20/04/2015

Agricultores nogueirenses optam por produtos orgânicos para evitar doenças

Relatório do Inca associou exposição ao produto com câncer.

Por Isadora Stentzler

Há um veneno na mesa. Ele não brilha em uma garrafa e nem traz caveiras no rótulo. Não está em forma de comprimido e não cheira mal. Também não é ácido. Um pouco cítrico, talvez. É coberto com sal ou açúcar. Está misturado. Camuflado. Um veneno de lenta ação. Que adoece e depois mata. Tem muitos nomes, mas o que se sobressai a todos é este: comida.

De acordo com o Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca) alimentos não orgânicos produzidos com larga escala de pesticidas e agrotóxicos podem causar danos irrecuperáveis a saúde.

Em um relatório divulgado no dia 6 de abril o Inca alertou quanto aos malefícios destes alimentos, sobretudo ao produtor. No documento é citado irritação da pele e olhos, coceira, cólicas, vômitos, diarreias, espasmos, dificuldades respiratórias, convulsões e morte como resultado direto à exposição a esses produtos. “Os efeitos adversos decorrentes da exposição crônica aos agrotóxicos podem aparecer muito tempo após a exposição, dificultando a correlação com o agente”, explica trecho. “Dentre os efeitos associados à exposição crônica a ingredientes ativos de agrotóxicos podem ser citados infertilidade, impotência, abortos, malformações, neurotoxicidade, desregulação hormonal, efeitos sobre o sistema imunológico e câncer.”

Caso

O produtor Rosimaldo José Magossi, presidente da Cooperativa de Produção Agroindustrial Familiar de Artur Nogueira, perdeu o pai assim. Seu Osmaldo Magossi faleceu em 2012, aos 71 anos, devido a um câncer de pulmão desenvolvido a partir da exposição aos pesticidas. “Meu pai foi produtor a vida inteira. Ele teve câncer e foi se generalizando no corpo todo. Chegou a fazer 16 cirurgias, mas não sobreviveu.”

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O próprio Rosimaldo conta que há dois anos desenvolveu um problema no fígado, também devido aos agrotóxicos. Há 44 anos trabalhando na lavoura, ele conta que sempre usou pesticidas como glifosato, floridol e compostos de enxofre e cobre, o que o teria prejudicado.

Os metais são aplicados para evitar pontos pretos nos alimentos e para destruir pestes. Uma ação que facilita o trabalho do produtor e também diminui o custeio.

Segundo dados do Inca o uso do glifosato no Brasil aumentou quase 200% entre 2002 e 2011, passando de 44 mil para 132 mil toneladas por ano. O incremento é muito maior que o crescimento da área plantada, que passou de 54,5 milhões de hectares para 71,1 milhões no mesmo período. O que significa que os agricultores passaram a usar mais herbicida por área plantada. Esse aumento pode ser explicado, segundo especialistas, pelo desenvolvimento de resistência das plantas ao agrotóxico.

Os agrotóxicos são produtos químicos sintéticos usados para matar insetos ou plantas no ambiente rural e urbano. No Brasil, a venda de agrotóxicos saltou de US$ 2 bilhões para mais de US$7 bilhões entre 2001 e 2008. Em 2009 o país se tornou o maior consumidor mundial de agrotóxicos, ultrapassando a marca de 1 milhão de toneladas, o que equivale a um consumo médio de 5,2 kg de veneno agrícola por habitante.

Rosimaldo foi na contramão deste índice. Devido ao problema no fígado ele começou um acompanhamento médico na Unicamp e foi submetido a oito desintoxicações corporais, quatro por ano. Para evitar maiores problemas e até o desenvolvimento de um câncer ele optou por produzir produtos ecologicamente coretos, livres de agrotóxicos.

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Orgânicos

“Eu ainda não tenho o selo que indica que meu produto é orgânico, porque ainda estou fazendo o curso, mas já não uso nenhum tipo de veneno na lavoura”, explica.

Ele e outras sete famílias participam em Artur Nogueira de um curso para agricultores que visa a agricultura orgânica. As aulas são oferecidas pela Casada da Agricultura e CAT Mogi Mirim, e só no final do curso é que esses produtores receberão um selo que identifique os alimentos.

O que demora, explica Rosimaldo, é a descontaminação do solo. “Muitos anos plantando com agrotóxico faz o solo ficar contaminado. Então agora temos que ficar muitos anos sem usar veneno para que o solo fique bom de novo.”

Apesar de não ter as hortas 100% orgânicas, boa parte da produção de Rosilmaldo já é pensada nesse molde, mas ele não pode vender no valor de um orgânico. É que produtos livres de agrotóxicos são mais caros devido a mão de obra. Um hectare que seria limpo em meio dia com aspirador de veneno, por exemplo, agora leva uma semana. “E quando termina de carpir tem que voltar e começar de novo, porque já tem mais mato.”

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Hoje Rosimaldo produz em escala ecologicamente correta – o mais próximo dos orgânicos – as alfaces do tipo romana, crespa, lisa, americana e crocante; repolho; chicória; brócolis ramoso; cheiro verde – salsa, cebolinha e coentro –; couve-flor; rúcula; almeirão; mamão; jabuticaba; e banana.

Para cuidar de tudo isso o serviço é pesado e cansativo, mas para Rosimaldo compensa, pois é um bem que ele faz a si mesmo e aos outros.

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