você vê essa pessoa se reconciliar com a família, se reconciliar com os outros.

Se Paulo Martini não fosse pastor, nem gestor, qual profissão teria seguido? Possivelmente minha outra vocação seria Engenharia Civil. É uma área que eu admiro desde a minha infância.

Qual foi o melhor conselho que recebeu em sua vida? Olha, não sei se foi o melhor, mas um conselho que me ajudou muito foi da minha mãe que sempre me dizia: “Não importa o que você for fazer, faça sempre o melhor. Nunca se contente em fazer menos do que você pode fazer”.

É verdade que você tem um projeto de construir uma Arca de Noé no Unasp? Nós temos o sonho de transformar o Unasp em um lugar onde possamos receber pessoas, de muitos lugares, para conhecer e aprender além do ensino regular. Nós temos sim um projeto sendo desenhado para a construção de uma arca com a mesma metragem descrita nas Sagradas Escrituras. Hoje, estamos na fase de elaboração do projeto…

E o que seria essa Arca? Ela seria um testemunho. Uma oportunidade para as pessoas conhecerem a Bíblia Sagrada. As Sagradas Escrituras dizem que houve um tempo em que não chovia e que a maldade do homem era crescente e que Deus então chamou a Noé para que construísse uma arca e advertisse as pessoas do que estava por vir. Aí veio o dilúvio e Noé e sua família foram salvos. Nós temos nas Sagradas Escrituras exatamente o tamanho que ela tinha. Nosso pensamento é construir uma arca com ambientes próprios para palestras, para interação com pessoas, um verdadeiro testemunho de que é possível a construção de uma arca da mesma maneira que foi descrita.

Essa Arca terá animais? Ela vai incluir os ambientes próprios para os animais. Teremos alguns poucos que estará a disposição do público quando houver exposição.

Cerca de 30% da fazenda do Unasp, o Colégio Unasp Artur Nogueira e até a União Central Brasileira se encontram localizadas dentro do município nogueirense. Podemos afirmar que Artur Nogueira tem uma universidade? É. Veja bem, quando o Unasp foi construído aqui o território ainda pertencia ao município de Artur Nogueira. Podemos ver isso nos registros. Com a emancipação política de Engenheiro Coelho parte do Campus passou para esse município. Mas temos uma unidade de Educação Básica no centro de Artur Nogueira. O correto é afirmar que estamos dentro dos dois municípios, tanto em Artur Nogueira como em Engenheiro Coelho.

Por que você criou a Unidade Unasp Artur Nogueira, onde funcionava a antiga Escola Adventista? Temos um grande interesse em estarmos inseridos em comunidades onde podemos oferecer nossos serviços. A Igreja tinha uma escola em Artur Nogueira que era a ‘Escola Adventista’, mas depois, discutindo com a mantenedora da escola, chegamos a conclusão de que o Unasp poderia fazer a gestão daquela escola e que aquela unidade poderia ser uma extensão da universidade, onde poderíamos estar oferecendo programas de pós-graduação, cursos técnicos em nível médio, dentro do perímetro urbano de Artur Nogueira. Foi com muita alegria que assumimos a escola de Artur Nogueira, que passou a ser o ‘Colégio Unasp’, onde queremos fazer uma extensão avançada, para oferecer um programa de ensino tanto para jovens, como para adultos, e contribuir de maneira bem efetiva para a Educação de Artur Nogueira.

Existe alguma pretensão em levar cursos universitários para a unidade de Artur Nogueira? Existe. Nós temos algumas barreiras na questão do MEC, mas existe o pensamento de que em um futuro esta unidade possa ter cursos superiores. No momento estaremos trabalhando com pós-graduação e dentro de alguns meses devemos abrir também cursos técnicos.

Tais como? Possivelmente cursos técnicos de Sistemas para Internet e Engenharia Civil. Por enquanto queremos saber da própria sociedade qual é a atual necessidade para formatarmos cursos que possam atender a demanda que exista na cidade.

Como o Unasp lida com a questão da praça de pedágio, que foi instalada na porta da universidade? Nós já tivemos algumas reuniões com a diretoria da Rota das Bandeiras, já conversamos com a Artesp, com políticos de nossa região, mas todas as nossas tentativas foram frustradas. Tínhamos um projeto já bem avançado com a concessionária responsável, um contrato já elaborado e acertado pelas duas partes, onde seria construída uma estrada entre a universidade e Artur Nogueira, onde os estudantes não precisariam pagar pedágio. Mas tudo foi cancelado pela Rota das Bandeiras, que não nos deu mais respostas sobre o projeto. Hoje, nós estamos na expectativa de que o Governo Estadual adote uma nova medida de cobrança. Está implantado, em caráter experimental, na rodovia que liga Campinas a Sorocaba, um sistema que cobra R$ 0,14 por quilômetro rodado. Então, se for realmente implantado, como esperamos que seja, um aluno que vem de Artur Nogueira pagará cerca de R$ 1. Um valor que não vejo com tanta exorbitância. O preço que pagamos hoje é quase uma exploração. Entendo da importância do pedágio, mas os valores devem ser revistos.


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