28/01/2012

ENTREVISTA DA SEMANA: Marcelo Ribeiro

Comandante da PM fala sobre segurança, vida pessoal e aposentadoria

“Vivemos em um mundo onde o errado é aceito de tal forma, que quando alguém faz alguma coisa certa, as pessoas estranham” (Subtenente Marcelo)

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Alex Bússulo

Depois de aproximadamente uma hora de entrevista faço minha última pergunta. O comandante responde rapidamente e brinca: “Mas já acabou? Eu tinha até separado uma lista com a minha cor predileta e o melhor filme que já assisti”.

“Tropa de Elite?” – pergunto.

“Não! De jeito nenhum” – responde imediatamente o policial, afirmando que gosta de ‘A Corrente do Bem’, um filme que conta a história de um garotinho que consegue fazer a diferença na comunidade em que vive. “É um filme maravilhoso, que me inspira a cada vez que assisto. Tropa de Elite não mostra a verdadeira realidade, apenas um lado da história”, explica.

Nascido em Santos, Marcelo de Oliveira Ribeiro tem 43 anos de idade, sendo 25 anos e meio de Polícia. Mudou-se com a família para Artur Nogueira em abril de 1991. Seis anos depois assumiu o comando do 2º Pelotão da 3ª Companhia do 19º Batalhão de Polícia Militar do Interior, cargo que mantêm até hoje, na graduação de subtenente.

Casado e pai de duas filhas, Ribeiro diz que, diferente de outros policiais, consegue separar a vida pessoal da profissional e que já está com os dias contados para sua aposentadoria.

Na entrevista, o policial fala sobre segurança em Artur Nogueira, a profissão que escolheu seguir e sobre sua vida particular. Acompanhe. Ah, a cor preferida do subtenente é azul.

Como é comandar os policiais em Artur Nogueira? Não tenho problema com disciplina. Os policiais que eu comando são policiais bons. Não temos homens envolvidos com criminalidade e outros problemas. A maioria deles tem esposa, filhos e são residentes de Artur Nogueira.

Como você define um bom policial? Para mim é aquele que é honesto, trabalhador, que respeita os direitos humanos e que tem um bom relacionamento com a comunidade. Devemos lembrar que o Policial Militar sai da sociedade e que dentro de uma farda, existe um ser humano, existe um marido, um filho ou um pai. Hoje, a Polícia Militar possui um tripé na segurança pública. Trabalhamos em cima dos direitos humanos, Polícia Comunitária e a gestão pela qualidade. São os três objetivos da Polícia.

Qual é a ocorrência mais registrada pela PM de Artur Nogueira? São os acidentes de trânsito. Hoje, temos uma média de 30 acidentes por mês. Em dezembro foram registradas 45 ocorrências deste gênero, passou um pouco da média. Já se tratando de crime, o mais cometido em Artur Nogueira são os pequenos furtos.

Como você vê o problema das drogas em Artur Nogueira? O problema é geral, não apenas de Artur Nogueira. Semanalmente são registrados vários casos e prisões envolvendo usuários e traficantes no município. Não compete a Polícia Militar acabar com as drogas, embora ela também realize as prisões e trabalhe com programas educacionais, tais como o Proerd (Programa Educacional de Resistência às Drogas), que existe há mais de dez anos em Artur Nogueira e tem trazido bons resultados. As drogas que estão nas ruas hoje vieram de outros países. Uma ação mais eficiente nas fronteiras pode diminuir esse problema.

Qual a importância de uma blitz? Toda operação que realizamos visa encontrar três coisas: armas, drogas e pessoas foragidas. Eventualmente encontramos veículos com o licenciamento vencido e aí, como dever, temos que tomar as devidas providências. Ao contrário do que muitos pensam não estamos ali para ficar aplicando multas de trânsito, que acaba sendo apenas uma consequência.

Qual a sua opinião sobre a redução da maioridade penal para os 16 anos de idade? Eu sou a favor. Se o adolescente de 16 anos tem a capacidade de eleger o presidente da República, governador, deputado, prefeito e vereador, ele também tem condição de responder criminalmente por seus atos. Já se foi a época em que uma pessoa de 16 anos não tinha consciência do que fazia.

Algumas pessoas reclamam e afirmam que a Polícia Militar demora a prestar atendimento e que já chegou a dar a desculpa de que não pode atender determinado caso por falta de viatura. Isso é verdade? Isso não é real. O que pode ocorrer é que em alguma situação esteja acontecendo várias ocorrências ao mesmo tempo e temos que focar os policiais naquilo que é urgência. Nossa prioridade é a preservação da vida. Se eu tiver dois casos, um envolvendo acidente de trânsito com vítima e outro de um furto ocorrido há dois dias darei, sem dúvidas, prioridade ao acidente.

Como você analisa o trabalho da Guarda Municipal e da Polícia Civil? Artur Nogueira tem uma característica muito importante que é a harmonia que existe entre as Polícias Civil, Militar e Guarda Municipal. Cada uma sabe da sua função e ao mesmo tempo trabalhamos de forma coordenada. A Guarda nos apoia, nós apoiamos a Guarda. E é assim que deve ser, uma colaborando com a outra para que a maior beneficiada seja a segurança do cidadão.

