09/01/2017

Conheça a emocionante história da família que construiu uma igreja em Artur Nogueira

Construção da Igreja Sagrado Coração de Jesus promove a fé e a superação a dor de uma grande perda familiar

Michael Harteman

A Igreja Sagrado Coração de Jesus é vista por todos que passam pela Rodovia Zeferino Vaz em Artur Nogueira. Porém, poucos sabem que a construção se mistura com a história de uma família. Um pai trabalhador, uma mãe dedicada e um filho iluminado estão por trás da edificação. A motivação em construir a Igreja, no entanto, nasce de uma tragédia. Assim, o produto final é mais do que uma igreja; é uma história emocionante.

Tudo se inicia no ano de 1970. Marli Guilhermina Hergert morava com a família em um sítio de Limeira (SP). O pai da jovem possuía alguns tratores para cuidar das terras e quando um deles deu problema, foi necessário chamar alguém que pudesse consertar. O auxílio veio diretamente do jovem Otacílio Ferreira Natal, um especialista em conserto de tratores. Mas o destino reservava uma surpresa. Na ocasião, os olhares de Marli e Otacílio se cruzaram. Dessa forma, a paixão tinha tudo para aparecer. E foi o que aconteceu, o casamento foi realizado um ano após se conhecerem, em 1971.

Posteriormente, o jovem casal se mudou para o perímetro urbano de Limeira. Ele, um exímio trabalhador e ela, uma dona de casa cuidadosa. “Ele sempre foi muito esforçado, lutou desde o início por tudo que queria”, comenta Marli. A responsabilidade de Otacílio era notória a todos os clientes. Contratar os serviços do mecânico era ter certeza de um serviço de qualidade.

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Dois anos depois do enlace matrimonial, em 1973, surge do relacionamento o pequeno Robson Hergert Natal. O nascimento do bebê tornou a vida do casal mais completa. Dia-a-dia Robson se desenvolvia mais. O caráter de um filho “exemplar”, como diz a própria Marli, ia aparecendo. Os olhos atentos ao trabalho do pai e o coração alinhado aos sentimentos e necessidades da mãe, em poucos anos, fazia do filho um amigo especial. “Só de olhar para mim ele já sabia como eu estava”, conta a mãe emocionada.

Acomodação não fazia parte da personalidade de Otacílio. Surge então o desejo de ter sua própria oficina mecânica. É nesse momento que Artur Nogueira aparece na vida da família. “Ele resolveu montar uma oficina ali aonde era a Castelinho brinquedos”, afirma Marli. Em 1982, Artur Nogueira recebeu, em definitivo, a família Natal.

Depois de mais dois anos, a oficina passou a funcionar às margens da Rodovia Zeferino Vaz, mesmo local onde se encontra hoje. Rapidamente, os galpões foram construídos e os clientes apareceram. O sucesso dos negócios refletia o companheirismo da família, já que Otacílio tocava a empresa sob os olhares do filho Robson. Posteriormente a conhecida Trainse Tratores Implementos e Serviços se tornou naturalmente um ponto de encontro dos tratoristas.

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O jovem Robson, dotado de inteligência e força de vontade, poderia escolher as centenas de caminhos que a vida lhe proporcionava, mas escolheu as veredas de seu pai. Toda a observação frutificou no coração do jovem. Surge então um sonho. “Ele queria ir para Alemanha, estudar mecânica para contribuir com a empresa”, comenta Marli. O jovem se preparava, estudava o idioma germânico e levava os planos a sério.

O ano de 1994 também foi marcante na história da família. O Brasil dava bons sinais na economia e o plano Real saia do papel. Tudo parecia caminhar bem, inabalável. Todavia o dia quinze de setembro foi marcante e jamais seria esquecido por Marli Guilhermina. Robson retornava, de moto, da tradicional Expoflora em Holambra quando sofreu um acidente e ficou internado por dois dias no hospital da Unicamp. “O anjo que Deus colocou em minha vida se foi…”, lamenta Marli, com lágrima nos olhos. A partir disso, a alegria da casa foi interrompida e os sonhos desapareceram. Nada mais fazia sentido para o casal que, agora, se despedia de seu único filho. Robson faleceu aos 21 anos de idade, deixando para trás sonhos e uma família amada.

“Achei que não fosse suportar, sofri demais, é uma dor que não tem como explicar. Ninguém imagina a dor de uma perda”, detalha Marli. A grandeza da tragédia, no entanto, não foi capaz de retirar o casal da presença de Deus. Ajudar ao próximo continuou fazendo parte da rotina de Marli e Otacílio. Com isso, apesar da dor da perda jamais ter se esvaído, a gratidão de ter tido um filho tão especial ainda se faz presente nos corações dos progenitores.

Antes do encerramento daquele ano, um anseio antigo aflora no coração de Otacílio: construir uma igreja.

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A gratidão a Deus e a presença marcante do filho serviram de combustível para que a igreja surgisse. Para tanto, sem perceber, Marli e Otacílio começam a materializar toda a essência da família. Ajudar ao próximo. “Sempre trabalhei muito na comunidade, eu era catequista e meu marido sempre ajudou as pessoas ao seu redor”, relembra Marli. A igreja ainda não existia fisicamente, mas já era uma realidade no coração do casal.

Foi a hora de reunir alguns amigos a fim de iniciar a obra. Um ano se passou até a conclusão do projeto. A família chamou pessoas muito comprometidas, alguns vinham de Limeira para trabalhar. Otacílio planejava cada detalhe, desde a fundação até o acabamento. A dedicação contagiava todos os envolvidos na nobre causa.