Qual é o seu objetivo, profissionalmente falando? Pretendo, assim que me aposentar, e isso vai acontecer em breve, daqui a quatro anos e meio, exercer a função de advogado. Entrei aos 18 anos para a Polícia. O militar aposenta com 30 anos de serviço. Me formei em Direito apenas pensando na minha aposentadoria.

Por quê? Porque muitos policiais ficam doentes quando se aposentam. E eu não quero ficar doente! A vida de um policial é agitada por natureza, vivemos na correria. Quando chega a aposentadoria não dá para simplesmente parar tudo, que a depressão pega. Sempre aconselho meus policiais a se prepararem para quando esse momento chegar e já ir pensando em uma nova atividade. Não dá para trabalhar por trinta anos e de uma hora para a outra ficar em casa assistindo novela.

O que mais te marcou em quase 26 anos de trabalho como policial? Foram algumas ações que passei dentro de favela, quando trabalhava em Praia Grande. É complicado quando estamos no meio de um tiroteio e um colega é baleado. Por outro lado, a recompensa é muito gratificante. Poder salvar a vida de um inocente é algo maravilhoso. Às vezes até passa pela minha cabeça que eu deveria ter sido bombeiro, assim poderia salvar vidas todos os dias, mas enfim, quando nós, da infantaria, pegamos uma ocorrência e salvamos a vida de um cidadão, ou tiramos alguém de um cativeiro, é sempre muito gratificante.

Como resolver o problema de Segurança Pública? Segurança Pública, de acordo com o artigo 144 da Constituição, é dever do Estado, mas responsabilidade de todos. Nós apenas vamos resolver o problema de Segurança, quando as pessoas assumirem que também fazem parte da solução. Por exemplo, se tem um terreno baldio com mato alto na frente da sua casa é obrigação sua ligar para a Prefeitura e dizer ‘olha, tem um terreno com mato e tem pessoas aproveitando para usar drogas no local’. Quando tem um poste com a luz queimada é obrigação sua entrar em contato com a Elektro e dizer que tem um local que está escuro e o povo está aprontando coisas erradas ali. Todos nós somos responsáveis pela segurança, não só a Polícia.

E as leis? Se todos respeitassem a lei nem precisaríamos de Polícia. Mas infelizmente a maioria das pessoas não gosta de fazer o que é certo, procuram dar um jeito para tudo. O famoso jeitinho do brasileiro. Nós vivemos em um mundo onde o errado é aceito de tal forma que quando alguém faz alguma coisa certa, as pessoas estranham.

O Marcelo Ribeiro consegue deixar de ser subtenente por algumas horas ou não há uma separação entre o lado pessoal e profissional? Eu, ao contrário de muitos policiais, consigo separar as duas coisas. Não trago problemas de casa para o serviço e nem do serviço para casa. Às vezes, minha esposa me pergunta alguma coisa relacionada à Polícia, porque em determinada hora do dia ela ouviu a sirene da viatura, e eu simplesmente digo que foi coisa rotineira e que está tudo tranquilo. Porque, com mais de 25 anos de serviço, se eu levasse os problemas para minha casa acabaria ficando louco e deixando minha família louca também. Sempre digo aos meus policiais que eles precisam lembrar que existe vida fora da Polícia, que eles devem se relacionar com a família, com os amigos e também com a comunidade.

Quando você sai do trabalho e vai para casa, antes de entrar pelo portão e encontrar a sua família, não dá nenhum sentimento negativo, de medo, de uma possível vingança? Eu como policial não tenho inimigos. Faço meu trabalho corretamente e trato todos com respeito. Sei que podem existir pessoas que não gostam de mim, por coisas que eu possa ter feito profissionalmente, mas em particular ninguém tem raiva de mim. Isso eu tenho certeza. Eu coloco minha cabeça no travesseiro e durmo tranquilo, com a certeza de que eu fiz o meu melhor.

Você é um adventista do Sétimo Dia. Como consegue conciliar os princípios da Igreja com a sua profissão? Você já matou alguém? Eu já participei de ocorrência que no final resultou na morte de uma pessoa, mas não que eu tenha a matado. Nesse caso não fiquei com a consciência pesada, pois sabia que essa pessoa que morreu estava tentando tirar a vida de um policial. Qualquer pessoa, independentemente da profissão, pode matar alguém em legítima defesa de si ou de outra pessoa, estado de necessidade, exercício regular do direito ou estrito cumprimento do dever legal. Como policial, me sinto tranquilo se estiver enquadrado em um desses itens. Como as leis da Terra estão ligadas às leis do Céu tenho certeza de que se um dia tiver que fazer, serei perdoado por isso.

Há dois anos você teve câncer. O que mudou em sua vida após a doença? Retirei um câncer do intestino no dia 13 de abril de 2009, no Hospital Adventista em São Paulo. Fiz 18 sessões de quimioterapia e graças a Deus hoje posso dizer que estou curado. Depois que passei por essa experiência comecei a valorizar as pequenas coisas da vida. Senti vontade de ajudar mais as pessoas, fazer visitas a doentes e levar um pouco de esperança aos necessitados. Após passar perto da morte, me sinto uma pessoa mais humana e preocupada com meu próximo.

Arte: Renan Bússulo 


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