Otacílio conciliava o empreendimento mecânico com a iniciativa filantrópica. Para isso, continuava a trabalhar na oficina com a mesma atenção de sempre e, concomitantemente, dava a devida atenção a ascensão da obra do templo. “As pessoas achavam que iam encontrar ele todo sujo na oficina, que nada! Chegava lá ele estava como sempre, com seu macacão limpinho”, frisa Marli, que agora além de cuidar do lar também administra a empresa.

A construção teve diversas dificuldades, mas perseverança era marcante no olhar de Otacílio. Pouco a pouco a igreja foi tomando forma. Quem passava ficava maravilhado com a infraestrutura. O que era um agregado de tijolos se tornava, gradativamente, uma igreja muito bem construída. Após outros dois anos, lá estava ela. A “Sagrado Coração de Jesus” estava em pé, apta para receber a comunidade. “Meu marido sempre dizia que a construção era para o povo”, afirma Marli, que sempre apoiou o esposo.

Assim, a igreja ficou pronta em 1997 e a primeira missa foi conduzia pelo padre Lázaro Lourenço, em 5 de junho.

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Nos anos seguintes, cada vez que a Igreja era utilizada, os corações de Otacílio e Marli se enchiam de alegria. Os bancos ocupados em uma missa era a materialização de um sonho. E, mais que isso, era como ter a família completa novamente. “Acredito que seja raro uma pessoa querer construir uma igreja, sempre achei muito bonito por parte do meu marido”, opina Marli, emocionada.

Os anos foram se passando. Casamentos, missas e eventos foram realizados, tudo pensando na comunidade. Após um período com o padre Lázaro, quem teve a incumbência de celebrar as missas foi o padre Eder Doniseti. Marli afirma que “durante um período havia missas todas as sextas”.

Em 2006, um acontecimento marcou a vida de Otacílio Ferreira Natal. Um dia como qualquer outro, cheio de trabalho. Cansado da correria do dia, Otacílio se deita para mais uma noite de sono. Enquanto dormia foi acometido por um Acidente Vascular Cerebral (AVC). Consequentemente, acordou sem os movimentos do lado esquerdo do corpo. Bastante assustados, Marli e Otacílio se dirigiram ao hospital. O diagnóstico infelizmente foi demasiadamente cruel, a ponto do trabalhador não poder ter uma vida normal.

Uma nova realidade estava exposta diante do casal. Conhecido por todos por sua pró-atividade, Otacílio não poderia mais trabalhar como antes. Sem partes do movimento corporal, ele passaria a maior parte do tempo sentado. Sua esposa conta que ele estava irritado, mas em nenhum momento os lábios de Otacílio pronunciaram quaisquer palavras contra os desejos divino. “Ele jamais blasfemou contra Deus, jamais”, exclama Marli com o doce sorriso que só a lembrança do marido pode promover.

Ficar debilitado e passando o tempo em uma cadeira de rodas poderia ser desculpa para ficar cada vez mais ocioso. Não para Otacílio. Nada o preenchia mais do que passar o dia no galpão de seu empreendimento. Marli recorda que ele estava ali para ajudar em tudo, já que entendia de cada peça que estava na empresa. “A turma chegava e falava qualquer coisa de peça e ele já respondia, e olha que tinha muita peça ali dentro. Ele não ficava em casa, queria ficar na loja”, recorda Marli. A presença de Otacílio na empresa era um alento para companheiros e clientes.

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Tal cenário se manteve até agosto de 2015. Feliz após uma tarde de domingo junto com familiares, Otacílio sentiu-se mal após se despedir dos entes queridos. Era a incidência de outro AVC. Levado para o hospital, às pressas, o estimado Otacílio – após 11 dias internado – veio a óbito no dia 4 de setembro de 2015. Para Marli, a data marcava a retirada de mais um grande amor de sua vida.

“Não me esquecerei dos últimos momentos dele com a família. Ele sorria, cantava e se divertia”, realça Marli com os olhos marejados. Ao ser perguntada sobre algo que lembre fortemente o marido e companheiro, a zelosa mulher responde rapidamente que “só de sentir o cheiro do café, me lembro dele, ele gostava demais”.

Otacílio deixou sua marca de determinação, de ajuda ao próximo e de paz interior. As pessoas que o cercavam jamais seriam as mesmas. O homem descansa, porém seu fruto de trabalho permanece em pé até hoje nas paredes dos galpões, na estrutura da igreja e no sorriso das pessoas a qual ajudou. Lutou e conseguiu concretizar tudo o que se propôs a fazer. Entregou para a vida o melhor de si.

Atualmente, Marli toca os negócios da família. E mantém o trabalho com a mesma qualidade, conhecida e aprovada pelos clientes. Ela possui uma equipe de apoio que trabalha no local, no entanto a humilde esposa de Otacílio não os considera como funcionários . “Não gosto de chamá-los assim, eles na verdade são parte da família”, valoriza. O ambiente funciona como uma engrenagem perfeita.

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A história de uma família pode ser contada de diversas maneiras, seja por fotos, relatos e documentos. A família Natal, contudo, possui mais que isso para enriquecer a narrativa. Ao entrar na Igreja Sagrado Coração de Jesus é possível perceber os traços de responsabilidade de Otacílio, o carisma e simpatia de Marli e o entusiasmo e vitalidade do jovem Robson.

A igreja foi construída com alma, com história e com a devoção de uma família que jamais questionou os caminhos de Deus. Um casal que nunca desistiu de lutar. Independente das dificuldades, deixou um exemplo de determinação e amor ao próximo. A história da família Natal pode ser ouvida, mas também pode ser vista e tocada no entorno de uma linda igreja.

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